Dom Moacir Silva
Bispo Diocesano de São José dos Campos – SP
Ao aproximarmos da celebração dos 50 anos da realização do Concílio Vaticano II (1962-1965) somos convidados a retomar e aprofundar a riqueza dos seus ensinamentos. A respeito da Quaresma, o Concílio afirmou: “Tanto na liturgia quanto na catequese litúrgica esclareça-se melhor a dupla índole do tempo quaresmal, que, principalmente pela lembrança ou preparação do Batismo e pela penitência, fazendo os fiéis ouvirem com mais frequência a palavra de Deus e entregarem-se à oração, os dispõem à celebração do mistério pascal” (SC, 109). A dupla índole do tempo quaresmal é a batismal (recordação ou preparação do Batismo) e a penitencial.
O tempo quaresmal tem uma finalidade, que é preparar os fiéis para a celebração do mistério pascal, mediante uma escuta mais frequente da Palavra de Deus e pela oração. As Normas Universais para o Ano Litúrgico e Calendário (NUALC), nos números 27-31, apresentam algumas orientações sobre a Quaresma: “O Tempo da Quaresma visa preparar a celebração da Páscoa; a liturgia quaresmal, com efeito, dispõe para a celebração do mistério pascal tanto para os catecúmenos, pelos diversos graus de iniciação cristã, como os fiéis, pela comemoração do batismo e pela penitência. O Tempo da Quaresma vai da Quarta-feira de Cinzas até a Missa da Ceia do Senhor exclusive. Do início da Quaresma até a Vigília pascal não se diz o Aleluia. Na Quarta-feira de abrupta da Quaresma, que por toda parte é dia de Jejum, faz-se a imposição das cinzas. Os Domingos deste tempo são chamados 1º, 2º, 3º, 4º e 5º domingos da Quaresma. O 6º domingo, com o qual se inicia a Semana Santa, é chamado “Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor”.
Os dois primeiros domingos têm temática fixa em todos os anos, variando apenas conforme o evangelista do ano (neste ano A é São Mateus). No primeiro domingo temos as tentações de Jesus no deserto e, no segundo, a transfiguração do Senhor. Nestes domingos contemplamos Jesus como modelo da vida de penitência dos cristãos. O Jesus que jejua, o Jesus que se dedica à oração, deve ser visto à luz do Cristo transfigurado. Toda a caminhada da conversão dos cristãos só tem sentido à luz da ressurreição prenunciada na transfiguração.
A partir do terceiro domingo temos uma diversificação, de acordo com os ciclos do Ano A, B e C. Neste Ano A aparece com mais clareza a temática batismal. O Batismo será revivido no Tríduo Pascal e, especialmente, na Solene Vigília.
No terceiro domingo temos como tema batismal Cristo, fonte de água viva, isto é, de vida plena em oposição a Lei do Antigo Testamento e a tudo o que não sacia a sede ou os anseios humanos de verdade e vida. O personagem central, junto a Cristo, manancial de água viva, é a samaritana, símbolo da busca da vida, que só encontra em Cristo.
No quarto domingo o tema batismal é Cristo, luz para o homem. Personagem simbólico do catecúmeno que busca Cristo-Luz, é o cego de nascença, iluminado duplamente, no físico (cura da cegueira) e no espiritual ao mergulhar-se em Cristo, Enviado do Pai.
No quinto domingo temos como tema batismal Cristo, ressurreição e vida, onde junto ao Senhor aparece Lázaro, resgatado do impossível (morto há quatro dias) e estabelecido aos seus, como sinal da ação restauradora, recriadora de Deus em Cristo.
O tempo quaresmal com seu conteúdo bíblico, teológico e litúrgico é riquíssimo para nossa vivência cristã e para nossa vida de discípulos missionários de Jesus Cristo. Chamando nossa atenção para a dimensão batismal, é um convite a nos prepararmos para a renovação dos nossos compromissos batismais, na Solene Vigília Pascal. Esta preparação passa pela dimensão penitencial, ou seja, pela prática da conversão para renovar as promessas do batismo. Nós temos consciência de que ainda não estamos na plenitude do ideal cristão; sabemos que o processo de nossa conversão ainda não chegou ao fim. Por isso, aproveitemos a riqueza deste tempo quaresmal para avançamos no caminho da conversão e podermos celebrar bem a Páscoa do Senhor.