Os bispos do Tocantins divulgaram, dia 10 de fevereiro, uma nota sobre os conflitos fundiários nas regiões Norte do Estado. Na nota, os bispos pedem para que órgãos como o Ministério Público Estadual, o INCRA e o Tribunal de Justiça, “acompanhem a revisão do mandado de reintegração de posse, em favor da Associação Planalto, e que estas famílias tenham as suas terras regularizadas e tituladas”.
A nota também faz menção ao baixíssimo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da região. De acordo com o IBGE, 84% da população de Campos Lindos vivem na pobreza, sendo que 62,4% dos moradores estão na extrema indigência. Em contra partida, o município ocupa o terceiro lugar da lista nacional com maior produção de soja.
“As riquezas que circulam no município, decorrentes desta produção, não contribuem para o desenvolvimento da região e nem beneficiam a população local”, expressam.
Leia a mensagem na íntegra:
Nota dos Bispos do Tocantins sobre o conflito de terra em Campos Lindos
“Se eu saio para os campos, eis as vítimas da espada; se eu entro nas cidades, eis as vítimas da fome” (Jer 14,18).
Nós, bispos das cinco dioceses do Regional Norte III, da CNBB, no Estado do Tocantins, ao tomarmos conhecimento do acirrado conflito de terra e dos problemas ambientais, com ameaças de despejo de mais de 80 famílias, no município de Campos Lindos, vimos, em nome de Jesus Cristo, pedir as partes em conflitos, diálogo, amor, justiça e reconciliação. Para tudo isto, nos colocamos à inteira disposição das duas partes para mediar este conflito.
O município de Campos Lindos é um grande celeiro, a céu aberto, de soja, no Estado do Tocantins. No entanto, apesar disso, possui o segundo pior IDH do Estado. Significa dizer que as riquezas que circulam no município, decorrentes desta produção, não contribuem para o desenvolvimento da região e nem beneficiam a população local.
Além do mais, foi em uma fazenda desta mesma região que se deu o primeiro caso de trabalho escravo no Estado do Tocantins, com o resgate de 29 trabalhadores. A Campanha da Fraternidade deste ano de 2014, que tem como Tema “Fraternidade e Tráfico Humano”, diz, em grandes linhas, que são situações como esta que rompem com o projeto de vida na liberdade e na paz e violam a dignidade e os direitos do ser humano, criado à imagem e semelhança de Deus. “É para a liberdade que Cristo nos libertou” (Gal 5,1).
Nossa solicitude pastoral se dirige, primeiramente, às famílias atingidas pelo Projeto Agrícola Campos Lindos, que já ocupavam estas áreas há décadas, e que hoje correm sério risco de perder e ser despejadas das terras, desde que, em 1997, foram confinadas em sua área de reserva. Nossa orientação é que façam valer os seus direitos, através de um diálogo progressivo e construtivo, mediado pelas autoridades constituídas para estes fins.
Dirigimo-nos, de igual modo, aos produtores de soja, membros da Associação Planalto, a fim de que retirem todas as ameaças às referidas famílias que vivem nestas áreas de conflito e não contaminem mais o meio ambiente pelo uso intensivo de agrotóxicos nas lavouras de soja.
Por fim, conclamamos o Ministério Público Estadual, o INCRA e o Tribunal de Justiça, e outros, para que, dentro da legalidade, acompanhem, de perto, a revisão do mandado de reintegração de posse, em favor da Associação Planalto, e que estas famílias tenham as suas terras regularizadas e tituladas.
Queremos, com este nosso apelo, fazer jus ao nome de Campos Lindos desta querida cidade. É Jesus que nos pede para que sejamos sal da terra e luz do mundo (Mt 5,13-14). A respeito disto, sugestivas são as palavras do papa Francisco: “com uma vida santa, daremos sabor aos diversos ambientes e os defenderemos da corrupção, como faz o sal; e levaremos a luz de Cristo com o testemunho de uma caridade autêntica. Mas se nós, cristãos, perdemos o sabor, apagamos a nossa presença de sal e luz, perdemos a eficácia. É também muito bonito conservar a luz que recebemos de Jesus. Guardá-la. Conservá-la. O cristão deveria ser uma pessoa luminosa, que traz a luz, que sempre dá luz. Uma luz que não é sua, mas é um presente de Deus, o presente de Jesus. E nós levamos em frente esta luz. Se o cristão apaga esta luz, a sua vida não tem sentido: é um cristão somente de nome, que não leva a luz, uma vida sem sentido” (cf. Angelus, 09/02/2014).
Certos de sermos atendidos, em nossa solicitação, nos colocamos à inteira disposição dos senhores para mediar este conflito.
Na caridade de Cristo, Bom Pastor, com nossa bênção.
Em nome dos 5 bispos do regional da CNBB – Norte 3; Dom Pedro Brito Guimarães – Arcebispo de Palmas; Dom Romualdo Matias Kujawski – Bispo de Porto Nacional; Dom Giovane Pereira de Melo – Bispo de Tocantinópolis; Dom Rodolfo Luiz Weber – Bispo da Prelazia de Cristalândia;
Dom Philip Dickmans,
Bispo de Miracema do Tocantins e Presidente do Regional norte 3 da CNBB.
Miracema do Tocantins, 10 de fevereiro de 2014.