Afinal, para que serve a religião?

Dom Redovino Rizzardo
Bispo de Dourados (MS)

Não sei se por convicção ou preconceito, há pessoas que afirmam, alto e bom som, que a religião para nada serve. E provam suas palavras lembrando que não só é grande o número de presos e de corruptos que se declaram cristãos e de casais “praticantes” que partem para o divórcio, mas até mesmo de países que não evoluem… porque dominados pela religião.

Para saber o que há de verdade nisso tudo, alguns órgãos de informação, sobretudo nos Estados Unidos, promovem pesquisas de opinião pública, acreditando imprimir aos dados coletados um caráter científico.

Foi o que fez a revista “Proceedings of the National Acedemy of Sciences”. Após entrevistar 450.000 pessoas, chegou à conclusão que, para alcançar a felicidade, o primeiro passo a fazer é ter uma religião. O dinheiro só aparece em segundo lugar, e se traduz num salário mensal de, pelo menos, R$ 6.800,00.

A revista detectou outros cinco focos de felicidade. Ei-los, em ordem decrescente: não ser jovem (com o passar dos anos, aprende-se a lidar com as dificuldades); ser casado (a solidão mata); ter plano de saúde (a saúde pública é um caos); ter filhos (eles mantêm os pais unidos e jovens); ter curso superior (no ganha-pão, a competição é grande).

Se, para um considerável número de norte-americanos, a realização humana depende, em primeiro lugar, da religião, outra pesquisa, efetuada pela Gallup em 114 nações, vai numa direção contrária. Para ela, a religiosidade da população parece atravancar o seu desenvolvimento econômico.

Os motivos sugeridos, ou entrevistos, são inúmeros e diversificados. Alguns deles são positivos: a religião faz com que seus adeptos não coloquem o dinheiro acima de valores essenciais, como é a saúde, a educação, a solidariedade, a acolhida e a partilha. Quem tem fé se mantém alegre e esperançoso porque confia em Deus e sua riqueza é a vida eterna. Para ele, o fim não justifica os meios. Por isso, a ética deve sempre prevalecer, para que as transações comerciais e os acordos internacionais não se transformem em conchavos de quem pode mais chora menos. Evidentemente, tudo isso, conduz a um desenvolvimento mais qualitativo do que quantitativo.

Mas há também razões negativas, que fazem com que a religião dificulte a promoção humana, social e econômica dos povos. Uma delas é o fatalismo. Se tudo o que acontece é vontade de Deus, inclusive as injustiças, então o melhor é conformar-se: «Fazer o quê? Deus quer assim!»… Outra é a superficialidade com que se vive a fé: recorre-se a Deus somente nos momentos de conflito, em busca da solução de problemas. Assim, à medida que o progresso avança, descobrindo perspectivas jamais imaginadas, a religião vai perdendo o seu lugar e a sua função. Pior ainda é o que verifica em países onde, por motivos religiosos, se discriminam as mulheres e se promovem “guerras santas”…
Para ser fator de realização pessoal e social, a religião precisa ser bem entendida e melhor ainda assumida. O cristão não é alguém que proclama: «Salva a tua alma e o resto que vá para os quintos do inferno!» Não! Exatamente porque ama a Deus, ele se coloca a serviço do projeto que o levou a criar o mundo.

Por isso, se uma religião esconde em seu seio malandros e corruptos ou se mantém os povos no subdesenvolvimento social e econômico, ela precisa ser substituída por outra, digna de Deus e da pessoa humana. É o que lembrava o Concílio Vaticano II, em 1965: «A esperança de novos céus e nova terra, longe de atenuar, deve impulsionar a solicitude pelo aperfeiçoamento dessa terra. Por isso, ainda que o progresso terreno deva ser cuidadosamente distinguido do crescimento do Reino de Cristo, contudo é de grande interesse para o Reino de Deus, na medida em que pode contribuir para organizar a sociedade humana».

Na mesma linha se pronunciaram os bispos latino-americanos em sua Assembleia de Aparecida, em 2007: «O fato de ser discípulos e missionários de Jesus Cristo nos leva a assumir evangelicamente, e a partir da perspectiva do Reino, as tarefas prioritárias que contribuem para a dignificação do ser humano e a trabalhar junto com os demais cidadãos e instituições para o bem da humanidade».

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