Cardeal Orani João Tempesta
Arcebispo do Rio de Janeiro

Estamos em outubro! Tempo cheio de grandes comemorações – mês temático – e de grandes acontecimentos, onde temos a oportunidade de ver essa igreja viva, cheia de dinamismo, que caminha na história, sendo testemunhas e ao mesmo tempo protagonistas deste tempo.

Iniciamos o mês com a Semana Nacional da Vida, com o tema “Em família defendemos a vida” e fazendo soar os sinos de nossas Igrejas no primeiro dia deste mês as 12, 15 e 18 horas. No próximo dia 8 iremos sinalizar esse tema com velas acesas em nossas igrejas e nos locais públicos comemorando o dia do nascituro.

 Nesse primeiro final de semana do mês de outubro, no sábado que antecede o primeiro domingo acontecerá em Roma a criação dos treze novos cardeais dos quais dez votantes. Além do mais no domingo, primeiro domingo de outubro, nós iniciamos com toda a igreja da Amazônia o sínodo dos bispos sobre Amazônia, tendo como instrumento de trabalho o tema: novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral. Sem dúvida, caríssimos irmãos e amigos, uma oportunidade de ver o papel e a missão da Igreja em todos os países em que esse bioma acontece e a nossa responsabilidade de presença enquanto Igreja evangelizadora, que tem como consequência também a preocupação com o social nesse caso o cuidado do meio ambiente. Rezemos nessa intenção e acompanhamos os bispos da Amazônia legal, tanto do brasil como dos países limítrofes que fazem parte da pan-amazônia, para que sejam momentos importantes de escuta e de docilidade à ação do Espírito Santo e um bem para todo aquele povo que vive na Amazônia, seja nas grandes cidades e nos grandes eventos da Amazônia, seja ao mesmo tempo uma oportunidade para poder evangelizar e ser presença transformadora. Conforme nos comunicou o Papa Francisco, “o objetivo principal desta convocação é identificar novos caminhos para a evangelização daquela porção do Povo de Deus, especialmente dos indígenas, frequentemente esquecidos e sem perspectivas de um futuro sereno, também por causa da crise da Floresta Amazônica, pulmão de capital importância para nosso planeta. Que, no respeito da beleza da Criação, todos os povos da terra louvem a Deus, Senhor do universo, e por Ele iluminados, percorram caminhos de justiça e de paz”.

Mas ao mesmo tempo nós temos no mês de outubro, além de mês do rosário, já que no próximo dia 07 celebramos Nossa Senhora do Rosário, outubro é o mês das missões. No Brasil sempre foi mês das missões. Porém o Papa Francisco quis que o mundo inteiro tivesse o mês missionário extraordinário e nesse sentido o papa escreveu uma carta para comemorar cem anos do documento do papa Bento XV chamado Maximum Illud, que trata justamente sobre atividade missionária no mundo inteiro, isso há cem anos atrás. Ao mesmo tempo que o papa escreve esse documento para chamar a atenção deste centenário ele também mandou uma mensagem para o dia mundial das missões que é também o tema do mês missionário extraordinário no Brasil:  batizados e enviados: a Igreja de Cristo em missão no mundo. Segundo o Papa Francisco, na carta enviada pela proclamação deste mês missionário, afirma que seu objetivo é: “despertar em medida maior a consciência da “missio ad gentes” e retomar com novo impulso a transformação missionária da vida e da pastoral. Trata-se de um acontecimento eclesial de grande importância que abrange todas as Conferências Episcopais, os membros dos institutos de vida consagrada, as sociedades da vida apostólica, as associações e movimentos eclesiais”.

Batizados e enviados! Na sua carta o papa lembra a importância de permanentemente sermos missionários.  Não basta apenas um dia, uma semana, um mês, um ano missionário, mas aquele que é batizado é chamado a ser enviado; e a Igreja de Cristo em missão no mundo é também o tema desse mês das missões em que o Papa Francisco quis convocar o mês missionário extraordinário. Portanto,  acontecimentos iniciais desse mês de outubro, sínodo dos bispos sobre a Amazônia para Amazônia lá em Roma, mês missionário extraordinário no mundo inteiro e aqui no Brasil nós queremos  nos preparar,  já que no próximo final de semana teremos a canonização da Irmã Dulce, beata e que será então invocada como Santa Dulce dos Pobres: nascida no Brasil, desenvolvendo suas atividades em Salvador,  será canonizada, mostrando que  em qualquer tempo e  em qualquer lugar é lugar para a  santidade e para a  santificação e essa é a nossa missão primeira e essencial.

Portanto, o mês de outubro promete e nós somos convidados a viver intensamente isso, já que a intenção do papa para o apostolado da oração nesse mês é “para que o sopro do Espírito Santo suscite uma nova primavera missionária na Igreja”. Todo apostolado da oração e todos os cristãos católicos rezando nessa intenção da evangelização nesse mês de outubro, para que o Espírito Santo suscite como primavera missionária um novo ardor missionário na Igreja inteira.

 Estamos no vigésimo sétimo (27º) domingo do tempo comum. A liturgia e o ano litúrgico vão caminhando, dando passo cada vez maiores e a palavra de Deus hoje nos fala dessa consciência de fazemos a nossa parte, de cumprir a nossa obrigação. Falamos agora há pouco da questão da missão evangelizadora no mundo inteiro, também na Amazônia, e cabe a nós justamente vermos que tudo é dom, tudo é graça do Senhor.

A palavra do Evangelho desse domingo (Lc 17,5-10), vigésimo sétimo domingo do Tempo Comum, nos coloca isso: que quando os apóstolos pediram Senhor aumenta a nossa fé ele respondeu: se vós tivésseis fé mesmo pequena como grão de mostarda, poderíeis dizer a esta amoreira: arranca-te daqui e planta-te no mar e ela vos obedeceria.

Jesus vai recordar a importância de pedirmos o dom da fé, de cremos no dom que o Senhor nos dá para podermos enxergar as coisas que estão nesse mundo com a presença de Deus.  Conforme nos recorda o Catecismo (n.153), a fé é uma graça:

Quando Pedro confessa que Jesus é o Cristo, o Filho do Deus vivo, Jesus declara-lhe que esta revelação não lhe veio «da carne nem do sangue, mas do seu Pai que está nos Céus» (Mt 16, 17). A fé é um dom de Deus, uma virtude sobrenatural infundida por Ele. Para prestar esta adesão da fé, são necessários a prévia e concomitante ajuda da graça divina e os interiores auxílios do Espírito Santo, o qual move e converte o coração para Deus, abre os olhos do entendimento, e dá a todos a suavidade em aceitar e crer a verdade”.

Ver agora aquilo que nós não vemos com os olhos da carne mas vemos com os olhos da fé:  a presença de Deus na história, em nossas vidas, mesmo nos acontecimentos mais difíceis, nas perseguições, nas maledicências e nas mentiras contra a Igreja que estão aí para nos dividir e desanimar para que nós não anunciemos Jesus Cristo. Isso acontece sempre: aconteceu no passado, acontece e acontecerá no futuro. Mas o Evangelho continua:

Se algum de vós tem um empregado que trabalha a terra ou cuida dos animais, por acaso vai dizer-lhe, quando ele volta do campo:

‘Vem depressa para a mesa?’ Pelo contrário, não vai dizer ao empregado: ‘Prepara-me o jantar, cinge-te e serve-me, enquanto eu como e bebo; depois disso tu poderás comer e beber?’ Será que vai agradecer ao empregado, porque fez o que lhe havia mandado? Assim também vós: quando tiverdes feito tudo o que vos mandaram, dizei: ‘Somos servos inúteis; fizemos o que devíamos fazer’.’

Essa é uma frase muito importante!  Nós sabemos pela fé que tudo é dom do Senhor e quando nós podemos servir aos irmãos e irmãs nós vemos que é dom e graça de Deus. Jesus usa deste exemplo para mostrar qual deve ser a postura da criatura diante do seu criador: Tudo procede de Deus, desde o nascimento até a glória dos céus que desejamos alcançar. Estamos sempre em dívida com o Senhor. E por mais que realizemos a sua vontade, nossas ações não passam de uma pobre correspondência aos dons divinos. O orgulho diante de Deus não tem sentido em uma criatura.  Não vamos exigir direitos da nossa vida enquanto correspondemos à graça e ao dom de Deus. Quando pregamos a palavra de Deus, levamos a catequese em frente, ou seja, é nossa missão, é nosso trabalho, nossa tarefa.  Recebemos de Deus para poder transmitir aos irmãos e irmãs, ou seja, essa consciência de que nós fizemos aquilo que nós somos chamados a fazer e a cumprir em nossa missão. Muitas brigas e muitas insatisfações paroquiais, diocesanas e pastorais na Igreja acontecem exatamente por isso porque nós achamos que somos mais do que os outros porque fizemos algo.  Mas a consciência de que é dom de Deus e pela fé nós enxergamos essa ação do Senhor não nos faz mais do que ninguém, mas nos faz servos: o próprio Jesus se colocou: se eu, vosso mestre e Senhor vos lavei os pés deveis também vós lavar os pés uns dos outrosJesus não veio para ser servido mas para servir e dar a vida em resgate por muitos. Façamos, meus irmãos e irmãs, que cresça essa consciência de poder trabalhar e servir a Deus e aos irmãos com generosidade com disponibilidade.

 Nesse sentido a segunda leitura da palavra de Deus desse domingo (2Tm 1,6-8.13-14) que é segunda carta em São Paulo a Timóteo, ele convida justamente:

Caríssimo: Exorto-te a reavivar a chama do dom de Deus que recebeste pela imposição das minhas mãos. Pois Deus não nos deu um espírito de timidez, mas de fortaleza, de amor e sobriedade.

 Paulo convida Timóteo a reavivar o dom do Senhor e é bem esse aspecto que somos chamados também a pedir ao Senhor nesse final de semana, nos colocarmos a servir. Pedimos ao Senhor que possa reavivar em nós o dom de servir, o dom de anunciar a Palavra, o dom de comunicar a boa notícia a todas as pessoas com disponibilidade.

Ao mesmo tempo Paulo, que estava preso por causa da fé, vai dizer para Timóteo: Não te envergonhes do testemunho de Nosso Senhor nem de mim, seu prisioneiro, mas sofre comigo pelo Evangelho, fortificado pelo poder de Deus.

Nós sabemos que no meio de tantas situações nós somos chamados a ser firmes mesmo quando tudo conspira contra nós, quando falam mal, quando tentam nos desanimar e nos colocar cada vez mais calados diante da verdade, que é anunciar Jesus Cristo Nosso Senhor.  Isso acontece de muitas maneiras, muitas vezes com martírios, outras com a expulsão de cidades, destruição de Igrejas. Outras vezes acontece através de situações do dia a dia, onde as mídias digitais tentam nos desacreditar, colocam mentiras para as pessoas serem levadas a desacreditar cada vez mais na pregação da Igreja e a desanimarem da Palavra de Deus e do caminho do Senhor. Portanto, é por isso que Paulo pede a Timóteo para reavivar o dom de Deus, pois não nos deu espirito de timidez, mas de fortaleza, de coragem, para que nós, sabendo como servos inúteis, no entanto continuemos servindo com generosidade e alegria mesmo no meio de tantas situações contraditórias.

 A leitura primeira de Habacuc (Hab 1,2-3; 2,2-4) faz referência a uma situação ainda presente ao nosso redor:

Senhor, até quando clamarei, sem me atenderes? Até quando devo gritar a ti: ‘Violência!’, sem me socorreres? Por que me fazes ver iniquidades, quando tu mesmo vês a maldade? Destruições e prepotência estão à minha frente; reina a discussão, surge a discórdia.

A situação ao nosso redor com tudo aquilo que a discussão, desavença, o mundo complexo de hoje onde as intolerâncias, as insatisfações ideológicas, religiosas e humanas acontecem diante de tantas situações complicadas. Diante disso é que responde o Senhor:

Respondeu-me o Senhor, dizendo: ‘Escreve esta visão, estende seus dizeres sobre tábuas, para que possa ser lida com facilidade. A visão refere-se a um prazo definido, mas tende para um desfecho, e não falhará; se demorar, espera, pois ela virá com certeza, e não tardará. Quem não é correto, vai morrer, mas o justo viverá por sua fé’.

 No meio de tantos problemas e dificuldades, espera no Senhor! Tenha fé! Acredite no Senhor que morreu na cruz, deu sua vida por todos nós, está vivo, presente no meio de nós hoje! A palavra nos questiona profundamente sobre a nossa missão de servidores, ao mesmo tempo nos chama a ter coragem, a reavivar o dom de Deus no meio das confusões do mundo de hoje, confiando no Senhor que vai fazer com que as coisas aconteçam e proclamar uma nova vida a todas as pessoas.

Peçamos ao Senhor também que nesse mês das missões, mês missionário extraordinário que iniciamos com a Semana Nacional da Vida, e ao mesmo tempo em que a Igreja vive o Sínodo da Amazônia, possamos continuar crescendo na fé e cumprindo bem a nossa missão. Temos certeza que o Espírito Santo vai nos conduzir colocando em prática a Palavra do Senhor. Temos certeza que o Senhor nos conduz, nos dá o dom, nos dá a graça e temos certeza também que espera de nós essa correspondência para podermos estar num estado permanente de missão. Tendo esse dom de Deus avivado e a esperança no Senhor cada vez mais continuada, para que o anúncio do evangelho continue presente no mundo de hoje. Missão que o Senhor nos dá e nos reserva para podermos ver cada vez mais um mundo novo, nascido da graça de Deus, que vem do dom do Senhor.

 

 

 

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