Com Maria, Mãe Deus, sejamos construtores da Paz!

Dom Eurico dos Santos Veloso
Arcebispo Emérito de Juiz de Fora (MG)

Neste dia primeiro de janeiro de 2022, a liturgia coloca-nos diante de evocações diversas, ainda que todas importantes. Celebra-se, em primeiro lugar, a Solenidade da Mãe de Deus: somos convidados a olhar a figura de Maria, aquela que, com o seu sim ao projeto de Deus, nos ofereceu a figura de Jesus, o nosso libertador. Celebra-se, em segundo lugar, o Dia Mundial da Paz: em 1968, o Papa São Paulo VI quis que, neste dia, os cristãos rezassem pela paz. Celebra-se, finalmente, o primeiro dia do ano civil: é o início de uma caminhada percorrida de mãos dadas com esse Deus que nunca nos deixa, mas que em cada dia nos cumula da sua bênção e nos oferece a vida em plenitude. As leituras de hoje exploram, portanto, diversas coordenadas. Elas têm a ver com esta multiplicidade de evocações.

Ao longo da história da Igreja a Solenidade de hoje enfatiza diversos aspectos do mistério da Encarnação. O Evangelho nos diz que foi neste dia, o oitavo depois do seu nascimento, que Jesus foi circuncidado, tornando-se um filho da primeira aliança já em vista da nova e eterna aliança que ele iria inaugurar com seu sangue na Cruz.

Na primeira leitura(Nm 6,22-27), sublinha-se a dimensão da presença contínua de Deus na nossa caminhada, como bênção que nos proporciona a vida em plenitude. A leitura traz a fórmula da bênção proferida pelo sacerdote no encerramento das celebrações litúrgicas no templo. A Igreja a propõe na primeira celebração do ano para lembrar que Deus deseja abençoar e acompanhar seu povo ao longo de todo o ano que se inicia. A bênção de Deus é desejo de vida digna para todos e de ausência de violência e conflitos.

Na segunda leitura(Gl 4,4-7), a liturgia evoca outra vez o amor de Deus, que enviou o seu “Filho” ao nosso encontro, a fim de nos libertar da escravidão da Lei e nos tornar seus “filhos”. É nessa situação privilegiada de “filhos” livres e amados que podemos dirigir-nos a Deus e chamar-Lhe “papá”. O tempo da espera, da longa expectativa, completou-se, e Deus realiza as promessas enviando o próprio Filho. Este nasceu sujeito à Lei para libertar os submissos à Lei, retirando-os da escravidão e tornando-os filhos e filhas livres, capazes para acolher o dom do Espírito.

O Evangelho(Lc 2,16-21) mostra como a chegada do projeto libertador de Deus (que veio ao nosso encontro em Jesus) provoca alegria e contentamento por parte daqueles que não têm outra possibilidade de acesso à salvação: os pobres e os débeis. Convida-nos, também, a louvar a Deus pelo seu cuidado e amor e a testemunhar a libertação de Deus aos homens. Os mensageiros de Deus trouxeram a maior e mais bela novidade aos pastores: “hoje nasceu para vós o Salvador, que é o Cristo Senhor”(Lc 2,11). O anúncio, o sinal oferecido e, acima de tudo, o nascimento de Jesus Salvador são para os pastores o início de uma nova era. Vistos como ladrões e “gente suja”, os pastores, desprezados por todos, viviam à margem da sociedade. Entretanto, diante de Deus as coisas se invertem. O anúncio não é feito aos “grandes”, mas aos últimos, pois “os últimos se tornam os primeiros”(Lc 13,30). E são estes últimos que “substituem” os anjos. Na primeira cena do Evangelho de hoje, os pastores são os anunciadores: foram a Belém e, “tendo-o visto, contaram a todos o que ouviram a respeito do menino”(Lc 2,17-18). Aquilo que os anjos lhe anunciaram com exclusividade, eles divulgam para todos. A segunda cena do Evangelho de hoje(Lc 2,19-20), que dá sentido à celebração da “Maternidade Divina de Maria”, é a central da narrativa, mas destoa gravemente da anterior. “Maria guardava todos estes fatos e meditava sobre eles em seu coração”. À proclamação entusiasta dos pastores contrasta o silêncio meditativo de Maria, meditação e silêncio orante. A terceira cena(Lc 2,20), retoma a primeira, evidenciando o contraste com a segunda. Agora são os pastores, e não mais os anjos, que glorificam a Deus por tudo o que tinham ouvido e visto. Eles voltam para o cotidiano, mas transformados e maravilhados.

 Maria, a mulher que proporcionou o nosso encontro com Jesus, é o modelo do crente que é sensível ao projeto de Deus, que sabe ler os seus sinais na história, que aceita acolher a proposta de Deus no coração e que colabora com Deus na concretização do projeto divino de salvação para o mundo.

 O Papa Francisco, em sua mensagem para o 55º. Dia Mundial da Paz, diz que: Diálogo entre as gerações, educação e trabalho são as três estradas que levam a um único caminho: a uma paz duradoura. Esta é a proposta do Pontífice para 2022, na Mensagem para o Dia Mundial da Paz a ser celebrado no primeiro dia do novo ano. há mais armas hoje que na guerra fria. Construir a paz com educação e trabalho. Diz o Papa Francisco que:  “Oxalá sejam cada vez mais numerosas as pessoas que, sem fazer rumor, com humildade e tenacidade, se tornam dia a dia artesãs de paz. E que sempre as preceda e acompanhe a bênção do Deus da paz!”

Mais do que nunca, é preciso valorizar e levar a sério este Dia Mundial da Paz. Cada vez mais, a paz parece um sonho distante. A violência que vemos disseminada na sociedade é também fruto daquela praticada nas famílias, contra crianças, mulheres e idosos. Somos todos convocados para sermos, em todo tempo e lugar, mensageiros da paz.

Com Maria, Mãe Deus, sejamos construtores da Paz! Coloquemos sob o Altar de Deus, sob o manto de Maria, Mãe de Deus, aquela que a Igreja proclama como verdadeira Mãe do Verbo Encarnado.

 

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