Cardeal Orani João Tempesta
Arcebispo do Rio de Janeiro

 

Entramos em setembro, mês da Bíblia, que lembra com ênfase a importância da Palavra de Deus em nossa fé. A data foi criada em 1971, com a finalidade de instruir os fiéis sobre as Escrituras Sagradas. O mês escolhido se deve ao fato de celebramos no dia 30, a memória de São Jerônimo, patrono dos estudos bíblicos, que traduziu dos originais a Escritura, além de grandes e importantes comentários sobre a mesma. O domingo próximo a essa data é também o Dia Nacional da Bíblia.

Cada ano tem um tema, um lema e um livro da Bíblia a aprofundar. Neste ano o tema do Mês da Bíblia é “Para que n’Ele nossos povos tenham vida” (dentro da sequência de continuar com o tema da V Conferência do Episcopado Latino Americano e Caribenho em Aparecida vivido há dez anos). O lema é “Anunciar o Evangelho e doar a própria vida” (este retirado do texto da primeira carta de Paulo aos Tessalonicenses que é o livro a ser aprofundado este ano. Durante os últimos anos temos tido os temas deste mês insistindo do tema do Documento de Aparecida de 2007, intitulado “Discípulos missionários de Jesus Cristo (foram temas de anos anteriores), para que n’Ele nossos povos tenham vida (são os temas destes anos atuais)” (Retirado do site: http://cnbb.net.br/cnbb-lanca-subsidios-para-o-mes-da-biblia-celebrado-em-setembro/ Acesso: 31/08/2017).

O texto-base deste mês oferece caminhos para compreender a Primeira Carta de Paulo aos Tessalonicenses, que deve ser aprofundada neste mês. Ela retrata uma comunidade nos inícios do Cristianismo, com dificuldades, resistências e superações. Tal comunidade está inserida na periferia de uma grande cidade do Império Romano, Tessalônica, onde busca-se transformar a sociedade vigente, com a força do anúncio do Evangelho.

É bom lembrar que, algumas vezes, quando se fala da Bíblia, se recorre a um monte de termos e elementos que falam da sua importância apenas indiretamente: a Palavra, os Textos Sagrados, o Antigo Testamento, o Novo Testamento, os Livros Sagrados, etc, porém não podemos nos esquecer que autor dessa palavra é o próprio Deus. Este mês não é apenas o mês de um livro. É o mês que nos lembra a revelação de Deus cumprida totalmente em Jesus Cristo, o Verbo, Palavra eterna que se fez carne e cujas experiências, profecias e anúncios se encontram escritos nas Escrituras.

A Bíblia é comunicação do caminho da salvação de Deus com seu povo e do povo com seu Deus. Antes da Bíblia ser aula de história, ser testamento dos feitos de Deus na história humana, ser patrimônio da fé judaica e cristã, a Bíblia é atual e constante comunicar de Deus. Deus já falou ao ser humano diversas vezes e de diversos modos, porém, de uns tempos para cá, sua comunicação ficou mais evidente. A Bíblia, em Cristo, tornou-se uma comunicação muito íntima de Deus, pois Ele fala, e se revelou plenamente em Jesus Cristo, o rosto humano de Deus.

 Assim, entenda-se a voz de Deus não apenas nas letras, no papel, no livro, mas no mundo. A comunicação de Deus está em todo lugar. Ele sempre fala à sua criatura, mas para entender essa fala é preciso ter este livro aberto (a Bíblia) e o coração disposto a ouvir. Se por um lado a comunicação de Deus Pai através do Filho é mais personalizada e explícita, por outro, essa comunicação através da Bíblia exige de nós uma atenção mais dedicada. Sendo assim, um modo de prestar atenção naquilo que Deus nos fala na Bíblia não é apenas “lê-la”, mas é, principalmente, “rezá-la”. Isso porque a palavra puramente lida precisa da atualização através do ensinamento da Igreja e do toque do Espírito Santo que ensina a ouvir do jeito certo.

Depois da Conferência de Aparecida em 2007 a CNBB tem incentivado a comunicação com Deus através da Bíblia por meio da “Leitura Orante” que, na realidade é a retomada do antigo método da Igreja dos inícios que é a “Lectio Divina”. A Leitura Orante é um jeito de conhecer, meditar, rezar, contemplar e agir conforme a comunicação de Deus através da Bíblia. Todos os cristãos leigos, religiosos e sacerdotes são chamados a praticar a Leitura Orante, de modo especial as comunidades, grupos de reflexão, círculos bíblicos e outros. Deve ser a Palavra de Deus a nortear nossa reflexão e não um fato inventado por uma história. A Palavra irá iluminar os fatos da vida verdadeira de cada um. Convido a aprofundar neste mês esse método de comunicação de Deus conosco, seja pessoalmente, seja comunitariamente. E essa Palavra é viva e eficaz.

A Lectio Divina vem do latim e tem como significado, “leitura divina”, “leitura espiritual” ou ainda, como convencionamos traduzir entre nós,  “leitura orante da Bíblia”, é um alimento necessário para a nossa vida: leitura, meditação, oração e contemplação. A partir desta oração, conscientes do plano de Deus e a sua vontade, pode-se produzir os frutos espirituais necessários para a salvação. A Lectio Divina é deixar-se envolver pelo plano da Salvação de Deus. Os princípios da Lectio Divina foram expressos por volta do ano 220 e praticados por monges católicos, especialmente as regras monásticas dos santos: Pacômio, Agostinho, Basílio e Bento. Mais recentemente, Santa Terezinha Do Menino Jesus dizia, em período de aridez espiritual, que quando os livros espirituais não lhe diziam mais nada, ela busca no Evangelho o alimento de sua alma.

O Concílio Vaticano II exorta igualmente, com ardor e insistência, a todos os fiéis cristãos, especialmente aos religiosos, que, pela frequente leitura das divinas Escrituras, alcancem esse bem supremo: o conhecimento de Jesus Cristo (Fl 3,8). Porquanto “ignorar as Escrituras é ignorar a Cristo” (São Jerônimo, Comm. In Is., prol).

 

 

 

 

 

 

 

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