CNBB: colegialidade e comunhão eclesial

Mais uma vez, os bispos católicos do Brasil estão reunidos no Mosteiro de Itaici, em Indaiatuba, na realização da 47ª Assembléia Geral da CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Iniciada no dia 22 de abril, estende-se até o dia 1º de maio. São dias de muita oração, trabalhos, intercâmbio de opiniões, consulta recíproca e colaboração em favor do bem comum da Igreja.

A assembléia geral é o órgão supremo da conferência. Segundo o estatuto da CNBB, é a “a expressão e a realização maiores do afeto colegial, da comunhão e co-responsabilidade dos pastores da Igreja no Brasil”. É um evento de grande importância que manifesta o espírito de colegialidade e revigora a comunhão eclesial, contribuindo de forma decisiva para a união entre os bispos e para a unidade da Igreja no Brasil.

Esse espírito de colegialidade sempre foi a marca da CNBB que nasceu em 14 de outubro de 1952. Nasceu do sonho e do empenho em dar ao episcopado maior unidade de pensamento e ação.

A CNBB nasceu no âmbito do espírito renovador da Ação Católica especializada. Era um movimento de evangelização que marcava, na sociedade brasileira, uma presença de Igreja com características de atuação de “fermento na massa” e, ao mesmo tempo, despida de qualquer triunfalismo. Na fonte inspiradora de ambas – CNBB e AC – encontra-se a figura carismática de Dom Hélder Câmara, que, por ambas, consumiu grande parte de sua vida. Pode-se dizer que sua impressionante capacidade de diálogo conseguia reunir e unir os mais irreconciliáveis. Só não conseguia convencer o demônio. Seu testemunho de pobreza evangélica dava-lhe autoridade e coragem de pregar, com veemência, pelo mundo afora, as reformas sociais mais radicais com os meios da não violência. Sua determinada vontade de concretizar sonhos e planos levava-o aonde fosse necessário. Tudo isso constituía a personalidade do “padre Hélder”, homem de estatura pequena e franzina, mística e alma de poeta.

Nos 56 anos de existência, nossa Conferência Episcopal dedicou-se, de corpo e alma, ao fortalecimento da comunhão fraterna entre os bispos e esmerou-se no exercício da colegialidade. Empenhou-se, sem medir esforços, na prática da corresponsabilidade da missão de testemunhar o Evangelho neste país continental e desafiador, rico e pobre, com diferenças regionais acentuadas no campo social.

Quase ao final do Concílio Vaticano II (1962-1965), impulsionada pelo sopro renovador que dele emergiu, realizou-se em Roma uma Assembléia Geral da CNBB que definiu o propósito de conduzir a Igreja no Brasil pelos caminhos que acabavam de ser abertos com a presença e ação do Espírito Santo. A expressão consagrada para expressar esse novo rumo: “aggiornamento”. Era a Igreja propondo-se assumir “as alegrias e esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos que sofrem”… e fazendo-se “solidária com o gênero humano e sua história”   (Gaudium et Spes, nº 1).

Fiel a esse propósito, durante a chamada Revolução de 1964 na qual, por mais de 20 anos o povo brasileiro fez o velório da democracia, a CNBB entendeu não calar-se ao ouvir os clamores que subiam dos porões da repressão. Com atitude profética mas serena, procurou ser a voz dos que se viram amordaçados em sua voz. Face ao agravamento das questões sociais, posicionou-se ao lado dos excluídos e nunca se fechou ao diálogo com os dominadores, cobrando deles respeito aos direitos humanos. Dentro de seus próprios métodos de atuação, sempre em busca da reconciliação entre irmãos, envolveu-se decididamente no processo de retorno à democracia. Fiel à sua opção preferencial pelos pobres, não poupou esforços para estar à altura do sofrimento e da luta do povo. Os bispos colocados à frente da nossa Conferência nesses anos difíceis, pela prudência e coragem por eles testemunhadas, hão de merecer imorredoura admiração.

Nestes 56 anos, um dos permanentes desafios enfrentados foi, e espero continue a ser, situar o lugar a ser dado aos pobres em nossa sociedade, na fidelidade ao Evangelho a anunciar-nos que “os últimos serão os primeiros”. Do ponto de vista interno, a CNBB consolidou a experiência de uma estrutura colegial, a meu ver modelar, e uma nova forma de exercício do poder que seja mais serviço do que vontade de dominar. Procurou inspirar-se na visão de Povo de Deus proposta pela eclesiologia do Concílio Vaticano II; esforçou-se por harmonizar a autonomia das dioceses com a pastoral de conjunto.

Faço votos para que a CNBB não perca de vista a tradição que construiu. Isso significa um compromisso de transmitir aos que vierem depois o que recebeu dos que vieram antes: o testemunho de colegialidade e de profetismo, abertura ao diálogo com a contemporaneidade e firmeza na evangélica opção pelos pobres.

Dom Eduardo Koaik

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