O ano litúrgico, celebrado em nossas comunidades eclesiais, chega à sua conclusão com uma festa solene em honra do Senhor: a festa de Jesus Cristo Rei do Universo. Como
cristãos nos sentimos cidadãos do seu Reino, e sabemos que o Senhor não decepciona. Mas não sempre nos comportamos de modo digno de cidadãos do seu Reino. O reino de Jesus Cristo é o reino das obras de misericórdia. Em cada ano litúrgico revivemos a história da salvação, compreendida a volta do Senhor Jesus para o julgamento final.
O fim de ano é tempo de balanço. Também o fim de ano da Igreja. O balanço que nos propõe o evangelho deste domingo, Mateus 25, 31-46, é exatamente o julgamento final, o último, do fim dos tempos. Uma grande parábola contou Jesus. Mais que uma parábola, um cenário sobre o futuro do mundo. A morte de cada um será bem o ensaio do grande julgamento.
Se aprofundarmos o relato, descobriremos que o aspecto exterior, a coreografia das multidões, não é tudo. Emergem ao mesmo tempo os aspectos da interioridade.
Os estudos da Bíblia nos fazem observar que no relato de Jesus muitas coisas não são originais: as visões apocalípticas do fim do mundo, foram já descritas por vários profetas do Antigo Testamento: a vinda final do Filho do homem, a reunião dos povos, a separação dos bons dos maus, o prêmio e o castigo. Os israelitas que naquele dia ouviam Jesus, já estavam cientes. Mas Jesus acrescenta no seu relato elementos não previstos, que constituem a verdadeira novidade cristã.
O primeiro elemento é a atenção aos pequenos. Jesus os chama “os menores de meus irmãos”. São eles, os pequenos, a medida com a qual são julgados todos os homens. Para Jesus resulta determinante no juízo final a abertura, a disponibilidade, o acolhimento que na vida tivermos reservado aos pequenos. O amor operoso e gratuito que tivermos tido para com eles.
Basta isso para que o grandioso cenário do relato perca importância, e passe em primeiro plano o que poderia parecer secundário, insignificante: exatamente os pequenos. Os pequenos são importantes para Deus!
O segundo elemento, na verdade não previsto, que suscita a perplexidade dos povos reunidos: o que for feito aos mais pequenos, Jesus o considera feito pessoalmente a ele mesmo.
Então dirão: “Mas Senhor, quando te vimos com fome, com sede…?”. “Todas as vezes que fizestes isso a um dos menores de meus irmãos, foi a mim que o fizestes!”. Assim Jesus identifica os seus irmãos mais pequenos consigo mesmo.
Jesus não considera o nosso comportamento diante dos grandes, nobres, poderosos, simpáticos, afortunados, ricos, mas o que nós fazemos para os últimos, os sem herança, os marginalizados, os sem teto. Jesus se declara solidário com o seu destino.
Ainda uma vez, Jesus nos parece paradoxal. É ensinamento novo que vai além das expectativas e aspirações puramente humanas. Depois de dois mil anos, nos colhe ainda de surpresa.
O que Jesus ensinou, ele o viveu. Foi-nos apresentado, no presépio e na condenação à morte, como rei e messias, mas ao mesmo tempo como pobre, manso e humilde de coração, comportou-se como misericordioso e solidário com as situações de miséria humana, ao longo de toda a sua vida terrena.
O seu reino não se confunde com os poderosos deste mundo. Um rei que não se serve de nós, que não nos manda à guerra para morrer por ele, mas morre Ele por nós. Ao longo de todo o evangelho, nós encontramos Jesus empenhado para afrontar as situações de necessidade que mostrou na parábola: fome e sede, ser forasteiro, a nudez do pobre, a doença e o cárcere.
A história nos conta que desde então os cristãos procuram imitá-lo. Tantos tomaram a sério o empenho da solidariedade, o que não é comum aos poderosos de hoje que fazem o contrário: decretam o aborto, são desatentos ao bem comum, ao cuidado dos migrantes. Tantos cristãos levaram a serio o empenho de viver as obras de misericórdia que o Senhor elencou na parábola.
As obras de misericórdia compreendem em si a verdadeira moral cristã. Conhecemos uma outra moral, quase somente negativa: “não fazer isso, proibido aquilo…”. A verdadeira moral ensinada por Jesus é toda positiva, de coisas concretas, de ações por fazer: as obras de Cristo.
