Dom Luiz Antonio Lopes Ricci
Bispo Auxiliar de Niterói
É noite e Páscoa! “Ó noite de alegria verdadeira, que une de novo ao céu a terra inteira, pondo na treva humana a luz de Deus” (Proclamação da Páscoa).
A narrativa pascal do Evangelista Marcos traz uma pergunta extremamente significativa e atual: “quem removerá para nós a pedra?” Eis o texto:
“Quando passou o sábado, Maria Madalena e Maria, a mãe de Tiago, e Salomé, compraram perfumes para ungir o corpo de Jesus. E bem cedo, no primeiro dia da semana, ao nascer do sol, elas foram ao túmulo. E diziam entre si: ‘Quem removerá para nós a pedra da entrada do túmulo?’ Era uma pedra muito grande. Mas, quando olharam, viram que a pedra já tinha sido retirada. Entraram, então, no túmulo e viram um jovem, sentado ao lado direito, vestido de branco. Mas o jovem lhes disse: ‘Não vos assusteis! Vós procurais Jesus de Nazaré, que foi crucificado? Ele ressuscitou. Não está aqui. Vede o lugar onde o puseram. Ide, dizei a seus discípulos e a Pedro que ele irá à vossa frente, na Galileia. Lá vós o vereis, como ele mesmo tinha dito’”(Mc 16, 1-7).
Quem removerá para nós a pedra?
Esta pergunta, feita pelas piedosas mulheres, no amanhecer do domingo de Páscoa, constitui, também, um retrato da angústia humana diante do dramático cenário mundial, que precisa ser acolhido e vivenciado à luz da Páscoa, desta Noite Santa. Quem moverá esta imensa pedra denominada Covid-19, que já infectou e sepultou milhares de pessoas? Quando tudo isso passará? Quando poderemos voltar à normalidade, porém transformados pela dura experiência? Qual será o “novo normal”? Sairemos de casa “pascalizados”, recriados, restaurados, fortalecidos e melhores? Quem moverá essa pedra? O que está diante de nós: uma imensa pedra ou um sepulcro aberto e vazio? Ambos! Porém, a força vem do Ressuscitado, e por isso celebramos com muita fé a Páscoa do Senhor. É ela que nos capacita, para rolar as pedras da vida e para encontrar sentido existencial e espiritual, para tudo o que estamos vivendo nesse período de pandemia. É compreensível que neste momento, como em tantos outros, experimentemos o que, poeticamente, expressou a mulher de fé, Adélia Prado: “Deus de vez em quando me tira a poesia. Olho para uma pedra e vejo uma pedra”. A Páscoa, certamente, nos devolve a poesia e a capacidade de ver além da pedra, entrar no sepulcro vazio, crer na Ressurreição e sair “pascalizados”, para seguir rolando esta e tantas outras pedras, no olhar da fé em Cristo Vivo. Se “a fé remove montanhas”, não seria uma situação como a atual que nos privaria de celebrar, com alegria e gratidão, a maior festa cristã: a Páscoa! Reiniciar é preciso!
Quem rolará a pedra para nós? Aquela do sepulcro foi removida por Deus e pelos seus anjos. As de hoje são removidas por tantas pessoas que se colocam a serviço da vida: médicos, profissionais da saúde, gestores e políticos responsáveis, funcionários de serviços essenciais, igrejas e voluntários que, de diversos e inspirados modos, ajudam a amenizar o sofrimento dos irmãos, sobretudo dos mais pobres e vulneráveis. São incontáveis os anjos de Deus que se colocam a serviço da vida. Nossa gratidão a todos e todas! Quantos sinais pascais diante de nós!
Quem irá rolar a pedra? Os três juntos: Deus, cada um e todos. Tu, Senhor, eu e nós.
E a pedra da pandemia? Idem.
E as pedras da injustiça, da desigualdade, da violência, do ódio e da pobreza? Idem.
E as minhas pedras que me paralisam? Idem.
Nesta noite, “vossa família recorda a ressurreição do Senhor, na esperança de ver o dia sem ocaso, quando a humanidade inteira repousará junto de vós. Então, contemplaremos vossa face e louvaremos, sem fim, vossa misericórdia” (Prefácio IX).
Como outrora aos discípulos, naquele entardecer do Domingo de Páscoa, Ele caminha conosco, nos escuta, releva as Escrituras e parte o pão para nós. E nós pedimos com insistência: “Fica conosco Senhor, pois já é tarde e a noite vem chegando” (Lc 24, 29). Por essa razão, na certeza da Páscoa de Cristo, caminhamos com fé, esperança e caridade, para aquele domingo sem ocaso, que nunca acabará.
A noite chegou… Porém, é noite de Páscoa! Com a Luz fulgurante dessa noite podemos enfrentar as outras noites da vida, vencer o desânimo e a tristeza, e seguir… Páscoa é envio para missão. Jesus vai à nossa frente… Vamos? Reiniciar é preciso.
Feliz e Santa Páscoa! A vida venceu a morte!
Aleluia, aleluia, aleluia! Ele Vive, para sempre!
Sigamos acreditando na vida, no amor e com esperança renovada e pascalizada. “Sem a Cruz, o poder de Jesus não seria amor e sem a Ressurreição, o amor não seria o autêntico poder”.
Com a minha proximidade, orações e bênção,
Dom Luiz Antonio Lopes Ricci – Páscoa 2020.