Dom Carlos José
Bispo de Apucarana (PR)
“Jamais me esquecerei dos teus preceitos, pois por meio deles que preservas a minha vida. ” (Sl 119,93)
A Igreja de Cristo, sempre conduzida pelo Espírito Santo, e sob a intercessão da Virgem Maria, constantemente está nos recordando dos ensinamentos perenes e imutáveis da lei do Senhor que devem permear o caminhar dos homens desde sempre e para sempre, visando renovar em nós o compromisso pessoal e comunitário a que fomos chamados desde o nosso batismo: preservar a vida, nossa e de quem estiver sob nossa responsabilidade, em todo lugar, a qualquer custo e em qualquer circunstância, com gestos concretos, palavras acolhedoras e comportamentos que corroborem nossa pertença fiel ao único e verdadeiro Deus.
O mês de outubro é rico em celebrações que nos remetem ao cuidado com a vida. Começando com a Semana Nacional da Vida, com o tema ‘Serviço à Vida – Caminho de Fecundidade’, somos chamados a repensar sobre seu valor, sua dignidade, desde seu início até seu final. Verdadeiramente, cremos que a vida não nos pertence de fato? Cremos que pertencemos a Deus? Cremos que Dele viemos e para Ele devemos voltar um dia? Ou será que, com tantas opções de credos, doutrinas, ideologias, promessas de sucesso fácil e vida plena aqui na terra, estamos tirando de nós essa pertença Divina, essa dignidade de filhos de Deus, fugindo dessa realidade de que vida é passageira, de que não nascemos para viver aqui, esquecendo de que nosso destino é a eternidade feliz, junto ao Pai? Justamente para que vigiemos, é que a Igreja celebra neste mês o dia do Nascituro, a vida gerada no ventre materno que, desde a concepção, tem os mesmos direitos daquele que já é nascido.
Há, em cada vida humana, desde a primeira por Deus criada, o sopro interior do Criador: o Espirito de Deus habita em nós, a vida brotou do íntimo do Pai, somos, portanto, frutos do seu Espírito, de sua vontade e bondade. Não por Ele necessitar de nossa existência, pois Ele se basta a si mesmo, mas por Ele ser Amor absoluto e nos criar para sermos amados intensamente por Ele. O que somos então? Objetos? Não, claro que não! Somos homens e mulheres livres, totalmente livres, pois sendo Deus puro amor, não poderia nos manter presos a Ele. Somos absolutamente livres, como livre era a jovem Maria, que, ao receber a visita do Anjo, diante do anúncio de que seria a Mãe de Jesus, não pensou nas implicações que aquela gravidez lhe traria, embora soubesse como eram tratadas as mulheres naquela época, diante da gravidez antes de coabitarem com o esposo; antes, confiando na Palavra de Deus, entregou-se de corpo, alma e coração à vontade do Pai e respondeu sim à vida que se formava em seu ventre, cuidando com amor e coragem, do Filho nela gerado.
A Virgem Santíssima valorizou a vida, pois sabia do valor insondável de cada criatura criada por Deus. A vida é gerada para Deus e a ninguém é dado o direito de abortá-la ou abandoná-la, a fecundidade é um dom que muitos não têm e desejam, portanto, quem recebe esse dom, que o honre com amor e coragem, como o fez a Mãe de Jesus, não importando as circunstâncias. Na grande celebração da Padroeira e Rainha do Brasil, vemos como os sinais de Deus são abundantes e se atualizam para que nossa fé seja restaurada e edificada. Aquela pequenina imagem de Nossa Senhora, pescada em águas brasileiras num tempo de sofrimento e angústia, renovou a esperança do povo sofrido e amargurado.
Quando parte da imagem (o corpo) foi pescada (apareceu) nas águas caudalosas do Rio Paraíba do Sul, no ano de 1717, por três pescadores, era visível que havia sido esculpida mostrando sua gravidez, o que exaltava sua fecundidade e fidelidade à vida gerada em sua humilde e fiel Serva. Após nova pesca, a cabeça da imagem veio à rede, unindo-se perfeitamente ao corpo já encontrado: ali estava a imagem de Nossa Senhora Aparecida, providenciando uma fecunda pesca que saciou a fome e restaurou a fé de tantos que já se encontravam desanimados e aflitos.
As festividades de Nossa Senhora Aparecida, Rainha e Padroeira do Brasil, cuja devoção abrange todos os recantos de nosso país, faz-nos pensar na unidade necessária entre nós, os ramos e a Videira, que é Cristo. Assim como as duas partes da imagem da Mãe Aparecida fundiram-se numa só e alcançaram inúmeros milagres, nós, ramos unidos à Videira, alcançaremos, pelos méritos de Cristo, Cabeça da Igreja, a fecundidade da vida gerada por Deus, até os tempos infinitos. Que a Mãe Aparecida nos abençoe.