Dom Lindomar Rocha Mota
Bispo de São Luís de Montes Belos (GO)
A Palavra foi pronunciada antes do próprio tempo. Ela pulsa no instante inaugural em que “no princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Tudo foi feito por meio dele, e sem Ele nada do que existe veio a ser” (Jo 1,1-3).
O silêncio compactado que precedeu o primeiro lampejo do universo era o Verbo, o Logos eterno, respirando no ventre do ainda não-tempo; e, quando a luz irrompeu, foi o eco visível daquela Palavra primordial que, como um poema originou o cosmos. Desde então, toda a realidade segue na mesma melodia.
As forças da gravidade, eletromagnetismo, interações nucleares que sustentam a criação, são os modos discretos com que o Verbo mantém o mundo coeso. A gravidade que faz as estrelas se abraçarem na imensidão, é o gesto silencioso de sua fidelidade. O eletromagnetismo, que organiza o movimento dos átomos e permite que cada forma exista, é a ternura matemática de sua mão.
A força nuclear forte, que resiste ao caos dentro dos núcleos, revela sua persistência, e a força nuclear fraca, que permite ao sol acender-se sem violência, é o suspiro de um Deus que brilha sem ferir.
Esses movimentos, que parecem arbitrários, revelam-se profundamente proporcionados, pois o Logos escreve o real como quem segue a curva de uma espiral áurea.
O Verbo, que sustentou galáxias, navega no interior das células, escrevendo no DNA o poema silencioso da vida com quatro letras que se repetem desde o princípio. Na ambiguidade quântica, onde partículas surgem e recuam em frações de mistério, há uma lembrança de que toda existência repousa na liberdade do Logos.
Quando a vida se organiza em pétalas, nervuras, flocos, ciclones, turbilhões, ela invariavelmente segue a lógica da espiral áurea, como se a criação inteira obedecesse a um sopro antigo que ordena o caos com rigorosa delicadeza.
Cada vibração da matéria, da onda de luz, do campo energético é ressonância dessa Palavra que dá forma e proporção.
Não por acaso tantos cientistas descrevem o universo como música, pois o Verbo, que estava no princípio, é também a melodia que retine nos alicerces do real, e sua partitura parece seguir o ritmo secreto do mesmo princípio geométrico com que Deus moldou o mundo.
O poeta vê no céu estrelado uma frase interrompida; o místico percebe no silêncio uma sintaxe secreta; a fé reconhece que o mundo inteiro é uma metáfora sustentada por uma única Palavra. A fé é a gramática invisível que une o cósmico ao íntimo, o infinito ao cotidiano. E, como toda arte verdadeira, ela percebe que o belo não é um capricho, é proporção.
É aquele equilíbrio misterioso que faz com que o todo seja maior do que a soma das partes, como acontece na proporção áurea, onde cada segmento guarda relação viva com o todo. Assim também Deus abarca o grande e o pequeno, o eterno e o breve, o universal e o pessoal.
Advento é o tempo em que essa harmonia se manifesta com nitidez. É quando o céu e a terra respiram juntos, quando a poesia se curva diante do mistério e a fé se ergue com a leveza de quem espera o que já pressente.
O Logos, que ordena galáxias, também sustenta corações, pois a alma foi moldada segundo uma razão áurea interior, uma harmonia que permite suportar o peso da vida sem perder a leveza da fé.
E então, no ápice dessa linguagem que une estrelas e flores, o Verbo se faz carne e o Autor entra na própria narrativa. O Logos, que estava com Deus desde o princípio e por quem tudo foi feito, escolhe viver no tempo.
Ele, que arquitetou nebulosas em espirais grandiosas, agora se enrosca na espiral minúscula do ventre de Maria, realizando o gesto mais audacioso de toda a história.
A Encarnação é a versão mais radical da proporção áurea, onde o infinito e o finito se relacionam de modo perfeito, sem ruptura, sem violência, sem perda. Aquele que moldou o mundo segundo a harmonia repousa no ritmo deste próprio mundo.
O Advento é o instante de Deus. Um instante que, momentos antes dispersos nas estrelas, nos átomos e nos profetas, condensa-se num único rosto.
A música do cosmos encontra sua melodia. A lógica do universo a sua gramática. Toda a beleza matemática encontra sua figura.
O logos que ordenou o ser habita entre nós, e a vastidão do universo se recolhe na fragilidade de Belém. A Palavra eterna, ainda silenciosa na manjedoura, diz mais do que todas as frases pronunciadas desde o início do mundo.
Assim, da primeira expansão de luz ao último suspiro de esperança, o universo inteiro se inclina em direção ao mesmo sentido e a criação insinua que o Verbo que estava no princípio é o mesmo, e sua Palavra atravessa as eras para sussurrar ao mundo que ainda vale a pena esperar, pois Ele vem!
