Dom Rodolfo Luís Weber
Arcebispo de Passo Fundo (RS)

Jesus aprofunda o tema do uso dos bens através da parábola do homem rico e do pobre Lázaro. Ele parte do princípio que todos os bens, sejam materiais ou imateriais, são destinados ao bem comum (Amós 6,1.4-7, Salmo 145, e Timóteo 6,11-16 e Lucas 16,19-31). O “homem rico que se vestia com roupas finas e elegantes e fazia festas esplêndidas todos os dias”, personifica o uso injusto, egoísta e maldoso dos bens diante do quadro da miséria absoluta de Lázaro. A parábola convida para olhar as questões sociais, principalmente a fome e a falta de qualidade de vida de milhões de pessoas pelo mundo afora.

A recomendação de São Paulo a Timóteo orienta o agir dos cristãos de todos os tempos. “Tu que és homem de Deus, foge das coisas perversas, procura a justiça, a piedade, a fé, o amor, a firmeza, a mansidão. Combate o bom combate da fé, conquista a vida eterna, para a qual foste chamado e pela qual fizestes tua nobre profissão de fé diante de muitas testemunhas”. A parábola não tem por objetivo central ressaltar a condenação do homem rico, mas sim que ele não escutou “Moisés e os profetas”. Isto é, durante a vida ele foi ensinado a ser justo, bom, fraterno, mas preferiu cavar um “grande abismo”. O tempo de construir pontes é durante a vida, pois no dia da morte fecha-se este período. São Paulo exorta Timóteo fazendo-o ver que o tempo presente é decisivo para procurar a justiça e conquistar a vida eterna.

Vivemos o Ano Jubilar iluminados pelo lema “Peregrinos de Esperança”. Esperamos que um dia a cena real que motivou a parábola de Jesus não exista mais. A esperança apela para ações sérias e retas para tornar o mundo mais luminoso e humano, e assim se abram as portas para o futuro com mais dignidade para todos os seres humanos. Todos as ações humanas sempre serão limitadas devido à natureza humana, porém o nosso agir não é indiferente diante de Deus. Do mesmo modo, o nosso agir não é indiferente para o desenrolar da história.

Faz parte da finitude humana o sofrimento, por mais que nos esforcemos nunca podemos eliminá-lo totalmente. Porém, ninguém pode ficar indiferente diante do sofrimento. “A grandeza da humanidade determina-se essencialmente na relação com o sofrimento e com quem sofre. Isto vale tanto para o indivíduo como para a sociedade. Uma sociedade que não consegue aceitar os que sofrem e não é capaz de contribuir, mediante a compaixão, para fazer com que o sofrimento seja compartilhado e assumido mesmo interiormente, é uma sociedade cruel e desumana” (Bento XVI, Spe Salvi, n. 38). O sofrimento oriundo da não satisfação das necessidades básicas é um convite para os cristãos se empenharem na construção da sociedade mais justa e igualitária, fazendo isto movidos pela fé e o amor ao próximo.

Parábola fala do juízo de Deus. A questão da justiça divina é um argumento forte em favor da fé na vida eterna. A injustiça não pode ter a última palavra, mas sim a justiça. É verdade que existe uma íntima relação entre justiça e graça. O juízo de Deus é esperança por ser justiça e por ser graça. Se fosse somente graça tornaria irrelevante tudo o que é terreno. Se fosse pura justiça o Juízo de Deus poderia ser para todos nós só motivo de medo.

“O juízo de Deus, que é amor só poderá basear-se no amor, especialmente naquele que tivermos, ou não, praticado para com os necessitados, nos quais Cristo, o próprio juiz, está presente. Trata-se de um juízo diferente do juízo dos homens e dos tribunais terrenos; deve ser entendido como uma relação verdadeira com Deus-amor e consigo mesmo dentro do mistério insondável da misericórdia divina” (Franscisco, Spes non confundit n.22).

A justiça divina é um apelo à responsabilidade. Constantemente somos chamados à responsabilidade e não precisamos de argumentos espetaculares e nem de catástrofes para sensibilizar da existência de problemas sérios. Na parábola o condenado implora a Deus pelos cinco irmãos: “se um dos mortos for até eles, certamente vão se converter”, mas recebe como resposta “se não escutam Moisés, nem os Profetas, eles não acreditarão, mesmo que alguém ressuscite dos mortos”.

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