Generosidade e gratidão

Certa vez houve uma festa no céu. Foram convidadas todas as virtudes. Muitas compareceram; pequenas e grandes. Essas últimas eram particularmente amáveis, porque quem é verdadeiramente grande não conhece nem a inveja e nem o ciúme. Todas eram felizes e conversavam amigavelmente entre si, justamente como nas ocasiões em que nos encontramos entre parentes e amigos. De repente, o Todo-Poderoso percebeu que duas senhoras muito bonitas pareciam não conhecer-se. Tomou a iniciativa. Pegou uma pela mão e a conduziu junto à outra. – Eis aqui a Generosidade – falou para uma e, em seguida, apresentando a outra disse: – Eis a Gratidão -. As duas virtudes ficaram se olhando sem palavras: desde a criação do mundo, época já bastante remota, era a primeira vez que se encontravam.

Mais uma historinha para dizer que, na maioria dos casos, a generosidade e a gratidão não andam juntas. Às vezes há muita generosidade e pouca gratidão. Outras vezes a gratidão não aparece por falta mesmo de generosidade. Em geral é difícil ser generosos e também agradecer, reconhecendo o dom recebido. Sem contar aquelas outras vezes que, apesar do que é dado e recebido, ainda há reclamação e insatisfação. Parece que o coração humano encontra dificuldade para ser generoso e mais ainda para agradecer.

Esquecemos a palavra “obrigado”. Os filhos com os pais; e os pais com os filhos nas coisas mais simples da convivência diária. Se pensarmos que tudo nos é devido e que, afinal, os outros têm a obrigação de nos atender – adultos ou crianças – sempre menos saberemos agradecer por um pequeno favor, por uma gentileza, por um gesto de ajuda. É mais fácil mandar que pedir; portanto por que agradecer? Mais ainda, se estamos colocando dinheiro em casa, se somos nós o sustento de tudo ou quase, os outros é que nos deveriam agradecer, reconhecer o nosso esforço. Assim os “provedores” da casa não praticam a generosidade com os outros membros da família e, às vezes, jogam-lhes na cara o fato que, senão fossem eles, estariam na miséria. Como exercer a gratidão se também não há generosidade do outro lado? Como os filhos aprenderão a agradecer se os pais não os educam e não lhes mostram a beleza e a grandeza da generosidade e da gratidão?

Também com Jesus aconteceu que, dos dez leprosos curados, só um entendeu que deveria voltar para dar glória a Deus e agradecer àquele Mestre Jesus que o havia curado. E os outros? Com certeza foram apresentar-se aos sacerdotes para serem reintegrados à sociedade, mas não tiveram a iniciativa de manifestar  sua gratidão a Jesus.

Essa falta de atitude vale também para todos nós. Quantos dons e quantos favores recebemos dos outros e não lembramos de agradecer? Vivemos numa sociedade onde parece que tudo pode ser comprado. Se estamos pagando ou se estamos usando de um serviço público remunerado por que deveríamos agradecer? Ninguém está fazendo nada de graça.

Estamos certos e errados ao mesmo tempo. Nós pagamos, sim, o serviço, mas não o sorriso de quem nos atende. Pagamos o trabalho da pessoa, mas não a gentileza dela. Isso é tão evidente que, muitas vezes, preferimos ser atendidos por um funcionário e não por outro pelo simples jeito educado e gentil da pessoa. A grosseria e o desinteresse acabam escondendo a competência. No entanto um aperto de mão, um olhar e um escutar atenciosos enaltecem qualquer serviço por mais simples e humilde que seja. Digo isso por mim mesmo. Várias vezes, as pessoas reclamaram comigo porque eu as atendia “caminhando”. Tive que aprender a dar tempo e atenção às pessoas. Nem sempre consigo, mas, garanto, basta pouco.

A gratidão é a resposta espontânea e alegre de quem se sente acolhido e valorizado. Assim como a verdadeira generosidade só pode ser o resultado do amor, também a gratidão deve brotar livremente como um dos nossos melhores sentimentos. Contudo devemos nos educar a olhar além do que nos é devido por obrigação e aprender a enxergar a longanimidade das pessoas que encontramos na vida. Generosidade e gratidão juntas aquecem os nossos relacionamentos e fazem de nós pequenos sinais do Deus-Amor, que sempre se doa sem pedir nada em troca, a não ser, também, amor para com o nosso próximo.

Nos dias do Círio usemos mais a palavra “obrigado”, na nossa família, no trabalho, na rua, na igreja. Unidos digamos também muito obrigado a Nossa Senhora, a pobre e pequena mulher de Nazaré, que todas as gerações chamam de bem-aventurada. Ela recebeu o maior dom que uma mulher podia recebe: ser a mãe do Salvador. E doou o seu Filho a todos. Gratidão e generosidade juntas. Muito obrigado Maria!

Dom Pedro José Conti

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