Dom Murilo S.R. Krieger
Arcebispo de Salvador
Por parte de pai, sou descendente de alemães (meu bisavô) e de italianos (minha avó); por parte de mãe, de portugueses açorianos. Uns e outros vieram para o Brasil pelos mesmos motivos: desemprego e fome em seus países de origem. Vieram para cá em busca de esperança e adotaram esta terra como sua. Por que recordo isso? Porque sou grato à acolhida que meus antepassados aqui tiveram.
Nestes últimos meses, milhares de venezuelanos têm saído de seu país. Fogem da fome, do desemprego e da falta de perspectivas, resultado de um governo doentio e insensível. Eles não estão vindo em busca de ouro ou prata. Move-os a esperança de conseguir pão, emprego e um mínimo de vida digna. Sonham até em conseguir algum recurso para enviar aos seus parentes que lá ficaram e não têm condições ou saúde para fazer uma viagem que é desumana, sob muitos aspectos. Olhando o mapa da América do Sul, vemos que os venezuelanos, além de atravessar a pé boa parte de seu próprio país, entram no Brasil por Roraima, um dos nossos Estados mais pobres e isolados. Dali, se não forem ajudados, não terão para onde ir, pois naquela região não há estradas.
Como eles estão sendo acolhidos em nosso país? Com muitas promessas governamentais e com a ajuda concreta que alguns grupos estão conseguindo lhes dar. Dentre esses grupos, destaca-se o trabalho da Diocese de Roraima que, tendo à frente seu Bispo, Dom Mário Antônio da Silva, desdobra-se para transformar em alimento, abrigo e roupa o dinheiro que lhe é enviado pelas demais dioceses brasileiras.
Grave é o que têm sucedido num ou noutro local: nossos irmãos venezuelanos são vistos e tratados como inimigos. Seus abrigos são destruídos, ofensas lhes são dirigidas e – como entender o ser humano? – há brasileiros que se aproveitam de sua situação para explorá-los de mil formas, todas infames.
“Era estrangeiro e me acolhestes”, proclamará Jesus no Juízo Final, e convidará os que assim agiram a se aproximarem dele. Descobriremos, então, que a acolhida (ou rejeição) que demos a quem veio ao nosso encontro, particularmente em situação de desespero e fome, foi a Jesus que a demos.
Se quisermos apresentar desculpas para nossa indiferença diante desse drama que parece não ter fim, não será difícil encontrá-las. Mas elas não resistirão nem ao tempo nem ao amor. Se quisermos colaborar para que nossos irmãos venezuelanos tenham dignidade e, se possível, trabalho, nossa generosidade e criatividade descobrirão caminhos. Por sinal, saibam os que participaram da Campanha da Fraternidade de 2018 que 40% de sua oferta está sendo destinada a eles.
Por fim, uma pergunta: e se fôssemos nós que estivéssemos numa situação assim? Como gostaríamos de ser tratados?…