Dom Eurico dos Santos Veloso
Arcebispo Emérito de Juiz de Fora (MG)
A liturgia do 16º Domingo do Tempo Comum convida-nos a descobrir o Deus paciente e cheio de misericórdia, a quem não interessa a marginalização do pecador, mas a sua integração na comunidade do “Reino”; e convida-nos, sobretudo, a interiorizar essa “lógica” de Deus, deixando que ela marque o olhar que lançamos sobre o mundo e sobre os homens.
Hoje – por sábia e agradecida decisão do Sumo Pontífice Francisco, damos graças a Deus pela vida dos nossos avós e por todas as pessoas idosas e apresentamos ao Senhor, em especial, os idosos abandonados, enfermos e que passam por necessidades!
A primeira leitura (Sb 12,13.16-19) fala-nos de um Deus que, apesar da sua força e onipotência, é indulgente e misericordioso para com os homens – mesmo quando eles praticam o mal. Agindo dessa forma, Deus convida os seus filhos a serem “humanos”, isto é, a terem um coração tão misericordioso e tão indulgente como o coração de Deus. Os pensamentos de Deus nem sempre coincidem com os nossos. O seu poder, contrariando nosso pensamento, mostra-se na bondade e na capacidade de perdoar, pois ele não se alegra com a destruição da pessoa. Deus se mostra humano e misericordioso com todos os povos e nos conforta com a esperança de que sempre há lugar para o arrependimento e o perdão.
O Evangelho (Mt 13,24-43) garante a presença irreversível no mundo do “Reino de Deus”. Esse “Reino” não é um clube exclusivo de “bons” e de “santos”: nele todos os homens – bons e maus – encontram a possibilidade de crescer, de amadurecer as suas escolhas, de serem tocados pela graça, até ao momento final da opção definitiva. Contemplamos a paciência de Deus em esperar o final dos tempos, para separar o joio do trigo, o mal do bem, os resistentes ao bem dos dóceis ao amor. As parábolas do joio e do trigo, do grão de mostarda e do fermento, junto com a explicação da primeira, têm a mesma intenção. Jesus prega o Reino dos Céus de forma contrária a vários grupos de seu tempo, como os fariseus e os essênios e também age de modo oposto a eles. Os fariseus queriam eliminar, à força, pela prática minuciosa da Lei, o pecado do mundo, apressando a chegada do Reino. Os essênios, uma espécie de seita monacal de mentalidade apocalíptica, esperavam a chegada do Reino com força destruidora, à base de fogo. Segundo eles, somente os membros de seu grupo seriam salvos, pois consideravam a si mesmos os únicos que se santificavam por práticas penitenciais radicais e absolutas. Jesus anuncia a tolerância e a paciência do Pai. Somente no dia da colheita (Cf. Mt 25, 31-46), o joio será separado do trigo. A partir de sua vinda, Jesus, com sua Pessoa e Palavra, introduziu e continua introduzindo os novos tempos do Reino, pouco a pouco, no cotidiano da vida humana, sem alartdes.
A segunda leitura (Rm 8,26-27) sublinha, doutra forma, a bondade e a misericórdia de Deus. Afirma que o Espírito Santo – dom de Deus – vem em auxílio da nossa fragilidade, guiando-nos no caminho para a vida plena. O Espírito que recebemos no batismo ilumina nossa vida cotidiana, auxiliando-nos em nossas fraquezas. É importante estarmos sempre atentos aos seus apelos e nos deixarmos envolver por ele. No caminho da libertação, sempre podemos contar com o Espírito de Deus. Muitas vezes, porém, nossa arrogância e intolerância acabam não abrindo espaço para o Espírito agir em nós!
Muitos inimigos do povo continuam a semear o joio no meio da semente boa do Evangelho. Jesus os identifica como “falsos profetas”. Nem sempre é fácil distinguir entre o que é bom e o que é mau. Há pessoas que se dizem do “bem”, mas são grandes inimigas do povo. O mestre nos dá uma indicação precisa para fazer a distinção: pelos frutos se distingue o bom profeta do falso. Todos nos carregamos em nós o joio e o trigo ao mesmo tempo. Ninguém pode pretender ter a exclusividade do bem, apontando nos outros a origem do mal e assim propagando a sociedade da intolerância e do ódio. Não nos cabe fazer a triagem, adiantando-nos para eliminar o que consideramos joio. Nas comunidades também podem existir pessoas que se dizem “do bem” e julgam ser donas da verdade.
O joio – o mal – se propaga à medida que os autênticos seguidores de Jesus vivem apáticos e indiferentes àquilo que acontece na sociedade. Em todos nós há algo que precisa ser queimado (joio) e algo a ser cultivado (trigo). Deus aguarda nossa decisão de transformar o coração de pedra em coração humano, sensível às necessidades do próximo.
O Senhor Jesus convida-nos a ter o seu olhar, que se fixa no trigo bom, que sabe conservá-lo até no meio das ervas daninhas. Não coopera com Deus quem procura os limites e os defeitos dos outros, mas, ao contrário, quem sabe reconhecer o bem que cresce silenciosamente no campo da Igreja e da história, cultivando-o até o amadurecimento. Paciente e misericordioso conosco, ele vem em nosso auxílio com seu Espírito, para que o joio existente em nosso interior e à nossa volta não nos desanime do anúncio de seu Reino! Tenhamos paciência sempre, particularmente, neste dia com nossos amados avós e idosos! Deus os abençõe pela sua riqueza de testemunho da fé!