Artigos dos bispos

Dom Vital Corbellini
Bispo de Marabá (PA)  

 

 

Deus criou as suas obras de uma forma maravilhosa, bonita, de modo que ao encerrá-las, Ele disse que tudo era muito bom (cfr. Gn 1,31). Uma harmonia é existente entre as criaturas pois tudo se alterna para o bem das criaturas e na ordem dado pelo próprio Criador, porque Ele as criou com muito amor. A partir da Sagrada Escritura, a Campanha da Fraternidade 2025 coloca claramente a forma como Deus na sua infinita misericórdia, criou um universo cheio de belezas e de encantamentos pois com os olhos da fé, percebem-se uma harmonia de cores, de forças que alimentam a nossa vida de seguidores e seguidoras do Senhor. A seguir, nós vejamos o tema da harmonia do Universo nos padres da Igreja, os primeiros escritores do cristianismo.  

A harmonia no Universo

São Clemente Romano, bispo de Roma no final do primeiro e início do século segundo, disse que os céus que se movem por sua disposição, obedecem harmoniosamente ao Criador. O dia e a noite fazem o curso que o Senhor estabeleceu, sem que haja algum tropeço um no outro. Nesta mesma linha da harmonia do universo colocou o Bispo de Roma que o sol, a lua e os demais coros dos astros giram de uma forma correta, justa, conforme a ordem do Criador sem nenhuma transgressão 

O sustento ao ser humano e demais seres que vem da terra

O louvor é dado também à terra criada pelo Senhor na visão de Clemente porque ela germina conforme a vontade de Deus, produzindo nos devidos tempos, sustento para o ser humano, as feras e todos os seres que vivem sobre ela, sem haver a rebelião entre os seres. A terra dá os seus frutos conforme a ordem do Senhor para que os seres humanos e os demais seres vivos permaneçam na vida doada pelo Senhor.  

Os seres subterrâneos 

Segundo o bispo Clemente as mesmas ordens se mantêm as regiões insondáveis dos abismos que regem os seres subterrâneos. A massa do mar imenso não ultrapassa os limites traçados, mas tudo age conforme a lei ordenada pelo Senhor quando disse: “Chegarás até aqui, e tuas ondas sobre ti se quebrarão” (Jó 38,11). O oceano de uma forma quase sem fim para os seres humanos, e os mundos que estão além, são coordenados pelas leis do Senhor 

A beleza das estações

São Clemente falou da beleza das estações do universo como a primavera, o verão, o outono e o inverno sucedem-se de forma harmoniosa, uma após a outra. O vento realiza o seu trabalho no tempo devido sem perturbação. As fontes inesgotáveis em ligação com as estações foram criadas para a saúde do ser humano e dos seres existentes possibilitam a vida, o dom de Deus para todos os seres vivos 

O Criador e Senhor do Universo

O bispo de Roma disse também que o Criador e Senhor do Universos ordenou que todas essas coisas se executassem na paz e na concórdia. Ele espalhou seus benefícios sobre toda a criação, mas a todos nós Ele os prodigalizou de uma forma abundante, quando nós recorremos à sua infinita misericórdia por meio de nosso Senhor Jesus Cristo.  

O vinculo do amor de Deus

São Clemente disse ainda que o vínculo do amor de Deus une as pessoas e os povos. Quem exprimirá a grandiosidade da sua beleza? A altura para onde o amor conduz é de uma forma inefável. O amor nos une a Deus e Ele cobre a multidão dos pecados (1 Pd 4,8). No amor não há nada de banal, nem de algo soberbo. No amor, tornam-se perfeitos as pessoas eleitas de Deus. Na verdade sem amor nada é agradável a Deus. É por causa de seu amor para com toda a humanidade que Jesus Cristo, nosso Senhor, conforme a vontade de Deus, deu o seu sangue por nós e para todas as pessoas, sua carne e sua vida por nossa vida. 

A nova criação em Jesus Cristo 

A carta a Barnabé, escrito dos primeiros séculos do cristianismo, afirmou que a nova criação se realizou em Jesus Cristo. Como o ser humano pecou, no entanto a redenção ocorreu pela sua morte de cruz e ressurreição. Na retomada do plano original a Escritura fala a nossa respeito, quando o Criador disse ao Filho: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança (Gn 1,26). Que eles dominem sobre os animais da terra, as aves do céu e os peixes do mar” (Gn 1,28). E disse também: “Crescei, multiplicai-vos e enchei a terra” (Gn 1,28)9. Tudo isso o Senhor disse ao Filho em vista da criação nova e da salvação humana.  

Deus sobre todas as coisas

Novaciano, escritor romano do século III colocou a visão de que Deus está sobre todas as coisas, na qual tudo contém sem deixar qualquer vazio fora de si, nem lugar para outro deus superior. O Senhor Deus está acima de tudo, porque Ele mesmo incluiu tudo no seio de sua perfeita grandeza e potestade. Ele está sempre atento à sua obra, percorre-a toda, dando-lhe movimento e vivificando-a em sua totalidade, de modo a constituir um só mundo. Como tudo está consolidado numa grande harmonia dada pelo Senhor, esse mundo não pode ser dissolvido por força alguma, porque tudo concorre para o bem do Deus criador em relação as criaturas 

As orações pelas autoridades e pela vida do mundo

Tertuliano, padre africano dos séculos II e III, teve presente na vida da comunidade que eles iam juntos formando um grupo e uma congregação, a fim de que se aproximassem a Deus, assediassem a Ele, com orações como um batalhão de soldados. Esta virulência, para o padre africano era agradável a Deus. Ele dizia que os cristãos oravam pelos imperadores, por seus ministérios e por seus poderes, pelo estado presente do mundo, pela paz do mesmo, pelo adiamento do fim 

A harmonia do universo fala da grandeza de Deus ao criá-lo com potestade e com amor. As coisas e o ser humano saíram das mãos do Senhor pela harmonia de tudo, porque Deus fez tudo com sabedoria. Se o pecado humano veio para impedir a harmonia da criação no entanto, o Senhor Jesus estabeleceu novamente a harmonia original dando-nos vida nova e salvação. Nós somos chamados a viver a Campanha da Fraternidade 2025, neste tempo da quaresma cuidando da casa comum no qual o Senhor nos colocou como guardiães da mesma. Louvemos a Deus Uno e Trino pela harmonia dada ao universo criado com amor.  

 

Dom Carmo João Rhoden
Bispo Emérito de Taubaté (SP) 

 

“Deus, viu que tudo era muito bom” (Gn 1, 31) 

No Brasil, além da temática quaresmal normal, a Igreja ainda apresenta a Campanha da Fraternidade, para intensificar ainda mais a dimensão fraternal e social da vida cristã ou seja do Evangelho.  No ano de 2025 nos apresenta o tema “Fraternidade e ecologia integral” com o tema, “Deus viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31.  Analisando o que está acontecendo ao nosso redor, constatamos que não somente é oportuno, mas muito necessário e urgente. O tema ainda fica mais interessante, enquadrando-o na temática do ano Jubilar, ou Ano Santo. (peregrino de esperança) pois a esperança não nos decepciona (cf. Rm 8,5), mas o que ouvimos ao nosso redor frequentemente? “a vida não tem sentido” ou “é um beco sem saída”. Mas não é assim, pois estamos indo para casa do Pai. Nossa bússola é a fé, e o caminho é o amor.  

A pós-modernidade é tempo de crise e desânimo: “o fim do mundo está aí” dizem uns e outros apresentam “as enchentes, inundações de um lado e o calor, o aquecimento global no outro, não seriam sinais disto? Infelizmente os profetas do pessimismo crescem. Mas nós temos explicações mais convincentes e exigentes mais concretas e realistas. Sim, somos realistas: vemos, ouvimos e somos amparados pela Palavra de Deus. Reagimos: redescobrindo a fraternidade, a importância do meio ambiente e impulsionados pela esperança. Não somos ingênuos, nem pessimistas, mas realistas. Defendemos a fraternidade, a esperança e o meio ambiente, entre outras realidades. Somos peregrinos da Esperança. 

Deus viu que tudo era muito bom (Gn 1, 31) e nós hoje, como vemos as coisas? Como mudaram… a culpa, no entanto não é de Deus, mas nossa. 

 

 

 

Dom Paulo Mendes Peixoto
Arcebispo de Uberaba (MG)

 

São quarenta dias de reflexão e purificação. Foram quarenta dias de chuva para acontecer o dilúvio bíblico na “estória” da criação (cf. Gn 7,17), quando Noé apresenta a Arca da purificação. Os infiéis foram eliminados e começa um novo compromisso de Aliança, agora com Noé e com todos os seres vivos de então (cf. Gn 9,12). O número 40 aparece em vários momentos na História da Salvação. 

A travessia do povo da aliança pelo deserto, distanciando-se do clima de sofrimento nas terras do Egito, até chegar à região da promessa, aconteceu também durante quarenta anos. Jesus jejuou no deserto por quarenta dias e quarenta noites. O número 40 tinha o significado de purificação, renovação e tempo de provação. Não é diferente dos dias de hoje. É o que deve ser para nós a quaresma. 

Apesar de algumas críticas, mas os temas propostas para a Campanha da Fraternidade enriquecem muito a reflexão quaresmal. O alvo a atingir é a vida em Deus, o encontro com Cristo no alto da cruz. Mas isso é impossível acontecer sem a integridade da criação, quando Deus “viu que era bom” (Gn 1,12). Mas o que era bom vem sendo destruído pelo “progresso” dos últimos tempos. 

Então, o tema deste ano é “Ecologia Integral”, com o lema bíblico, “Deus viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31). Falar da dignidade humana e dignidade espiritual remete ao tema urgente da natureza criada, e criada para possibilitar a vida das pessoas. Assim sendo, destruir irresponsavelmente a natureza, é “pecado”, porque está ofendendo o Criador e ferindo o sentido real da vida espiritual. 

O dinamismo da tecnologia, na modernidade atual, é uma verdadeira tentação para o consumismo. Quanto mais a pessoa tem, mais ela quer ter. Jesus foi tentado a mudar de rumo, porque seu projeto desmontava a ordem cultural desumana daquele tempo. Mas não se deixou vencer pela maldade de seus acusadores e teve uma postura de firmeza na execução de seus princípios. 

 Ao iniciar o tempo quaresmal em direção à Páscoa, em Ano Jubilar, com o tema “Peregrinos de Esperança”, todo o trajeto deve ser realizado sob o clima de conversão, arrependimento, penitência e oração. Converter-se para Deus, mas com respeito e valorização da natureza, porque ela é fruto da bondade criadora do Senhor. Falar de Ecologia Integral é ter o coração sintonizado com o querer de Deus.