Fazer tudo para a Glória de Deus

Dom Alberto Taveira Corrêa 
Arcebispo de Belém do Pará

Neste final de semana acontece o Carnaval. Em alguns lugares, muitos eventos são promovidos, especialmente pelas ruas das cidades, com muita música, barulho e muitas coisas nem sempre adequadas à dignidade humana dos filhos de Deus. Ocorre ainda o fenômeno do esvaziamento das grandes cidades, quando as pessoas buscam as praias e outros espaços adequados ao lazer. Para ambos os grupos, abre-se um leque de possibilidades, vantagens e riscos, provocando em nós, cristãos, uma reflexão. Mas há ainda outras pessoas que aproveitam os dias de Carnaval para Encontros e Retiros, com os quais desejam abrir-se à Palavra de Deus e estabelecer um conhecimento qualificado entre elas.

Quem participar da Santa Missa no Sábado ou no Domingo, e desejamos que muitos o façam, ouvirá uma leitura no mínimo “intrigante”: “Quer comais, quer bebais, quer façais qualquer outra coisa, fazei tudo para a glória de Deus. Não sejais motivo de tropeço para ninguém – judeus, gregos ou a igreja de Deus –, como também eu me esforço por agradar em tudo a todos, buscando não o que é vantajoso para mim, mas o que é vantajoso para o maior número de pessoas, a fim de que sejam salvas. Sede meus imitadores, como eu o sou de Cristo” (1 Cor 10,31–11,1). A chave para o comportamento adequado é a glória de Deus! Antes de falar, divertir-se, passear, trabalhar ou encontrar-se com as outras pessoas, na frente vem a glória de Deus!

O que glorifica a Deus? É de Santo Irineu a afirmação de que a glória de Deus é o homem vivo, e a vida do homem é a visão de Deus. Com efeito, se a manifestação de Deus, através da criação dá a vida a todos os seres da terra, muito mais a manifestação do Pai, por meio do Verbo, dá a vida a todos os que veem a Deus. (Cf. Tratado contra as heresias, de Santo Irineu, bispo, Século III). Reconhecer e dar o devido valor à dignidade humana glorifica a Deus. Um critério para saber se agradamos e damos glória ao Senhor é verificar se as pessoas são devidamente respeitadas em todos os sentidos. Pura ilusão pensar que pode ser estrada para a realização humana e glorificar o Senhor destrancar todas as porteiras e entregar-se ao vício, à busca desenfreada do prazer. Não existem feriados nem folgas para o cuidado com a saúde, respeito às leis de trânsito, cordialidade, reconhecimento do valor de cada pessoa criada como obra prima por Deus. Não dá para ficar impassíveis diante das páginas policiais dos jornais ou dos programas sensacionalistas de televisão, apenas fazendo contas de mortos e feridos ou da violência que se espalha impune entre nós! Dentro de poucos dias, começaremos em todo o Brasil a Campanha da Fraternidade de 2018: “Vós todos sois irmãos” (Mt 23,8): “Fraternidade e superação da violência”, com a qual a Igreja quer dar sua colaboração na cura dessa chaga social.

“Quer comais, quer bebais”. A gula e o destempero na bebida, além de serem prejudiciais à saúde, são pecados e impedem a plena comunhão com Deus. Por outro lado, não se trata de fazer alguma oração antes de cada gesto ou refeição, ainda que isso seja tão importante, mas agir segundo o plano de Deus, que sabiamente nos é explicado em sua Palavra e nas orientações da Igreja, além de ter sido dado de forma às vezes tão simples pelos pais e mães de família. Lembremo-nos das normas de civilidade e boa educação, cujo espaço de aprendizado é a família!

Na mesma linha da busca do que glorifica a Deus, há o dever de trazer outro desafiador ensinamento oportuno de São Paulo: “Porventura ignorais que vossos corpos são membros de Cristo? Poderia eu fazer dos membros de Cristo membros de uma prostituta?! De modo algum! Não sabeis que aquele que se une a uma prostituta torna-se com ela um só corpo? Pois está dito: ‘Os dois serão uma só carne’. Mas quem adere ao Senhor torna-se com ele um só espírito. Fugi da devassidão. Em geral, todo pecado que uma pessoa venha a cometer é exterior ao seu corpo. Mas quem pratica imoralidade sexual peca contra seu próprio corpo. Acaso ignorais que vosso corpo é templo do Espírito Santo que mora em vós e que recebestes de Deus? Ignorais que não pertenceis a vós mesmos? De fato, fostes comprados, e por preço muito alto! Então, glorificai a Deus no vosso corpo” (1 Cor 6,15-20). Valha o apelo a uma corajosa revisão de vida quanto à moral sexual e a libertinagem que se espalhou, tantas vezes justificada com argumentos falsos. Entretanto, seus frutos estão espalhados por toda parte. E aqui nasce um apelo aos pais e mães de família, para que não se omitam e levem a sério a formação de seus filhos e filhas para uma afetividade e sexualidade sadias e correspondentes à Palavra de Deus e à orientação da Igreja.

Podemos voltar ao Apóstolo, para acolher outro ensinamento: “Não escandalizeis a ninguém”. “Jesus disse a seus discípulos: ‘É inevitável que ocorram escândalos, mas ai daquele que os provoca! Seria melhor para ele ser atirado ao mar com uma pedra de moinho amarrada ao pescoço, do que fazer cair um só desses pequenos'” (Lc 17, 1-2). Há uma graça a ser pedida ao Senhor, de que nosso comportamento não seja pedra de tropeço para os outros. Glorifica a Deus quem age de tal forma que sua vida edifique quem está perto e os de longe, suscitando admiração, reconhecimento e desejo de imitação. Infelizmente, o que vemos nos dias de carnaval não edifica as pessoas, provoca indignação em quem tem maior sensibilidade, às vezes pelo menos um muxoxo de quem balança a cabeça e até, tristemente resignado, acha que os tempos estão mudados e que chegamos ao fim do mundo!

Não, o mundo não acabou e tudo indica que ainda teremos muito a fazer, enquanto esperamos a vinda do Senhor. Outras épocas da história foram revitalizadas pela coragem do testemunho dos santos, homens e mulheres capazes de nadar contra a correnteza, sendo diferentes para o bem, sem fanatismos, mas melhores do que a média das pessoas.

O Apóstolo São Paulo teve a ousadia de recomendar: “Sede meus imitadores, como eu o sou de Cristo”. Olhar para o Senhor e perguntar-nos sobre sua vontade e seu modo de agir nas circunstâncias concretas do dia a dia, aqui está o caminho. A vontade de Deus se manifesta às pessoas sensatas pela sua Palavra, o conselho de outras pessoas maduras na fé, a Palavra da Igreja e ainda, a voz do Espírito Santo, que fala à nossa consciência. Não abafar esta voz será receita diária para fazer tudo para a glória de Deus. Enfim, uma vida consistente de oração e participação na Santa Missa marcará um ritmo digno dos filhos de Deus que somos, para não nos acostumarmos a tudo o que pode nivelar por baixo nosso comportamento, já que somos chamados a buscar as coisas do alto (Cf. Cl 3,1).

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