Dom João Bosco Óliver de Faria
Arcebispo Emérito de Diamantina (MG)
Georges Bernanos em seu livro Diário de um Pároco de Aldeia, premiado pela Academia Francesa de Letras, assim descreve os Padres: Multidão venerável de clérigos zelosos, irrepreensíveis, que consagram suas forças às esmagadoras tarefas do ministério. Quem se atreveria, entretanto, a afirmar que a prática das virtudes heroicas seja privilégio dos monges ou dos simples leigos. (Bernanos, Georges, Diário de um Pároco de Aldeia, Paulus, 2a Ed., 1999, pag. 86).
Completarei nos próximos dias 83 anos de idade e destes 54 de sacerdócio, sendo 35 como Bispo em três dioceses. Pude, assim, contemplar, ao vivo, a realização das palavras de Bernanos, por estar diante de sacerdotes jovens, com mais e com menos saúde, outros com suas cabeças enfeitadas pelos cabelos brancos, os quais testemunham uma doação total ao serviço da seara do Senhor. Na Arquidiocese de Diamantina, ao lado de um leito hospitalar, preparei um desses jovens Padres para o encontro final com o Pastor dos pastores. Disse-lhe, com carinho e delicadeza, que seu tempo estava se completando. Perguntou-me, então: Dom João Bosco, 35 anos de idade… por quê? Respondi-lhe: Padre Jair, a pergunta a se fazer é outra: – “Para quê?” Continuamos a conversar por duas horas completas.
Na Diocese de Patos de Minas, vi Mons. Josias Tolentino de Araújo, já aposentado como Diretor de Escola Estadual, doar, permanentemente, seu salário de aposentadoria aos mais pobres. Viveu sempre na pobreza, com calçado e roupas simples, numa vida espartana e de alimentação frugal.
Vi em Santa Rita de Caldas, na Arquidiocese de Pouso Alegre, Mons. Alderigi Maria Torriani, ter aberto, na parede de seu quarto, um espaço de 25cm de altura por 50cm de largura, aproximadamente, para, do leito de sua doença final, abençoar e atender, em confissão, seus paroquianos que se enfileiravam na varanda de sua casa.
Na vida episcopal, consolei mais de um Padre, em pranto convulsivo, pelas incompreensões recebidas de seus paroquianos.
A Providência Divina permitiu-me, ainda, pregar o retiro anual a mais de 25% do clero do Brasil. Tive oportunidade, então, de ouvir as confidências de nossos padres, do norte ao sul do País: corações fervorosos e generosos dedicando-se, no seu melhor, ao bem do povo que lhes fora confiado.
Quanta doação a Cristo, à Sua Igreja no anúncio do Evangelho! Nós Bispos consagramos, enviamos e orientamos nossos sacerdotes no serviço do altar, mas é o Clero que carrega a Igreja nas costas, apoiado por leigos e leigas dedicados. De um lado, o Bispo, com sua presença evangelizadora, fortalecendo o seu povo na fé, por toda a Diocese, sacrificando-se, também ele, em viagens contínuas e sofridas, por estradas nem sempre “razoáveis”, às vezes, em altas horas da noite e, do outro, seus Padres se sacrificando, não menos ainda, pelo bem do povo que lhes foi confiado.
O ministério ordenado para ser vivido em profundidade exige o peso escondido de um sacrifício pessoal, total e contínuo de cada sacerdote. Entendi, ainda seminarista, que ser sacerdote é aceitar ser outro Cristo crucificado.
Agradecendo a Deus o dom de minha vida e do sacerdócio, por este tempo abençoado, homenageio, de coração, todos os meus irmãos Bispos e Sacerdotes que vivem a alegria de oferecerem suas vidas por Cristo e pela Igreja!
