A disciplina da língua

Durante o tempo da quaresma, vejo cristãos conscientes fazer jejum, dar esmolas, orar e ler a Palavra de Deus. É a ascese quaresmal.

A liturgia fala em quebrar nosso orgulho, corrigir nossos vícios, elevar nossos sentimentos, repartir o pão com os necessitados e fortificar nosso espírito fraterno. Mas poucas vezes ouço falar em disciplina da língua, que talvez seja o jejum mais difícil e quiçá mais necessário.

É da língua que brotam a calúnia e a maledicência, responsáveis pela quebra da honra alheia, por tantas injustiças no relacionamento humano, por tanto desamor. Responsáveis ainda por um clima de desconfiança, que freia a amizade e a alegria da convivência comunitária.

Se a fidelidade é irmã do amor, a maledicência é sogra do ódio!

A Escritura Sagrada é severa com os pecados da língua. O salmo 51 adverte: “Tua língua é qual navalha afiada, fabricante de mentiras” (Sl 51,4). E o Salmo 54: “Suas palavras mais brandas que o óleo, na verdade, porém, são punhais” (Sl 54,22). Por isso o conselho do Apóstolo Paulo é tão oportuno: “Fazei tudo sem reclamar ou murmurar, para que sejais livres de repreensão e ambigüidade, filhos de Deus sem defeito” (Fl 2, 14-15).

O austero Tiago é fatídico: “Se alguém pensa que é religioso e não sabe controlar a língua, está enganando a si mesmo, e sua religião não vale nada” (Tg 1, 26).

Para destruir algum desafeto às vezes se usa a calúnia, portanto uma falsidade. É um crime segundo a lei civil e um pecado perante Deus. Em geral, porém, se recorre à maledicência. Diz-se que o fato aconteceu e à boca pequena vão os comentários. E lá se vai a honra alheia. É crime e é pecado também. Esquecemos facilmente o conselho do poeta de Alegrete (Mário Quintana): Se tens um segredo, não conte ao amigo. Porque o amigo tem amigos, que tem amigos também!

À maledicência se aplica uma comparação clássica: esvazie um cobertor de penas ao vento e depois tente ajuntá-las de novo!

O jejum da língua favorece a amizade e a justiça entre as pessoas, gerando paz e fraternidade. Por isso é tão bom evitar a maledicência e os comentários inúteis sobre faltas alheias.

Melhor é orar por nossos desafetos, para que Deus os abençoe e a nós também.

Dom Aloísio Sinésio Bohn

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