Dom Paulo Antônio De Conto
Administrador Apostólico da diocese de Nova Friburgo
Queridos irmãos e irmãs, com grande pesar, acompanhamos nos últimos dias atitudes que dilaceram a essência da humanidade.
Muitos pensadores, como Aristóteles, Marx e Engels categorizavam o Homem, por sua natureza, como um Animal Social. A doutrina católica vai além e enfatiza que o ser humano tem necessidade da vida social, não como algo acessório, e “graças ao contato com os demais, ao serviço mútuo e ao diálogo com os seus irmãos, o homem desenvolve as suas capacidades, e assim responde à sua vocação” (Catecismo da Igreja Católica, 1879).
O Concílio Vaticano II, reunindo as conclusões e definições a respeito da relação entre indivíduo e sociedade, ensina que tanto o progresso do ser humano, como o desenvolvimento da sociedade civil acontecem por mútua cooperação e dependência.
Portanto, a vida social não é algo estranho ao homem, ou seja, o isolamento fere a essência humana de relacionar-se. O indivíduo cresce como pessoa quando desenvolve livremente todas as suas qualidades e é capaz de responder à própria vocação, graças ao contato com os demais, ao mútuo serviço e ao diálogo com seus irmãos (cf. Gaudium et Spes, 25).
Esta reflexão, sem dúvida alguma, revela o caráter paradoxal do momento que estamos vivenciando. O isolamento social como medida de prevenção e diminuição da propagação da pandemia de COVID-19, por um lado fere gravemente nossa natureza social, por outro manifesta um cuidado consigo e com os iguais.
Contudo, o isolamento de que trata o documento conciliar refere-se àquele que diz respeito à cultura de morte e descarte praticado por grupos ideológicos que se julgam superiores ao direito universal da dignidade e da vida.
Assim, toda política que ignora o valor da família, da religiosidade e da democracia tende à destruição da sociedade como “um conjunto de pessoas ligadas de modo orgânico por um princípio de unidade que ultrapassa cada uma delas” (Catecismo da Igreja Católica, 1880).
O Concílio ainda adverte para o mal causado ao coração do homem pelas vicissitudes presentes na história, perpetuados em desejo de ódio, preconceito e violência. “Onde a ordem das coisas se encontra viciada pelas consequências do pecado, o homem, nascido com uma inclinação para o mal, encontra novos incitamentos para o pecado, que não pode superar sem grandes esforços e ajudado pela graça” (Gaudium et Spes, 25).
Por certo, as perturbações tão frequentes da ordem social vêm, em grande parte, das tensões existentes no seio das formas econômicas, políticas e sociais, alimentadas pelo egoísmo e pelo orgulho dos indivíduos, os quais também pervertem o ambiente social.
A nível de ilustração desta reflexão, tomamos a crescente violência sofrida por grupos sociais, que historicamente tiveram sua dignidade ignorada por serem julgados inferiores aos demais. A escravidão e a perseguição nazista são, com toda certeza, mostras da crueldade que pode ser levada à sociedade.
Infelizmente estas marcas históricas se perpetuam na cultura de muitas sociedades, ou pelo menos em parcela delas. Diante dos últimos acontecimentos, o Papa Francisco conclamou toda a humanidade à unidade e à oração contra todo e qualquer atitude de racismo e preconceito: “não podemos tolerar nem fechar os olhos para qualquer tipo de racismo ou de exclusão e pretender defender a sacralidade de cada vida humana. Ao mesmo tempo, devemos reconhecer que a violência das últimas noites é autodestrutiva e autolesionista. Nada se ganha com a violência e muito se perde” (Audiência Geral, 3 jun. 2020).
Unamo-nos, pois, como uma verdadeira comunidade de amor afim de superar os discursos de ódio e construirmos uma sociedade mais justa e fraterna.