De fato Este homem era justo!

Com o Domingo de Ramos a Igreja Católica inicia a Semana Santa. É o momento mais importante para celebrarmos a nossa fé. Com efeito, ser cristão é seguir mais de perto aquele Jesus Cristo que sofreu a paixão, a morte na cruz e, depois de três dias, apareceu ressuscitado e vivo aos seus amigos. Todos nós nos perguntamos como falar hoje desses acontecimentos numa sociedade onde o religioso, o exotérico e o mágico e se confundem; onde fatos e ficção se aproximam ao ponto de serem trocados pela tecnologia da computação.  Sabemos, por exemplo, e sempre depois, que imagens são retocadas, pesquisas são manipuladas e boatos se transformam em manchetes. Como distinguir as verdades, que resplandecem por luz própria, das mentiras e das aparências iluminadas pela propaganda interesseira?

Sobre a Boa Notícia da Ressurreição de Jesus irei falar, no próximo domingo, na alegria e na esperança renovada da Páscoa. Desta vez quero convidar a reler e a refletir com atenção sobre a paixão de Jesus relatada no evangelho de Lucas, o evangelista que está nos acompanhando ao longo deste ano litúrgico.

É a paixão e morte que fazem de Jesus o irmão universal, totalmente solidário com o sofrimento e a morte de qualquer ser humano que passe por este mundo. Contudo, se o sofrimento e a morte de Jesus garantem a sua humanidade, o seu jeito de sofrer e de morrer e as causas que levaram a sua vida a este trágico desfecho devem chamar a nossa atenção.

Jesus morreu de morte violenta por ter falado e agido de certa maneira. Não foram por acaso nem a sua vida e nem a sua morte muito bem planejada e motivada pelos seus perseguidores. Tudo isso nos deve deixar pensativos. Outros homens famosos, considerados fundadores de religiões, acabaram as suas vidas fartos de anos e de bens, rodeados pelo carinho dos discípulos. Maomé morreu satisfeito, pago pelas suas vitórias militares. Algo de semelhante pode-se dizer de Buda e Confúcio. Se tivesse feito uma autocrítica, talvez Jesus teria escapado daquela morte. Mas não a fez. Morreu porque quis, por causa da verdade que o Pai lhe tinha confiado. Morreu por não querer renegar nada do que tinha pregado e ensinado com as suas palavras e os seus gestos. Sem nunca ter pegado numa arma, ou ter machucado alguém, foi violentamente assassinado, condenado entre os malfeitores. Aquele que pregava o amor, a paz e o perdão, não foi acolhido em paz e nem perdoado, ao contrário, foi odiado e rejeitado. Os evangelhos da Paixão não escondem as torturas, os escarros e as zombarias. Fazem questão de relatar a vergonha da nudez e a crueldade da agonia. A morte de Jesus virou espetáculo macabro, exemplo para amedrontar, lição para lembrar a todos quem eram os verdadeiros poderosos que podiam mandar e desmandar.

O evangelista Lucas nos diz que, naqueles dias, Herodes e Pilatos se tornaram amigos. Os poderes religiosos e político se juntaram contra Jesus. O povo gritou para que Jesus fosse crucificado e para que Barrabás, assassino e rebelde, fosse posto em liberdade. Jesus é crucificado entre dois ladrões. A justiça humana deve proteger os que se acham bons dos rebeldes e facínoras. O mal, pensa-se, deve ser arrancado sem piedade. Não se pode abrir brechas e nem exceções. Nada de mais certo para os que têm medo de perder o seu poder e os seus privilégios. Jesus paga um preço muito caro por ter pregado o perdão e a misericórdia de Deus. Aquele Deus que ele teve a ousadia de chamar de Pai.

Assim continua a chamá-lo na cruz. “Pai perdoa-lhes porque não sabem o que fazem. E, na hora da morte, grita: “Pai em tuas mãos entrego o meu espírito”. Ao ladrão arrependido declara: “Em verdade eu te digo, ainda hoje estarás comigo no paraíso”.Que homem é este que nos questiona e nos surpreende, ainda hoje, com sua vida e com sua morte? Respondemos com as palavras do oficial romano: “De fato! Este homem era justo!”

Dom Pedro José Conti

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