A casa ou o lar sempre figurou na missão de Jesus, pois nela, freqüentemente ministrava ensinamentos especiais. Era o próprio Jesus o anfitrião, tal como nos relata Mc 2,15; 6,34-44; 8,1-10 e Lc 12,37. Esse elo entre missão e as casas apontam para práticas catequéticas da igreja, especialmente a de Marcos, desenvolvias ao redor e dentro da vida doméstica.

Nestas residências particulares, as reuniões cristãs eram realizadas por uma necessidade prática, pois garantiam a privacidade, intimidade e estabilidade para os cristãos primitivos, assim como propiciavam um ambiente no qual se relacionavam uns com os outros, provendo subestrutura econômica, plataforma para o trabalho missionário, estrutura para a liderança e autoridade e, provavelmente, com papel definido para as mulheres.

Neste tempo, as igrejas dos cristãos primitivos se reuniam em dois níveis: nas residências particulares ao redor de uma família, como unidade menor -“igrejas domésticas” e, num segundo nível, como unidades maiores, em assembléia de todas as famílias cristãs e indivíduos de uma cidade, as “igrejas locais ou igrejas da cidade”, realizadas também em residências particulares.

É bem provável que o apóstolo Paulo não tenha fundado nenhuma destas igrejas domésticas, pois, muitas delas já existiam bem antes de sua chegada a determinados locais. Outros grupos de cristãos primitivos, fora do círculo paulino, também já se reuniam em casas particulares, como se pode constatar na primeira epístola de Pedro, escrita provavelmente em Roma, referindo-se indiretamente às igrejas domésticas.

Porém, o apóstolo Paulo, em suas saudações: “Saudai Priscila e Áquila…e também a Igreja que se reúne em sua casa” (Rm16,3.5) e em outras saudações suas encontradas em 1 Cor,16,19; Fl 2; Cl 4,15, nos mostram que Paulo fala explicitamente sobre as igrejas domésticas, como assembléias de cristãos organizadas dentro e ao redor de famílias particulares. Para ele, o lar com seu ambiente familiar era a igreja.

A terminologia – família e lar – utilizada por Paulo, indica que para ele não eram expressões vazias. A linguagem da família ia além das palavras tomadas nos cultos ou relacionamentos interpessoais. Ele é o apóstolo e pai ( 1 Ts 2,11), para suas comunidades que são famílias. Utiliza com freqüência os termos irmã, irmãos, (Rm15,14; Fl 2,25; 3,1…), filho ( Fl 2,22; Fm 10 …) , mãe ( Gl 4,19; Rm 16,13). Paulo viveu essa relação familiar com seus colaboradores e comunidades e queria que eles vivessem o mesmo.

A conversão de uma família e a conseqüente formação de uma igreja doméstica constituía em um elemento importante nos planos de Paulo para propagar o Evangelho no mundo. Como podemos verificar em Atos, Paulo teve pouco sucesso pregando nas sinagogas. Seu método, então, foi mudado para estabelecer-se com uma família proeminente, e assim criar sua base missionária em determinada cidade. (cf. At 16,13-34; 17,1-9;18,1-18). Daí as menções freqüentes de batismos, não só de indivíduos, mas de famílias inteiras.

O trabalho de Paulo era caracterizado por suas inúmeras viagens. A fim de realizar sua missão, ele dependia do trabalho partilhado e relacionamentos sociais centralizados nas famílias. Para tal, era necessário cultivar a hospitalidade, pois significava não só apoio material, mas também ligação com seu Evangelho. Em suas recomendações, Paulo solicita conceder hospitalidade aos seus mensageiros, ou seja, fosse oferecida a esses, suficiente assistência para que cumprissem sua missão, regressassem a Paulo ou chegassem à próxima localidade.

Segundo alguns filósofos como, por exemplo, Aristóteles, a família era considerada a unidade básica da sociedade. Maior que as famílias modernas, eram também a base das atividades econômicas e reflexo da autoridade política da polis (cidade). Daí a figura paterna ser a autoridade máxima do lar, com a total responsabilidade do grupo que se reunia em sua casa.

Este domínio patriarcal teve influência significativa nas igrejas domésticas. À medida que a igreja era assumida pela família, também a ela era incorporada essa estrutura de autoridade, na qual o pai tinha a função de governante. Mesmo quando a igreja passa a ser desvinculada da família, seus líderes continuavam mantendo a figura do “pai”. Nem sempre, porém, toda a família se tornava cristã quando o pai de família o fazia. As pessoas que se convertiam individualmente uniam-se às famílias cristãs existentes. Por outro lado, a figura doméstica de mãe de família tinha papel significativo. Ela era a gerente da família. Em Paulo se percebe essa conexão com as igrejas domésticas: Ninfas aparece como patrona de sua igreja ( Cl 4,15). Ápia é mencionada na saudação de Paulo a Filemon (Fl 1-2) e Priscila, esposa de Áquila, em conexão com a Igreja que estava na casa deles (Rm 16,3.5…).

O caráter conflituoso e de divisão de algumas das igrejas domésticas  requereram de Paulo um trabalho e esforço pessoal para fortalecer essas igrejas domésticas. Claramente, Paulo quer que essas igrejas domésticas formem um corpo com outras igrejas da cidade. Em vez de um grupo de igrejas fechadas para si mesma, Paulo deseja uma espécie de federação de várias igrejas domésticas formando a igreja local. Por isso, a igreja paulina local existia em dois níveis: assembléia doméstica de uma família individual e os associados a essa família, e segundo nível, um encontro no âmbito da cidade em uma casa particular, mas constituído de diversas famílias. Esta idéia de reuniões de igrejas aparece de diversas maneiras. A mais óbvia é a das cartas endereçadas à igreja de certa localidade.

Aos filipenses diz:

“Levai a plenitude minha alegria, pondo-vos acordes no mesmo sentimento, no mesmo amor, numa só alma, num só pensamento…” (Fl 2,2)

Regina Helena Mantovani
Coordenadora da Animação Bíblico- Catequética
da CNBB/Regional Sul II

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