Dom Lindomar Rocha Mota
Bispo de São Luís de Montes Belos (GO)
A terceira aparição de Jesus foi assim: os discípulos estavam pescando e viram um caminhante solitário margeando o mar de Tiberíades.
Um caminhante no lusco-fusco que parece ter fome, por isso incomoda os pescadores frustrados, que depois de uma noite de trabalho nada tinham logrado, se não cansaço e desventura.
No peito de Pedro, João, Natanael e outros que estavam juntos, aprofundava-se ainda a dor da perda do Mestre. É bem verdade que alguns já haviam relatado ter se encontrado com Ele. Mas não parecia credível que seu aparecimento fosse primeiro a Maria Madalena, e a outros dois discípulos, que nem faziam parte do grupo específico dos doze, tanto que já estavam fugindo para Emaús.
Os Apóstolos eram, agora, homens que pensavam ser possível retornar para a antiga vidao, pescadores de peixes. Mas até esse desejo menor é frustrado, pois o dia já raiava e ainda não haviam pescado nada. Perderam até mesmo aquela habilidade, por isso, é com humilhação e derrotismo notórios que respondem àquele que lhes pedia comida: pescamos a noite toda e não pegamos nada.
Eles não sabiam ainda que aquele que pede comida é que dar de comer. Por isso, quando chegam a praia Jesus já tem o fogo aceso e o peixe sobre ele. Mas antes desse fato existencial, vem o relato arrebatador da sua aparição, anotado por todos os lados com sutileza e afeto, próprio de um Mestre bom.
Na reconciliação dos pescadores com eles mesmos, Jesus indica que eles não perderam nenhuma habilidade, mas, sim, foram designados para outra missão. Não foi Ele mesmo que disse quando os chamou: doravante vocês serão pescadores de homens? E subtende-se pescadores de corações e de almas? Não foi Ele mesmo que disse, vocês serão meus discípulos? Não foram eles mesmos que deixaram tudo e o seguiram?
Então Jesus lhes restitui a habilidade de pescar, indicando onde deveriam jogar a rede, e, de imediato, um grito regurgitado há muito em suas gargantas se materializou. Na maior alegria que se podia experimentar, um deles gritou: é o Senhor! Desse modo Ele apareceu pela terceira vez.
O continuar silencioso daquele encontro, pois ninguém tinha coragem de lhe perguntar mais nada, o Senhor prossegue nos ensinando. Crer no indizível apenas porque testemunhou o possível ainda não é suficiente para fazer um discípulo. Assim já tinha sido questionado quando Jesus perdoou os pecados a um homem paralítico e não acreditaram nele, depois o curou de paralisia e então creram. A questão aqui é semelhante. Não se passa do dizível ao indizível. É bem mais factível o contrário. Não é o testemunho da pesca milagrosa que torna credível esta aparição.
A resposta vem logo abaixo, em João 21,15-17, nas três desconcertantes perguntas que Jesus fez: ‘Simão, filho de João, tu me amas mais do que estes?‘ Simão o ama! Ele sabe bem disso. Não foi ele que se jogou na água porque não aguentou esperar as remadas da barca que estava a pouco mais de cem metros da margem? Não foi ele que fez a grande confissão de fé que reconhecia Jesus como o Filho de Deus?
Mas Simão ainda não era Pedro. Para chegar a ser o que viria a ser tempos depois, ele precisaria amar a Jesus mais do que qualquer um! Precisaria amá-lo além de qualquer razoabilidade humana. Amá-lo a tal ponto que não acreditasse nem mesmo na morte.
Não basta amá-lo! É preciso amá-lo mais do que qualquer um, só assim se terá a coragem, de um dia, ser cingindo por outro e levado a lugares que não se deseja ir.
E como esse amor levou Pedro não somente a acreditar na Ressurreição do Mestre, mas também na sua, Jesus aceita o seu amor, e indica que ele morrerá por causa deste amor (Jo,21,19). Morrerá não de uma morte qualquer, mas morrerá de amor.