Dom Adelar Baruffi
Bispo de Cruz Alta
Quando a sociedade quer, continuamente, nos fazer entender que não precisamos de Deus para viver, que o único olhar possível para o ser humano é o horizontal, que é inútil a preocupação com o pós-morte, cabe-nos afirmar que “creio na vida eterna”. O sacerdote, no diálogo que inicia a oração eucarística diz “corações ao alto”, a assembleia reunida responde “o nosso coração está em Deus”. A celebração eucarística nos recorda e educa, por meio de seus ritos, a manter sempre “o coração em Deus”. O ser humano não caminha sozinho. Temos uma ligação fundamental, que dá sentido e identidade a nossa vida: somos criaturas, nossa vida é um dom de Deus, dele viemos e retornamos para estarmos definitivamente com Ele. Esta é a parábola da nossa existência, da qual o túmulo que visitamos no dia de Finados é um sinal.
A comemoração do Dia de Finados, reúne elementos humanos, culturais e espirituais. Humanamente é o dia da saudade, de recordações positivas ou não. A visita ao local do sepultamento é um elemento muito importante para esta recordação. Cada cultura tem seu costume próprio de reverenciar os antepassados. Porém, a lembrança de que um dia nossos queridos existiram e fizeram parte de nosso cotidiano e agora já não estão presentes, nos coloca, necessariamente, a questão fundamental do sentido da vida. Mesmo quando os que partiram tiveram a alegria de viver longos anos, permanece sempre a certeza do pouco vivido, da incompletude, do não definitivo, do tempo que foge, da não apreensão da totalidade de sentido do existir. O caminho de nossa vida é finito. Entramos na estrada que outros já estiveram. Herdamos o bem que nos deixaram. Deixamos nossa marca, nossas obras, e, também, um dia partiremos. O que seria do ser humano se não tivesse Deus em quem se ancorar! Finados é dia que nos possibilita olhar para aqueles que já se foram, com o coração agradecido, e elevar nossos “corações ao alto” para aonde caminhamos pressurosos, “como estrangeiros e peregrinos” (Hb 11,13), no desejo “de uma pátria melhor, isto é a pátria celeste” (Hb 11,16).
A memória dos falecidos nos remete à fé em Deus e sua promessa revelada em Jesus Cristo. Ele fala do Pai que a todos quer consigo: “Na casa de meu Pai há muitas moradas” (Jo 14,1). O próprio Jesus nos quer consigo após nossa partida: “Depois de ir e vos preparar um lugar, voltarei e vos tomarei comigo, para que, onde eu estou, também vós estejais” (Jo 14,3). Quem vive na certeza da companhia de Deus não terá dificuldades de compreender que o amor vivido neste mundo, na caridade realizada aos irmãos e irmãs, se completa em Cristo Ressuscitado. Portanto, a única vida que recebemos de Deus, como um dom, se completa após a nossa morte, pois “agora nós vemos como num espelho, confusamente; mas, então, veremos face a face” (1Cor 13,12). A comunhão que formamos com Cristo, pelo nosso batismo, constitui todos os cristãos numa única grande família. A eles estamos unidos, pela fé. Os santos, neste sentido, são nossos irmãos e intercessores.
Enfim, o dia de Finados nos recorda que somente o amor edifica a vida e permanece para sempre. Amor, caridade, solidariedade, acolhida, promoção da vida são o modo de vivermos nossa fé, como seguidores de Jesus Cristo. A caridade será o critério de nosso julgamento, como nos disse São João da Cruz: “No ocaso da nossa vida, seremos julgados quanto ao amor”.