Medianeira da Graça e da Esperança 

Dom Leomar Antônio Brustolin
Arcebispo de Santa Maria (RS)

 

Vivemos um tempo em que a humanidade experimenta profundas transformações: mudanças culturais, crises sociais, incertezas políticas e angústias existenciais. O avanço da tecnologia não eliminou a solidão, o progresso material não saciou a fome de sentido, a pluralidade de vozes não silenciou o clamor por esperança. Nesse contexto de desafios, a figura de Maria, invocada como Mãe e Medianeira da Graça, surge como sinal luminoso e porto seguro para o povo de Deus. 

Chamamos Maria de Medianeira porque ela é o caminho por onde passam nossas súplicas e chegam ao coração do Pai. Toda graça vem de Deus, por meio de Cristo, o único Mediador. Contudo, a providência divina quis associar a Mãe ao mistério do Filho. Sua mediação não é concorrente, mas derivada: Maria reflete a luz do Sol da Justiça, como a lua que brilha apenas porque recebe a luz do sol. Assim, a Igreja proclama: “Feliz és tu, ó Maria, pois de ti nasceu o Cristo, Mediador e Salvador!”. 

A mãe que intercede por nós  

As Escrituras nos ajudam a compreender este mistério. No livro de Ester (8,3-8), a rainha intercede junto ao rei em favor de seu povo ameaçado. Ester não pede para si, mas coloca sua vida a serviço da salvação dos outros. Esta cena prefigura a missão de Maria, que, como nova Ester, apresenta diante de Deus os clamores da humanidade. Na festa da Medianeira, celebramos esta verdade: Maria continua a entrar no trono do Rei para suplicar por seus filhos. 

O Evangelho de João (2,1-11) nos mostra Maria atenta às necessidades humanas. Nas bodas de Caná, percebe que “não têm mais vinho”. Quantas vezes também nós sentimos falta do “vinho” da alegria, da saúde, da fé, da paz nas famílias? Maria não é indiferente. Ela percebe, intercede e confia. Recebe do Filho a resposta que é também programa de vida: “Fazei tudo o que Ele vos disser”. A Mãe não retém para si as graças, mas nos orienta a voltar o olhar para Jesus, o único capaz de transformar a água em vinho novo, as lágrimas em esperança, o vazio em plenitude. 

Maria sinal de esperança para o nosso tempo 

Em tempos de provação, essa dimensão da mediação de Maria se torna ainda mais necessária. Quando a violência atinge lares e comunidades, Maria nos recorda a força transformadora da ternura. Quando a desesperança ameaça os jovens, ela nos ensina a esperar contra toda esperança. Quando a fé vacila diante das crises, Maria nos sustenta com sua presença orante. Como discípula perfeita, que acreditou que “para Deus nada é impossível” (Lc 1,37), Maria mostra que a graça de Deus é sempre maior do que nossas fragilidades. 

O Concílio Vaticano II ensinou que a mediação de Maria “de modo nenhum obscurece nem diminui a única mediação de Cristo, mas até manifesta a sua força” (Lumen Gentium 60). Ao mesmo tempo, a Igreja reconhece que Maria é ícone da humanidade redimida, sinal daquilo que todos somos chamados a ser. Nela contemplamos a vitória da graça sobre o pecado, a luz sobre as trevas, a vida sobre a morte. Ela é a mulher vestida de sol (Ap 12,1), coroada pela glória de Deus, mas profundamente próxima de cada filho. 

Celebrar Maria, Medianeira da Graça, em tempos de desafios é recordar que não estamos sozinhos. A Mãe caminha conosco, segura nossas mãos e apresenta nossas preces ao seu Filho. É também um convite a fazermos como ela: sermos medianeiros de paz, instrumentos de reconciliação e portadores de esperança. Em uma sociedade marcada pela divisão, pela indiferença e pela pressa, Maria nos inspira a cultivar vínculos de ternura e a manter acesa a chama da fé. 

Por isso, diante das dificuldades de nosso tempo, rezamos:  

Ó Maria, Mãe e Medianeira da Graça, quando faltar o vinho da alegria em nossos lares, sê tu o sorriso do céu em nossas lágrimas. Quando o peso da vida nos cansar, acolhe-nos em teu colo de ternura. Quando a fé vacilar, guia-nos até Jesus. E quando a noite for longa, acende em nós a luz da esperança. Intercede, ó Mãe, para que em meio aos desafios nunca percamos a confiança no teu Filho, e para que, por tuas mãos maternas, chegue até nós a abundância da graça de Deus. 

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