Artigos dos bispos

Dom Antonio Carlos Rossi Keller
Bispo de Frederico Westphalen (RS)

 

As relações humanas são marcadas por momentos de encontro e desencontro. Assim também sucede com a fé cristã e exemplo disso é a morte de Jesus na cruz. Perante uma morte horrenda, injusta e cruel, “tudo está consumado”. É o fim. Os discípulos de Jesus “encontram-se desencontrados”. A morte deste homem é o fim das suas esperanças. Tudo o que viveram se tornara numa ilusão e num total fracasso. Vivem uma catástrofe. Cheios de medo, pavor, dúvidas e incredulidade, refugiam-se. 

E agora? 

Viu e acreditou 

Agora, correm para o túmulo. 

Maria Madalena é a primeira que vai logo “de manhãzinha, ainda escuro” ao sepulcro. Caminha com passo apressado, mas com um coração pesaroso, cheio de desânimo e de desencanto, porque pensava que a morte do seu Senhor seria o ponto final daquele que “passou fazendo o bem”. Vai até junto do túmulo e vê a grande pedra retirada e o sepulcro vazio. Corre novamente com passo apressado, mas com um coração cheio de esperança e de expectativa e dá a conhecer a Simão Pedro e ao discípulo amado. Todos correm, todos vêem e todos acreditam que o Senhor Jesus não está ali. Ressuscitou. 

Os discípulos veem e acreditam que o Senhor ressuscitou. O corpo de Jesus não estava ali, pois só encontraram as ligaduras e o sudário. O Filho de Deus não ficou no sepulcro, porque não podia continuar prisioneiro da morte. O túmulo não poderia encerrar Aquele que é a fonte da vida. Acreditar que Jesus ressuscitou é reconhecer que o mal e a morte, o ódio e o pecado, a desgraça e a vingança, não têm a última palavra, pois o amor de Deus é mais forte que a morte. O Pai mostra que uma vida como a de Jesus não se pode perder, nem a dele nem a nossa. Resta-nos viver nesta expectativa: o amor de Deus é mais forte que a nossa fragilidade e Cristo é a nossa vida e nos convida a viver na Sua graça. 

Anunciar o túmulo vazio 

É no túmulo que Maria Madalena, os discípulos (Pedro e o discípulo amado) e tantas outras pessoas (nós incluídos) encontrarão respostas. O túmulo deixará de ser sinal e sinônimo de sofrimento, de luto e de dor. É um novo espaço. É o espaço para a gestação da nova vida, dos novos discípulos de Jesus. O desafio torna-se claro: é preciso anunciar o túmulo vazio, anunciar a vitória da vida sobre a morte. O túmulo vazio é oportunidade para anunciar que após o inverno das nossas vidas virá sempre a primavera. A ressurreição de Jesus produz sempre rebentos de esperança por toda a parte e, ainda que os cortem, eles voltam a despontar, porque a ressurreição contém uma força de vida, uma força sem igual, que penetra este mundo e o outro. 

Anunciar o túmulo vazio é a missão da Igreja, de cada discípulo missionário. Este anúncio diz respeito a todos e toca a cada um. Quem acredita deve correr, como Maria Madalena e os discípulos, a anunciar com grande alegria que Cristo vive para sempre. 

Este é o dia que o Senhor fez: exultemos e anunciemos com alegria! 

Dom Rodolfo Luís Weber
Arcebispo de Passo Fundo (RS)

 

No início da Semana Santa a Igreja convida os fiéis: “Por isso, celebrando com fé e piedade a memória desta entrada, sigamos os passos de nosso Salvador para que, associados pela graça à sua cruz, participemos também de sua ressurreição e de sua vida”. A liturgia do Domingo de Ramos convida para que “sigamos o Senhor Jesus Cristo” (Lucas 19,28-40, Isaías 50,4-7, Salmo 21, Filipenses 2,6-11e Lucas 23,1-49). Ser cristão significa considerar o caminho de Jesus como caminho justo para os homens que conduz a meta de vida plena e autêntica. Ser cristão é um caminho, uma peregrinação, um ir juntamente com Jesus Cristo. Um ir naquela direção que Ele foi. Este caminho e meta nos é vislumbrado no Domingo de Ramos.  

A procissão de Ramos é um testemunho de júbilo, de festa que prestamos a Jesus nosso guia e mestre. As pessoas, que no relato do Evangelho, aclamam: “Bendito o Rei, que vem em nome do Senhor! Paz no céu e glória nas alturas!”. Estes discípulos ouviram, conviveram e testemunharam as ações de Jesus, agora precisam expressar gratidão e alegria. Fazem isto de forma solene e simples, “estendendo suas roupas no caminho”, “aos gritos e cheio de alegria”, louvam a Deus “por todos os milagres que tinha visto”.  

Hoje louvamos o Senhor pelos prodígios que realiza através das pessoas que acreditam em Jesus Cristo e procuram viver de acordo com os ensinamentos de dele: que se dedicam de forma voluntária ao serviço do próximo; que optam pela vida consagrada; que orientam sua vida moral pelo Evangelho; que promovem a paz; que em nome da verdade desvendam a mentira; que, no segredo da consciência, são movidos a fazer constantemente o bem ao próximo; que suscitam a reconciliação onde há ódio; que cuidam da obra da criação, nossa casa comum; que constroem fraternidade. O seguimento de Jesus vai tocando a essência da vida, ele provoca uma mudança no interior da existência. Impede de fechar-se sobre si mesmo, faz rever constantemente as opções e valores. Leva a escolher entre viver só para si mesmo ou doar-se a Cristo e a sua causa. 

Os textos bíblicos da liturgia recordam traços fundamentais do seguimento. O profeta Isaías apresenta um misterioso e profético personagem salvador. Não é um personagem triunfante e juiz, ao modo humano, mas sofredor, desfigurado e que se doa totalmente aos outros. A carta aos filipenses canta que Jesus Cristo, existindo em condição divina esvaziou-se de si mesmo, assumindo a condição de escravo e se fez igual aos homens, inclusive na morte. Por isso, dele deve ser exaltado e proclamado “Jesus Cristo é o Senhor!” 

Na narração da paixão e morte de Jesus os discípulos que aclamaram-no e acolherem-no em Jerusalém, o acompanham até a morte de cruz. Estão presentes não como espectadores, mas como discípulos seguindo Jesus até o último e decisivo instante. A Simão, de Cirene, “impuseram-lhe a cruz para carregá-la atrás de Jesus”. Em outra oportunidade Jesus tinha ensinado que quem quisesse ser seu discípulo deveria tomar a sua cruz e seguir atrás dele. Também a multidão se envolve: “Uma grande multidão do povo e de mulheres que batiam no peito e choravam por ele”. Ao final o evangelista registra, “E, as multidões que tinham acorrido para assistir, viram o que havia acontecido, e voltaram para casa, batendo no peito”. Jesus consola dizendo: “Não choreis por mim! Chorai por vós mesmas e por vossos filhos!” Bater no peito é um gesto de arrependimento e pedido de perdão. 

Aos discípulos que o contemplam pregado na cruz oferece o exemplo do perdão: “Pai, perdoa-lhes!” Assim se realiza o mandamento de perdoar, ensinado em tantas oportunidades. O sacrifício de Jesus na cruz transforma o mundo através da conversão e do perdão. A conversão abre as portas para a misericórdia. No final Lucas registra. “Todos os conhecidos de Jesus […] ficaram à distância, olhando essas coisas”. A meditação sobre o mistério salvífico escondido naquele evento é indispensável para colher o significado pessoal e vital para ser cristão.  

Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém do Pará (PA)

 

Ramos, flores, aclamações e gritos de hosana. Desde a entrada de Jesus em Jerusalém, a procissão não se interrompeu, e continuaremos a dizer-lhe que é bem acolhido, e ao mesmo tempo clamamos pela sua vinda no fim dos tempos. E em Jerusalém, assim como no correr dos séculos, depois dos vivas vem a Cruz, para chegar à Ressurreição. Vivemos bem dependurados nos polos do mistério de nossa vida e salvação: “Cristo morreu! Cristo ressuscitou! Cristo é o Senhor! Jesus Cristo há de voltar! Vem, ó Senhor!” Cada Semana Santa nos faz acompanhar os dias que antecederam a Páscoa e viver com o Senhor o drama e a trama dos acontecimentos, deixando-nos envolver por eles, sabendo que estão presentes no ano inteiro, nas celebrações litúrgicas, sobretudo na Santa Missa. De fato, na Eucaristia tudo isso é colocado à nossa disposição, para que se multipliquem os frutos da Salvação. 

O Domingo de Ramos nos faz acolher Jesus, recebendo-o nos vários ambientes de nossa vida, nas famílias, nas Comunidades de Fé e na Sociedade. Neste ano queremos acolher Jesus em nossa belíssima realidade amazônica. Ao elevar nossos ramos, desejamos proclamar que tudo o que Deus fez é muito bom e bonito! Bendita a Campanha da Fraternidade, que nos dá o sadio olhar de otimismo, proclamando fortemente que “Deus não fez a morte, nem se alegra com a perdição dos vivos. Ele criou todas as coisas para existirem, e as criaturas do orbe terrestre são saudáveis: nelas não há nenhum veneno mortal, e não é o mundo dos mortos que reina sobre a terra, pois a justiça é imortal” (Sb 1,13-15). Ao acolher Jesus, comprometamo-nos a gostar de nossa terra, admirar a natureza e aprender a tarefa do cuidado com tudo o que Deus pôs à nossa disposição. 

Entretanto, quando percorremos nossas cidades, observamos justamente a trágica realidade da falta do cuidado. Há o lixo pelas ruas, a falta de seriedade no tratamento dos resíduos, o relaxamento de todos nós quanto à atenção aos espaços destinados à vida e dignidade das pessoas. Queremos convidar Jesus a vir conosco, ensinando-nos a valorizar a natureza. Dele ouvimos recomendação: “Olhai os pássaros do céu: não semeiam, não colhem, nem guardam em celeiros. No entanto, o vosso Pai celeste os alimenta. Será que vós não valeis mais do que eles? Quem de vós pode, com sua preocupação, acrescentar um só dia à duração de sua vida? E por que ficar tão preocupados com a roupa? Olhai como crescem os lírios do campo. Não trabalham, nem fiam. No entanto, eu vos digo, nem Salomão, em toda a sua glória, jamais se vestiu como um só dentre eles. Ora, se Deus veste assim a erva do campo, que hoje está aí e amanhã é lançada ao forno, não fará ele muito mais por vós, gente fraca de fé? (Mt 6,26-30). Peçamos ao Senhor que caminhe conosco, como operários da limpeza pública, para fazer o nosso mundo mais digno e bonito. Entretanto, sabemos que na raiz de tudo está o pecado, que perturba e compromete a criação de Deus. Ousamos pedir a Jesus que saia conosco pelas ruas, como um Divino Lixeiro, e nós todos trabalhando com ele, ele que pagou pelos nossos pecados, lixo infinito por ele absorvido, para entregar nas mãos infinitas da Misericórdia Divina o que temos de mais feio, nossos pecados! Misericórdia, Senhor! 

Aquele que é bendito nos dá as mãos para entrarmos juntos nas casas de nossas famílias. Desejamos dizer que ele é bendito, sabendo que nele está a força e o poder para sanar os problemas que vivemos em nossas casas. Queremos também nos unir às famílias que cuidam com amor de pessoas enfermas. Com ele, queremos visitar as famílias em crise, os casais à beira da separação. Permita o Senhor que o tomemos pelas mãos para entrar nos espaços em que as pessoas se sentem solitárias e deprimidas. Só o Senhor pode ser companhia adequada de cada um dos filhos e filhas de Deus! 

Pedimos a Jesus que nos revista da caridade para servir e partilhar os nossos bens com aqueles que estão na miséria, dando o rosto da fraternidade a todas as nossas Paróquias e Comunidades. Desejamos percorrer nossos ambientes mais desafiadores e problemáticos. Com Jesus que entra em nossa cidade, queremos ser família e teto para quem não tem onde morar e a quem falta todo tipo de apoio. Que o Senhor encontre espaços, através de sua Igreja e de todos nós, cristãos, para chegar ao coração e à vida dos que são viciados.  

Agora, damos a palavra às crianças, para que elas nos provoquem e aprendamos a dizer “hosana”. Sim, com elas agradeçamos por todas as pessoas que se sentiram acolhidas em nossas Comunidades. E nos alegramos porque as vozes de nossas crianças não se calaram, e continuam cantando: “Bendito o Rei, que vem em nome do Senhor! Paz no Céu e glória nas alturas” (Lc19,38). Damos graças pelos irmãos e irmãs que silenciosamente realizam o serviço da caridade por todos os cantos. Neles, queremos agradecer a Deus por todas as pessoas, sejam quais forem suas idades e condições sociais, que desde a Páscoa passada encontraram Jesus e a Igreja. Fazemos festa pelas Comunidades de Igreja que cresceram e podem acolher mais pessoas nas celebrações pascais! Seja Deus louvado pelas famílias, cujas casas acolhem a Palavra de Deus e a Oração. Louvamos ao Senhor porque muitos jovens de nossa Arquidiocese acolheram o chamado vocacional e se dispõem a oferecer sua vida pelo anúncio do Reino de Deus. Com a candura das crianças desejamos olhar para o bem que é feito e experimentar o otimismo da fé, que nos sustenta na caminhada. 

Ao celebrar a Liturgia do Domingo de Ramos e da Paixão, entendemos que a força da Páscoa já ilumina nossos passos: “Hoje iniciamos, com toda a Igreja, a celebração do mistério pascal de nosso Senhor, sua morte e ressurreição. Para consumá-lo, Cristo entrou em Jerusalém, sua cidade. Por isso, celebrando com fé e piedade a memória desta entrada, sigamos os passos de nosso Salvador para que, associados pela graça à sua cruz, participemos também de sua ressureição e sua vida”. (cf. Liturgia do Domingo de Ramos).