“Aqueles que têm responsabilidades políticas não devem esquecer ou subestimar a dimensão moral da representação, que consiste no empenho de compartilhar a sorte do povo e em buscar a solução dos problemas sociais. Nesta perspectiva, autoridade responsável significa também autoridade exercida mediante o recurso às virtudes que favorecem o exercício do poder com espírito de serviço (paciência, caridade, modestia, moderação, esforço de partilha); uma autoridade exercida por pessoas capazes de assumir autenticamente como finalidade do próprio agir o bem comum e não o prestígio ou a aquisição de vantagens pessoais” (CDSI 410).
O bom funcionamento da democracia pressupõe que os eleitores votem com consciência esclarecida sobre as reais necessidades do povo e com real conhecimento da probidade e da competência dos candidatos a funções públicas. O Supremo Tribunal Federal julgou que impedir a candidatura de políticos com processo por corrupção feriria a justiça uma vez que a sentença final poderia ser de absolvição, declaração de inocência. Houve quem, reconhecendo a validade desse argumento, sugerisse que fossem impedidos de se candidatarem pelo menos os condenados em primeira instância. De qualquer forma fica evidenciada a necessidade de formação da consciência política dos cidadãos como condição necessária para o bom funcionamento da democracia.
O texto que inicia essa reflexão lembra, especialmente aos políticos, sua condição de representantes do povo, insistindo na dimensão moral da representação. A corrupção é uma das mais graves deformações da prática política e semeia no meio do povo a descrença em relação ao regime democrático. Há de fato políticos que fizeram da ação política instrumento para garantir interesses econômicos da família ou de grupos. Não buscam o bem comum, usam o poder que lhes foi conferido pelos eleitores para benefício próprio. Elegem-se sempre de novo e assim garantem o sucesso de seus empreendimentos econômicos e costumam transformar a própria família em herdeira do poder adquirido mediante uma complicada rede de influências sustentada por concessão de favores, promessas e oferecimento de empregos etc…
Sobrevivem em nosso país, em formas novas, antigas oligarquias. Sobre isso alerta-nos o Compêndio de Doutrina Social: “Entre as deformações do sistema democrático, a corrupção política é uma das mais graves porque trai, ao mesmo tempo, os princípios da moral e as normas da justiça social; compromete o correto funcionamento do Estado, influindo negativamente na relação entre governantes e governados; introduzindo uma crescente desconfiança em relação à política e aos seus representantes, com o conseqüente enfraquecimento das instituições. A corrupção política distorce na raiz a função das instituições representativas, porque as usa como terreno de barganha política entre solicitações clientelares e favores dos governantes. Deste modo, as opções políticas favorecem os objetivos restritos de quantos possuem os meios para influenciá-las e impedem a realização do bem comum de todos os cidadãos” (411).
O remédio para esta chaga que fragiliza a democracia é mais democracia, ou seja, mais participação das pessoas no processo político. Já ouvi de várias pessoas a afirmação de que não mais votariam porque a política é o espaço onde tudo se joga pelo poder, na busca de interesses menores. A Igreja, em seu ensinamento social, insiste que a política é o espaço onde se tomam as mais importantes decisões relativas ao bem da sociedade como um todo.
A política, assim o entendeu também Aristóteles, é o lugar por excelência do exercício da ética, onde a justiça deve reinar soberana. Mas, lembrava o mesmo filósofo, para que a prática política seja regida pela justiça, os cidadãos, desde crianças, devem ser educados para a virtude. Amantes e praticantes da justiça, os cidadãos estarão atentos a tudo aquilo que diz respeito à vida da sociedade, não recusando nunca assumir funções para as quais forem chamados e tiverem reconhecida competência.
As eleições constituem um momento importante do processo democrático, o voto do povo “unge”, confere autoridade aos seus representantes. Os eleitos, se professam a fé cristã, receberão como vinda de Deus a missão que lhes foi dada pelo voto do povo, pois toda autoridade vem de Deus. Responderão diante de Deus pelo que tiverem feito da missão que lhes foi confiada. Mas quem vota – e todos devemos votar – é também responsável pelos atos praticados pelos seus representantes. Donde a necessidade de refletir e consolidar razões que justifiquem a autenticidade e correção do próprio voto.