Sabedoria no uso dos bens temporais

Dom Antonio Carlos Rossi Keller

Bispo de Frederico Westphalen

O 25º Domingo do Tempo Comum, no Ano C do ciclo litúrgico, nos convida a uma profunda reflexão sobre o tema da sabedoria no manejo dos bens materiais e da justiça social. As leituras bíblicas deste domingo entrelaçam denúncias proféticas contra a exploração dos pobres, exortações à oração por todos e a parábola evangélica do administrador infiel, que nos desafia a usar os recursos deste mundo de forma astuta e ética, visando o Reino de Deus. Em um tempo marcado por desigualdades econômicas e consumismo exacerbado, a liturgia nos recorda que os “filhos da luz” devem ser mais espertos que os “filhos deste mundo” no trato com o dinheiro, transformando-o em instrumento de solidariedade e salvação eterna, em vez de ídolo que escraviza.

Na 1.a Leitura (Amós 8,4-7), o profeta Amós, em uma das passagens mais veementes do Antigo Testamento, denuncia os comerciantes que exploram os pobres para maximizar lucros, manipulando medidas e preços. “Escutai bem, vós que espezinhais o pobre e quereis eliminar os humildes da terra”, clama o profeta. Deus, jurando pela glória de Jacó, promete não esquecer essas obras injustas, sublinhando que a justiça divina é inexorável. Esta leitura nos interpela a examinar nossas práticas econômicas: em um mundo de globalização e desigualdades, como evitamos “arranjar balanças falsas” em nossas relações laborais e comerciais?

São Paulo, em sua Carta a Timóteo (1 Timóteo 2,1-8), exorta à oração incessante por todos os homens, especialmente pelos reis e autoridades, para que possamos viver em paz e piedade. “Há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens, o homem Jesus Cristo”, afirma o apóstolo, destacando o desejo divino de que todos se salvem pelo conhecimento da verdade. Esta leitura universaliza a intercessão cristã, rompendo barreiras sociais e políticas, e convida os fiéis a elevarem “mãos santas, sem ira nem contenda”. Em um contexto de polarizações sociais, econômicas e sobretudo políticas, Paulo nos lembra que a oração é o caminho para a reconciliação e a dignidade humana, alinhando-se ao tema da justiça ao promover uma vida tranquila para todos.
No Evangelho (Lucas 16,1-13), a parábola do administrador desonesto, narrada por Jesus, é um dos textos mais enigmáticos dos Evangelhos. Um mordomo acusado de dissipar os bens de seu senhor reduz as dívidas dos devedores para garantir aliados futuros, e o senhor o elogia pela esperteza.

Jesus conclui: “Os filhos deste mundo são mais espertos […] no trato com os seus semelhantes” e adverte: “Ninguém pode servir a dois senhores: […] Não podeis servir a Deus e ao dinheiro”. Aqui, o foco não é a desonestidade, mas a astúcia: usar os “bens injustos” (o dinheiro) para conquistar amigos eternos, preparando-nos para as “moradas eternas”. O Evangelho nos desafia a uma economia do dom, onde os recursos temporais servem ao eterno, ecoando as leituras anteriores em uma visão integrada de justiça e salvação.

As leituras do 25º Domingo do Tempo Comum tecem uma tapeçaria coesa: a denúncia profética, a oração intercessora e a sabedoria evangélica, tudo converge para uma mensagem de conversão ética e espiritual. Deus, que não esquece os oprimidos, nos chama a ser instrumentos de Sua justiça, orando pela paz universal e usando astutamente os bens para o bem comum. Em vez de servirmos ao dinheiro como fim, devemos servi-lo como meio para o Reino, cultivando uma vida de generosidade que antecipa a eternidade.

Para viver essa mensagem no dia a dia, aqui vão três indicações práticas:
1. Pratique a justiça no cotidiano profissional: Examine suas transações diárias – no trabalho, compras ou relações pessoais – e evite qualquer forma de abuso ou exploração, optando por escolhas éticas que beneficiem os mais vulneráveis, como, por exemplo, apoiar produtores locais.
2. Cultive a oração intercessora: Reserve um momento diário para rezar pelos líderes políticos e pelas vítimas de injustiças sociais, políticas, judiciárias, transformando a oração em ato de solidariedade que promove paz e reconciliação em sua comunidade.
3. Use os recursos para o eterno: Faça um “balanço astuto” de suas finanças mensais, destinando uma porção específica para doações ou voluntariado, vendo o dinheiro não como posse egoísta, mas como semente para amizades eternas e o crescimento do Reino de Deus.

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