Dom Adelar Baruffi
Bispo de Cruz Alta (RS)
No caminho de formação humano-cristã nosso povo vai descobrindo, cada vez mais, o lugar único que assume a Palavra de Deus. Ela está no centro dos encontros de catequese, dos momentos de formação, dos cursos, das celebrações nas comunidades e nos grupos de reflexão e, portanto, da vida cristã. A metodologia da Leitura Orante está se mostrando muito eficaz, pois aproxima Palavra e vida, aprofundamento teórico e oração, estabelecendo um verdadeiro diálogo entre Deus, a pessoa e a comunidade. Auxilia a superar uma formação unicamente doutrinal e moral, permitindo que a pessoa se reconheça inserida no diálogo amoroso entre Deus e a humanidade.
Exatamente este é o ponto mais importante: a Palavra revela Deus em diálogo, Deus que fala, que sai de si e se volta para nós, que deseja falar conosco. Esta Palavra se fez concreta, visível, palpável no seu Filho. Nele, Deus se mostrou, tem um rosto. Está aberto, para sempre o caminho para Deus. “Nos tempos antigos, muitas vezes e de muitos modos Deus falou aos antepassados por meio dos profetas. No período final em que estamos, falou a nós por meio do Filho” (Hb 1,1). Por isso, no episódio da Transfiguração, ouviu-se a voz do Pai: “Este é o meu Filho amado, que muito me agrada. Escutai-o” (Mt 17,5).
O grande segredo é saber “escutar”. Treinar a escuta todos os dias. “A cada manhã o Senhor desperta o meu ouvido para que eu o escute como um discípulo” (Is 50,4). A Palavra cotidiana é o bom dia de Deus em nossa vida. É a Palavra preparada para o “hoje” de nossa vida, como alimento que é oferecido, como “luz para meus passos” (Sl 119,105). Se nos abeirarmos dela com docilidade, ela será sempre nova e nos surpreende a cada vez, mesmo quando confirma o que já sabemos. Como seria bom se a primeira palavra do dia fosse sempre a Palavra de Deus. Do que fala esta Palavra? Fala de Deus, de seu amor em ação pela humanidade. Mas fala também de mim, de nós, do mundo. Somos lidos por ela, pois fala de nossos projetos e de tudo o que habita nosso interior, permitindo que os interpretemos e compreendamos. Assim, deve ser guardada no coração, como fez Maria (cf. Lc2,19.51). “Se conservares e guardares a Palavra, de modo que ela desça à profundeza da tua alma e se transfunda nos teus afetos e nos teus costumes […], não há dúvidas que serás conservado por ela” (São Bernardo).
Por ser diálogo, a Palavra cotidianamente escutada, acolhida, meditada, guardada, pede nossa resposta. Trata-se de fazer com que a Palavra seja critério de discernimento para a vida, para as escolhas, lugar donde amadurecem os valores e a consciência moral. Para isto é preciso apostar na Palavra, mesmo quando não se compreende tudo, como fez Pedro (Lc 5,5) e Maria: “faça-se em mim segundo a tua Palavra” (Lc 1,37). Esta aposta, que envolve a vida inteira, é a fé, qual livre entrega de si a Deus. Momento importante deste diálogo é a oração, quando respondemos a Deus a partir das provocações que a Palavra trouxe. “Quando lês, é Deus que te fala; quando rezas, és tu que falas a Deus” (Santo Agostinho).
Assim, mesmo com o turbilhão de atividades e preocupações que fazem parte de nossa vida, mantemo-nos sempre “em diálogo”, conectados com Deus, por meio de sua Palavra. Afinal, Deus quer dialogar conosco sempre e nós precisamos d´Ele.