Artigos dos bispos

Dom Vital Corbellini
Bispo de Marabá (PA)  

 

Deus viu que tudo era muito bom (Gn 1,31). Este lema da Campanha da Fraternidade 2025 ajude-nos a ver na criação a beleza das coisas, pois Deus criou o universo, os seres vegetais, espirituais, animais e humanos com infinito amor. É importante perceber a forma como o Senhor criou as coisas a partir de Santo Ambrósio, bispo de Milão, no século IV, uma vez que ele fez uma análise das coisas de Deus criadas a serviço do ser humano e como é possível o cuidado para com todos os seres vivos.  

O sexto dia

A criação foi feita por Deus Pai Criador em seis dias. O sexto dia tem uma relevância particular porque antes da criação do ser humano teve a criação dos quadrúpedes, serpentes, os animais da terra e rebanhos, os répteis. Deus viu que era bom para em seguida Ele fazer o ser humano (cfr. Gn 1,24-26)1. Deus criou as coisas para o serviço do ser humano e não para o seu domínio. É claro que muitas delas, servem como alimento, sem misturas, mas com grandes sabores para a vida humana.  

A terra produza os frutos

Santo Ambrósio afirmou o dom da terra, criado por Deus que produza frutos para a vida humana. A graça da terra foi dada para todas as pessoas. Ele teve presentes o caso de Eliseu (cfr. 2 Rs 4, 38-43)com o seu servo que tinha dez pães de cevada para cem pessoas, de modo que o profeta disse que ele daria o suficiente e todos comeriam, porque como disse o Senhor, “comerão e ainda sobrarão” (cfr. 2 Rs 4,43). A fé nas coisas plantadas dá e dará colheita abundante, a comida na realidade humana pela realização das palavras do Senhor.

A beleza da criação

Deus fez as coisas em seis dias de modo que tudo foi feito de uma forma maravilhosa, bonita, bela. O bispo de Milão teve presentes as palavras do Senhor ditas em Isaias (cfr. Is 40,22) pois “Quem mediu a água com a mão e o céu com a palma, e toda a terra com a mão fechada?! Quem colocou os montes, os rochedos e os pratos na balança?!”. Foi com grande amor que o Senhor criou todas as coisas e os seres humanos. Uma outra pergunta levantou o bispo de Milão: “Qual é pois, o ser humano que ousa reivindicar para si uma sabedoria igual à de Deus tendo o seu conhecimento, próprio de Deus?!3. O poder de Deus na criação manifestou a sua beleza no qual tudo converge para o bem das coisas, dos seres humanos e da própria glória de Deus.  

O sexto dia nas gerações 

Santo Ambrósio teve presentes as palavras da Escritura onde Deus afirmou que a terra produza a alma vivente dos rebanhos, dos animais e répteis (Gn 1,24). Este ponto significou que a Palavra de Deus correu por toda a criação na constituição do mundo, de modo que fossem produzidas da terra as espécies de seres vivos que Deus determinou, de modo que todas viessem a ter uma sucessão conforme a sua espécie e semelhança. Na ordem do Criador a espécie gera outra espécie de modo que o leão gera leão, o tigre gera tigre, o boi gera boi, a vaca gera a vaca, o cisne gera cisne, a águia gera águia4. Cada espécie gera a sua própria espécie. Desta forma, o ser humano gera o ser humano.  

O Senhor é digno de louvor

Santo Ambrósio seguiu as palavras do salmista que disse: “Quão imensas são tuas obras, ó Senhor! Fizeste todas com sabedoria” (Sl 104,24). Todas as coisas foram feitas com perfeição. A sabedoria divina penetra todas, de modo que é mais forte o testemunho da natureza do que o argumento da doutrina5. O bispo de Milão teve presentes o conhecimento dos animais, e também dos seres humanos em se salvaguardarem diante dos perigos, a resistência e a coragem de todos os seres criados. Este movimento vem do próprio Criador. Os animais discernem pelo cheiro os alimentos nocivos e os salutares, porque a melhor mestra da verdade é pois a natureza6. A natureza das feras é simples, desconhecendo fraudes à verdade. Foi o Senhor, segundo Santo Ambrósio que Ele dispôs este poder de uma forma conveniente a todas as criaturas 

A sabedoria divina na humanidade

A Sabedoria dada às coisas pelo Senhor fizeram-nas prosseguir na existência de modo que Ele criou tudo com ordem, assim da mesma forma criou o ser humano com sabedoria8. Tudo procedeu de seu imenso poder para com todas as criaturas. Santo Ambrósio seguiu a Palavra de Deus que disse: “Admirável, de fato é o Senhor nas alturas”(Sl 93,4) 

A criação humana

O sexto dia colocou também a ordem de Deus que disse: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança”(Gn 1,26). O verbo ‘façamos’ coloca Deus Uno e Trino na criação humana. O Senhor não disse estas coisas aos anjos mas ao ser humano ao criá-lo com amor. O ser humano é criado, segundo as Escrituras, à imagem do Deus invisível e com o Primogênito de toda a criatura, Jesus Cristo (cf. Cl 1, 13-15)10. A criação humana dada na imagem do Criador e Redentor é para servir as criaturas e não para dominá-las. Ele foi percebido, criado segundo Santo Ambrósio para edificar a casa11. Ele tinha presente que a casa de Deus é comum ao pobre e ao rico12 de modo que todos tem os mesmos compromissos e deveres diante do Criador. Todos os seres vivos vêem as coisas mas somente ao ser humano foi dada a graça de ver o universo e contemplar o seu Criador 

Santo Ambrósio falou que o sexto dia criado por Deus fez as coisas, os animais domésticos e selvagens, e a totalidade da obra do mundo foi concluída, com a criação do ser humano, sendo o principado de todos os seres vivos, o ponto mais alto do universo, a graça dada para toda a criação14. Nós somos chamados a viver a Palavra de Deus no contexto humano, ecológico, eclesial, social e um dia nós sejamos participantes do Reino de Deus pelo amor a Deus, ao próximo como a si mesmo.  

Dom Antônio de Assis
Bispo auxiliar de Belém do Pará (PA)

Na agenda das celebrações do Ano Jubilar em Roma, também os jovens são contemplados e não poderia ser diferente, uma vez que nos últimos anos a Igreja Católica tem dedicado especial atenção à juventude. Fato extraordinário foi a realização de um Sínodo mundial sobre os jovens que se concluiu com a Exortação Apostólica Pós-sinodal Christus Vivit.  

Na Bula de proclamação do Ano Santo, «Spes non confundit – a esperança não engana» (Rm 5,5), o Papa Francisco cita seis vezes os jovens. Os jovens são chamados a “olhar para o futuro com esperança”, mas isso comporta a necessidade da educação para a maternidade e paternidade responsáveis e toda a sociedade deve ser corresponsável por isso (cf. SNC,9).  

Desafios do mundo juvenil 

Os jovens que são sinais de esperança têm necessidade dela; mas muitas vezes veem desmoronar-se os seus sonhos; é triste ver jovens sem esperança vivendo o presente na melancolia, no tédio, na incerteza, sem estudos, sem perspectiva de trabalho… É triste ver jovens no mundo da ilusão das drogas, confusos, na transgressão, na busca do efémero, com gestos autodestrutivos e perdendo o sentido da vida.  Por isso, afirma o Papa Francisco: “que o Jubileu seja, na Igreja, ocasião para um impulso a favor deles: com renovada paixão, cuidemos dos adolescentes, dos estudantes, dos namorados, das gerações jovens! Mantenhamo-nos próximo dos jovens, alegria e esperança da Igreja e do mundo!” (SNC,12). 

A partir das perspectivas colocadas pelo Papa Francisco, os educadores-pastores-missionários dos jovens são convidados a acolher o Ano Jubilar como uma oportunidade muito significativa para o relançamento da pastoral juvenil em diversas dimensões promovendo muitas atividades. A finalidade primordial é sempre aquela de estimular processos de formação e evangelização dos jovens contribuindo para o crescimento integral deles a partir da situação em que sem encontram e no mundo em que vivem. O pressuposto principal é aquele de que a Celebração do Jubileu tem como finalidade a experiência de um caminho de conversão.  Possíveis atividades com os jovens 

Para que o Ano Jubilar seja significativo para os jovens é necessário que se tenha sensibilidade pedagógica para que melhor possam compreender o que se vai propor-lhes; para isso, além da oração e de variadas práticas religiosas, é essencial a catequese educativa, bem como, experiências socioafetivas, caritativas, missionárias. É preciso evitar o intimismo que é sempre despido de compromissos sociais.  Vejamos alguma dimensões e possíveis atividades educativo-pastorais:   

Na dimensão humana: 

Promover reflexões sobre a beleza da vocação humana e o sentido da Vida;  

Organizar rodas de conversas sobre os males provocados pelos vícios e a beleza da prática das virtudes; 

Programar dinâmicas de grupos sobre a importância das sadias relações humanas: acolhida, respeito, gentileza, comunicação, delicadeza, não violência, perdão etc;     

Estimular e desafiar os jovens e adolescentes no exercício de bons hábitos no uso do celular, dando prioridade às pessoas; não levar o celular para as refeições, autodisciplinar-se, evitando a dependência tecnológica;   

Programar experiências recreativas para estimular a convivência, integração, cooperação, o fortalecimento dos laços de amizade;  

Apresentação de modelos de homens e mulheres, como os santos, com suas mais variadas virtudes, atitudes, ações e boas linhas de comportamento que abraçaram (assistir filmes dos santos, com tempos de partilha). 

Na dimensão catequética e espiritual: 

Favorecer aos jovens momentos semanais ou mensais de oração em grupo pelas juventudes, sobretudo pelas mais sofredoras;   

Celebrações de adoração, vigílias de oração e noites de louvor oferecendo momento de pregação, testemunhos e do sacramento da reconciliação; 

Proporcionar experiências de retiro para os jovens com temas relativos à esperança, sentido da vida, reconciliação;  

Celebração da Via Sacra, relacionando as estações com as realidades juvenis – (Cf. Via Sacra das Campanhas da Fraternidade dos Anos 1992 e 2013);  

Oferecer aos jovens celebrações litúrgicas especiais para concessão das indulgências plenárias com os devidos compromissos;   

Organizar peregrinações à Catedral, por Vicariatos (regiões episcopais) ou paróquias com uma programação catequética;  

Pensar na possibilidade de eventos públicos: musicais, caminhadas etc. 

Estimular a sinodalidade e a comunhão entre as expressões juvenis em vista de fortalecer no Setor Juventude a participação ativa na vida das comunidades; 

Corresponsabilizar as pastorais, grupos, movimentos pela promoção da pastoral juvenil em vista de rejuvenescê-los com a presença de mais jovens;  

Promover a Leitura Orante da Bíblia, sobretudo, com textos dos evangelhos;  

Celebrar um Congresso Juvenil dando possibilidade para um maior aprofundamento da realidade juvenil e assunção de compromissos sociopastorais; 

Preparar mutirões de confissões para os jovens, dentro de uma celebração penitencial;  

Nas rodas de conversa ou podcasts refletir sobre a inseparabilidade entre Cristo e a Igreja; “cristo sim, Igreja não”, é uma mentalidade errada!  

Na dimensão socio-missionária: 

Favorecer aos jovens o conhecimento do território da paróquia oferecendo-lhes a possibilidade de perceber necessidades e possibilidades de evangelização;  

Visitar as pessoas que vivem em condição de pobreza, abandono e miséria (ou moradores de rua, migrantes) que moram nas áreas com menos atenção pastoral; 

Visitar escolas e promover um evento catequético falando do sentido do Ano Santo;  

Organizar com os jovens o encontro com moradores de rua e visita à instituições terapêuticas, hospitais, abrigos de idosos e de crianças, ou onde for possível, unidades carcerárias;  

Desenvolver campanhas de solidariedade com múltiplos serviços e envolvendo instituições públicas e empresas;  

Estimular a experiência do voluntariado;  

Relacionar o Ano Santo com a questão ecológica, proporcionando aos jovens o compromisso de harmonia com a natureza e estimulando ações como o plantio de árvores, limpeza de praças, parques, praias, coleta seletiva; 

Onde for possível, articular algum evento ecumênico e de diálogo inter-religiosos estimulando a Paz e a fraternidade, contra a intolerância religiosa;  

Promover mutirões missionários programando a visita missionária de casa em casa concluindo à noite com uma celebração festiva;  

Fazer o mapeamento na paróquia sobre pessoas lesadas em seus direitos e estimular o serviço voluntários de profissionais para ajudá-los;  

Visitar os meios de comunicação como Rádios e TV para deixar uma mensagem sobre o Ano Santo;  

Produzir podcasts, entrevistas, vídeos… etc. sobre o Ano Santo para serem lançadas nas Redes Sociais fortalecendo a PASCOM. 

Na dimensão lúdica: 

Promover festivais artísticos e culturais (teatro, músicas, danças, exposições, coreografias…) com temas como reconciliação, amizade, libertação, esperança;  

Realizar gincanas envolvendo grupos juvenis com diversas atividades como questionário bíblico, esportivas, artísticas, culturais, religiosas, sociais;   

Organizar corridas, caminhadas, torneios, trilhas, passeios e outras atividades esportivas com os jovens tendo como meta a reflexão do tema do Ano Santo;   

Promover o Oratório Festivo, como espaço de entretenimento (com jogos de mesas, ping-pong, pebolim, músicas, esporte e outras atividades) para estimular a convivência entre jovens e adolescentes em clima de família. 

Enfim, muitas são as possibilidades pastorais que podemos oferecer aos jovens. Mas isso requer sensibilidade pedagógica, criatividade e foco na finalidade do Ano Jubilar. São muitos os meios que podemos utilizar para veicular boas mensagens e educar os jovens. O Papa Francisco na Exortação Apostólica Christus Vivit afirma: “Misericórdia, criatividade e esperança fazem crescer a vida” (CV, 173). Essas três realidade tem tudo a ver com Ano Jubilar, mas precisa ser programado.  

Dom João Santos Cardoso
Arcebispo de Natal (RN)

 

A educação é um dos pilares fundamentais para a construção de uma sociedade mais justa e solidária, especialmente no atual contexto de mudança de época, que exige a revisão dos caminhos da formação humana. Considerando essa realidade, em 12 de setembro de 2019, o Papa Francisco lançou um chamado para a reconstrução do Pacto Educativo Global, convocando educadores, líderes religiosos, governantes e toda a sociedade a um compromisso renovado com a educação como ferramenta de transformação social. 

Desde o lançamento da iniciativa, o mundo passou por transformações profundas. A revolução digital e a inteligência artificial automatizaram diversas funções, enquanto a desinformação e a polarização, amplificadas pelas mídias digitais, se tornaram desafios urgentes. Além disso, a pandemia de COVID-19 agravou desigualdades educacionais, evidenciando a necessidade de um modelo mais inclusivo e acessível. 

Diante desse cenário, o Pacto Educativo Global continua atual. O Papa Francisco propõe uma educação fundamentada na solidariedade, justiça, inclusão e fraternidade, princípios expressos especialmente na Evangelii Gaudium e na Laudato Si‘. Para ele, a educação deve estar no centro das transformações necessárias para superar fragmentações e construir um mundo mais humano e sustentável. 

Estruturado em sete compromissos fundamentais, o Pacto propõe incentivar a acolhida, renovar a economia e a política, responsabilizar a família e cuidar da casa comum. Além disso, busca uma educação capaz de superar a fragmentação e a polarização, promovendo espaços de diálogo e inclusão nas escolas e universidades. Também defende a justiça social e o desenvolvimento sustentável, formando cidadãos comprometidos com a ética, a equidade e o cuidado com o meio ambiente. Outro ponto central é o combate ao analfabetismo e à desigualdade no acesso ao ensino, por meio de políticas públicas e parcerias entre governos, instituições religiosas e educacionais. 

A Arquidiocese de Natal tem atuado ativamente na implementação dos princípios do Pacto Educativo Global, firmando parcerias com instituições de ensino superior, como o Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN) e a UFRN, e busca novos parceiros para fortalecer esse compromisso. O protocolo assinado entre a Arquidiocese e o IFRN, no início de fevereiro de 2025, reforça a prioridade de ampliar o acesso à educação para populações vulneráveis, promovendo inclusão social e oferecendo oportunidades formativas alinhadas à justiça social, à cultura e à sustentabilidade. 

Esse esforço reflete a longa tradição da Arquidiocese de Natal no campo educacional. Desde tempos em que o ensino era um privilégio de poucos, a Igreja esteve à frente de iniciativas que democratizaram o acesso ao conhecimento. Um exemplo inspirador foi o Movimento de Natal, com suas Escolas Radiofônicas, que permitiram a milhares de pessoas no interior do estado aprender a ler e escrever, conquistando cidadania e dignidade. 

A educação, no entanto, não pode ser um esforço isolado, mas um compromisso coletivo que envolva diversos setores da sociedade. O Papa Francisco nos convida a construir uma aliança educativa que vá além da sala de aula, englobando escolas, famílias, comunidades, governos e instituições religiosas, promovendo uma educação aberta, acessível e integral.  

Para que o Pacto Educativo Global se consolide, é fundamental fomentar políticas públicas que integrem seus princípios, promovendo parcerias entre governos, igrejas e instituições de ensino. Além disso, é necessário criar programas educacionais interdisciplinares, incorporando temas como ética, sustentabilidade e inclusão social nos currículos escolares. Também se faz essencial fortalecer redes de colaboração, unindo escolas, universidades, empresas e comunidades na construção de um sistema educacional transformador. Por fim, é imprescindível utilizar novas tecnologias de forma ética e inclusiva, garantindo que o avanço digital seja um aliado da educação, e não um fator de exclusão. 

Seis anos após o chamado do Papa Francisco, o Pacto Educativo Global continua sendo necessário e urgente. Diante dos desafios educacionais e sociais que marcam nosso tempo, sua proposta de reconstrução da educação como instrumento de fraternidade, justiça e sustentabilidade deve ser retomada com vigor, promovendo uma verdadeira transformação na sociedade.