Dom João Justino de Medeiros Silva
Administrador Apostólico da arquidiocese de Montes Claros (MG)
Com a possibilidade da cremação dos corpos defuntos emergem muitas perguntas. Os católicos devem saber que a Igreja dá orientações bem precisas para seus fiéis sobre a escolha da cremação ao invés do sepultamento. A celebração do velório e das exéquias é, sem dúvida, um momento pastoral de grande importância. A morte e o morrer são temas que tocam o mais profundo do ser humano. Os cristãos sempre preferiram sepultar o corpo na terra, por considerar mais conforme à fé na ressurreição de Jesus: “Eu vos transmiti, antes de tudo, o que eu mesmo recebi, a saber: que Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, foi sepultado e, ao terceiro dia, foi ressuscitado, segundo as Escrituras, e apareceu a Cefas e, depois, aos Doze” (1Cor 15,3-5).
No nosso tempo, todavia, também devido à alteração das condições de ambiente e de vida, está a consolidar-se a prática da cremação do corpo defunto. A esse propósito, a legislação eclesiástica dispõe quanto à possibilidade de conceder-se o Rito das Exéquias Cristãs àqueles que escolheram a cremação do seu cadáver, a não ser que essa decisão tenha sido feita por motivações contrárias à doutrina cristã. A Igreja não se opõe a essa prática, visto que ela, em si, não é contrária à fé. Mas, reafirma e explicita-se, pela cremação, igualmente, o sentido pascal da morte cristã, pois o fogo simboliza, também, a purificação dos pecados (cf. Is 6,7) e evoca o sentido de oferta pascal do próprio corpo que, pelo batismo, já foi ofertado e consagrado ao Senhor pelo fogo do Espírito Santo. Mesmo assim, a Igreja continua a preferir a sepultura dos corpos, como nosso Senhor mesmo quis ser sepultado.
A Igreja orienta que se concedam os ritos das exéquias cristãs aos que escolheram a cremação do próprio corpo, a não ser que conste terem eles feito essa opção por razões contrárias à fé cristã. As exéquias sejam celebradas conforme os Rituais da Igreja, podendo ser realizadas no próprio prédio do crematório e, no caso de faltar um lugar idôneo, na própria sala de cremação, sempre com o cuidado de evitar escândalo e indiferentismo religioso. Quaisquer que sejam as motivações legítimas que levaram à escolha da cremação do cadáver, as cinzas do defunto devem ser conservadas, por norma, num lugar sagrado, isto é, no cemitério ou, se for o caso, numa igreja ou num lugar especialmente dedicado a esse fim, determinado pela autoridade eclesiástica. A conservação das cinzas em casa não é consentida, nem elas devem ser divididas entre os vários núcleos familiares.
Muitas vezes as cinzas são espalhadas num jardim, no mar ou no alto de uma montanha. Essa prática não se coaduna bem com a índole cristã e pode ser motivada por uma concepção panteísta da vida. Por isso, a Igreja Católica não a recomenda. Assim, também, exclui-se a conservação das cinzas de defuntos cremados sob a forma de recordação comemorativa, em peças de joalheria ou em outros objetos. Há um rito específico que poderá ser utilizado depois da cremação, para o momento da deposição da urna com as cinzas no cemitério ou noutro lugar a ele equiparado. Em caso algum a urna, com as cinzas do defunto, poderá ser levada à igreja para a comemoração de aniversário ou noutras ocasiões. Com essas orientações, renovemos a fé em Cristo. N’Ele brilhou para nós a esperança da feliz ressurreição, e para os que creem n’Ele a vida não é tirada, mas transformada (cf. Prefácio dos Fiéis Defuntos I – A esperança da ressurreição em Cristo).