Dom Jaime Vieira Rocha
Arcebispo de Natal
Nos meses de setembro e outubro a Igreja celebra o mês da Bíblia e o mês das missões, respectivamente. Aqui na Arquidiocese também celebramos, em setembro, o mês do dízimo. Embora sejam temáticas independentes elas estão em perfeita relação. De fato, é a Palavra de Deus que nos apresenta a missão da Igreja como continuação da missão de Jesus Cristo, Palavra eterna do Pai, encarnada na nossa história.
A Igreja vive da Palavra e vive para a missão, isto é, por escutar na Palavra que Deus enviou seu Filho e seu Espírito (cf. Gl 4,4-6) e que assim como o Pai enviou o seu Filho este nos envia também (cf. Jo, 20,21), ela encontra o fundamento de sua missão na revelação da missão do Filho e do Espírito. Na verdade, só existe a missão da Igreja porque existe a missão do Filho. Isto é, somente porque Jesus foi enviado pelo Pai no poder Espírito é que podemos ser também. E isto vale também para o Antigo Testamento: os patriarcas, os profetas, os sábios, todos eles viveram a missão de povo de Deus em vista da missão do Filho. Deus agiu no povo de Israel para preparar este povo para o momento de sua revelação em Jesus Cristo, enviado pelo Pai.
O discípulo missionário viverá sempre da Palavra. Como não entendemos a missão como uma simples função, não se trata de fazer algo unicamente, é imprescindível que o missionário esteja sempre na escuta de Palavra. Assim se expressou o Papa emérito Bento XVI: “a missão da Igreja não pode ser considerada como realidade facultativa ou suplementar da vida eclesial. Trata-se de deixar que o Espírito Santo nos assimile a Cristo, participando assim na sua própria missão: ‘Assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós’ (Jo 20, 21), de modo a comunicar a Palavra com a vida inteira.
É a própria Palavra que nos impele para os irmãos: é a Palavra que ilumina, purifica, converte; nós somos apenas servidores. Por isso, é necessário descobrir cada vez mais a urgência e a beleza de anunciar a Palavra para a vinda do Reino de Deus, que o próprio Cristo pregou” (BENTO XVI. Exortação Apostólica Pós-sinodal Verbum Domini, n. 93). Se assim não for, não existe missionário, pois ele é o ser humano que é enviado. A palavra do missionário deve ser a Palavra daquele que o envia. O nosso grande exemplo é o próprio Jesus: “Quando tiverdes elevado o Filho do Homem, então sabereis que ‘eu sou’, e que nada faço por mim mesmo, mas falo apenas aquilo que o Pai me ensinou” (Jo 8,28). O missionário é aquele que ouve aquilo o que o Pai ensinou ao seu Filho, isto é, a revelação de sua ternura e de seu amor.
De acordo com o Documento de Aparecida e o sentido da nova evangelização, o missionário é aquele que vive da relação com Deus. Novamente, é o mesmo Jesus que afirma: “Como o Pai, que vive, me enviou, e eu vivo por meio do Pai, aquele que de mim se alimenta viverá por meio de mim” (Jo 6,57). Viver por meio de Jesus e ser enviado por Ele é a mesma coisa. Ser missionário é ser enviado por Deus para que viva por meio de Cristo. Esta relação entre ser em Cristo e ser enviado é algo fundamental para se entender a missão. Somente na escuta da Palavra, na abertura de coração para deixá-la entrar e criar suas raízes ou deixar que ela semeie na terra fértil de nosso coração é possível ser missionário.
Nós vivemos desta ação de Deus de dirigir sua Palavra até nós. Deus envia sua Palavra e ela vem com seu Espírito. Eis o que meditamos nestes meses e o que deve permanecer em nossos corações para que vivamos a missão que nos foi confiada. Não esqueçamos também que a missão nunca é uma posse nossa, mas um dom oferecido a nós. E como ela consiste na vida em comunhão com a Palavra é necessário que vivamos, não mais para nós, mas para ele, Jesus Cristo, que por nós morreu e ressuscitou (2Cor 5,15; cf. MISSAL ROMANO. Oração Eucarística IV). “Sejam missionários!” É o convite de Cristo a todos nós.