Por cinco domingos nossas comunidades eclesiais vão ler e meditar o capítulo 6º do evangelho narrado por João, começando pela multiplicação dos pães realizada por Jesus, seguida por longo discurso sobre o pão da vida na sinagoga de Cafarnaum, com todas as conseqüências também para nós.

No gesto de Jesus que fez a gente sentar-se em torno dele, tomou cinco pães e os distribuiu a cinco mil pessoas, vemos o amor de um Deus que veio para estar perto de nós querendo preencher com a sua presença o vazio do nosso coração, para enriquecer nossas inteligências com os valores do Espírito, e dar o significado profundo de nossa vida.

Depois do milagre, a multidão queria fazê-lo rei. Um belo sonho teriam os governantes para resolver os problemas econômicos do pais, com a conseqüente coroação do taumaturgo. Já o imperador Nero oferecia pão e circo para o povo. Mas Jesus pensava e ensinava diversamente.

Alguma vez a gente não compreendia Jesus. Um risco que também nós corremos. De fato, com Jesus, caminhamos no sentido de compreender o mistério do seu amor. O verbo de Deus feito homem vindo habitar entre nós é realidade que ultrapassa a nossa compreensão, as nossas expectativas, sobretudo nossos programas humanos.

Por que Jesus teve esse gesto de multiplicar os pães e os peixes? Por solidariedade com a gente? Certamente. Jesus se comovia diante das multidões que lhe pareciam como rebanho sem pastores. Mas não terminava aí. Há algo que a gente não podia atingir, como não compreendiam ainda os apóstolos naquele momento. Depois de dois mil anos, podemos entender melhor que, com o milagre da multiplicação dos pães, Jesus queria preparar seus discípulos para acolher o mistério indizível da Eucaristia.

O Verbo encarnado queria tornar-se o Deus ‘conosco’ para sempre, e a Eucaristia seria a misteriosa modalidade. Jesus queria reunir os seus amigos na maravilhosa realidade social e espiritual que será a Igreja. E pensou que o banquete eucarístico deve ser o lugar da unidade. Os seus amigos, encontrando-se com ele e entre si na Eucaristia, teriam depois em si a força e a coragem de mudar o mundo.

Jesus deu cumprimento pleno a esse projeto revolucionário na última ceia da Quinta Feira Santa, pronunciando as palavras que, por sua ordem, repetimos na missa: “Tomai e comei, tomai e bebei: isto é meu corpo, este é o cálice do meu sangue.” Mas para levar seus discípulos a acolher o mistério, devia prepará-los. E a multiplicação dos pães, gesto simbólico, foi o primeiro passo.

Se considerarmos com atenção esse episódio, notamos muitos elementos que evocam a Eucaristia, a missa. A nossa missa.

Há o reunir-se de muitas pessoas entorno de Jesus. Vieram para ouvi-lo, para acolher a sua palavra. E Jesus está ali para elas, para escutá-las, para falar-lhes. Depois executa o gesto. Distribui o pão para criar comunhão. Um menino põe à disposição o que tem, pão simples, o pão dos pobres. Jesus aceita o dom de boa vontade da gente, e cria.

Cria algo que nutre todos. Com abundância. Com desproporção. Disse o apóstolo Filipe: “Duzentos dinheiros de pão não são suficientes. Um dinheiro, moeda, era o salário de um dia de trabalho. Era necessário muito pão. Mas bastou para todos, e houve sobra que encheu doze cestos. Parece a generosidade de nossas mães que trazem à mesa o alimento a fim de que todos se sirvam e ainda sobre. Assim Jesus preparava seus amigos a compreender o mistério eucarístico.

Jesus dirá com poucas palavras simples a seus discípulos, e diz também a nós: “Eu sou o pão vivo descido do céu. A minha carne é verdadeiro alimento, meu sangue é verdadeira bebida. Quem vem a mim não terá mais fome, quem crê em mim não terá mais sede”. Um discurso peremptório para quem escuta: aceitá-lo ou recusá-lo. Quem escuta se põe pró ou contra Jesus.

Muitos se colocam contra Jesus e até querem corrigir o evangelho. E o abandonam. Jesus pergunta: “E vós não quereis também deixar-me?” E vem a resposta decisiva de Pedro, homem de fé, homem dos momentos difíceis: “A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna”. O significado da distribuição do pão é a distribuição do amor, para os males do mundo a única solução: o diálogo, a verdade, a justiça, o perdão, a misericórdia, a solidariedade.

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