Cardeal Hummes sobre o sonho social: o grito dos pobres se junta ao grito da terra

Em sua exortação apostólica pós-sinodal Querida Amazônia, o Papa Francisco apresenta quatro sonhos que a Amazônia inspira nele: social, cultural, ecológico e eclesial. O primeiro consiste numa Amazônia “que lute pelos direitos dos mais pobres, dos povos nativos, dos últimos, de modo que a sua voz seja ouvida e sua dignidade promovida”. O arcebispo emérito de São Paulo (SP) e presidente da Comissão Episcopal para a Amazônia da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), cardeal Cláudio Hummes, ao comentar o texto que é fruto do Sínodo para a Amazônia, ressaltou que “o grito dos pobres se junta ao grito da terra”.

Cardeal Cláudio Hummes e dom Walmor Oliveira | Foto: Daniel Flores

Dom Cláudio destaca que o Papa Francisco escolhe falar já de início dos mais pobres, aqueles que são “machucados, injustiçados, abandonados, são marginalizados, sem perspectiva de futuro”. Ele começa com os pobres, continua dom Cláudio, “e diz que os indígenas nunca estiveram tão ameaçados, como em nossa época. Eles são, sobretudo aqueles que mais nos interpelam nessa questão”.

Na exortação apostólica, o Papa Francisco manifesta o desejo que na Amazônia se realize a integração e a promoção de todos os seus habitantes, “para poderem consolidar o «bem viver»”, o que impõe “um grito profético e um árduo empenho em prol dos mais pobres”. Francisco ainda reforça que “uma verdadeira abordagem ecológica sempre se torna uma abordagem social, que deve integrar a justiça nos debates sobre o meio ambiente, para ouvir tanto o clamor da terra como o clamor dos pobres”. E ainda: “Não serve um conservacionismo «que se preocupa com o bioma, porém ignora os povos amazônicos»”, segundo o Papa.

Francisco continua sua reflexão no capítulo dedicado ao sonho social contextualizando que os interesses colonizadores aumentaram a exploração madeireira e mineral e foram expulsando e encurralando os povos indígenas, ribeirinhos e afrodescendentes. “Isto favoreceu os movimentos migratórios mais recentes dos indígenas para as periferias das cidades. Aqui não encontram uma real libertação dos seus dramas, mas as piores formas de escravidão, sujeição e miséria”.

Ao mesmo tempo que o Papa estrutura o texto “como um cântico”, segundo do Cláudio, num “louvor que ele levanta a Deus e que ele está e estupefato diante da beleza daquilo que Deus oferece à humanidade, a beleza da Amazônia”, Francisco convida a sonhar e a indignar-se.

Diante do “rasto de delapidação, inclusive de morte, coloca em perigo a vida de milhões de pessoas”, o Papa fala “com coragem sobre toda essa depredação e o que ela significa para os povos que estão aqui”, segundo dom Cláudio. “É o momento que ele diz que é preciso se indignar”.

“Ao mesmo tempo que nos deixamos tomar por uma sã indignação, lembremo-nos de que sempre é possível superar as diferentes mentalidades de colonização para construir redes de solidariedade e desenvolvimento”, escreve Francisco.

“Então, diz o Papa, ‘é preciso se indignar e começar a denunciar’, dizer o que está de fato por detrás de tudo isso daí, onde estão as responsabilidades que estão por detrás de toda essa depredação. Então ele fala muito fortemente – a gente até fica muito envolvido quando lê – e ele diz as coisas com muita clareza e propões também algumas alternativas”, comentou dom Cláudio.

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