Dia Mundial da Água: agradecer, conscientizar, defender

Dom José Ionilton Lisboa de Oliveira, SDV
Bispo da Prelazia de Itacoatiara – Amazonas

 

O Dia Mundial da Água foi criado pela ONU – Organização das Nações Unidas em 1993, para ser celebrado sempre no dia 22 de março de cada ano.

O objetivo de ser celebrado este dia, em seu início, foi promover atividades para a aumentar a consciência pública sobre a importância da conservação e preservação das fontes de água potável, bem como de ajudar os governos a tomarem consciência da necessidade de tomarem iniciativas para zelar e proteger este bem precioso para a humanidade.

Agradecer

Nossa primeira atitude como cristãos e cristãs, diante deste valioso e indispensável bem para a natureza e a vida humana, é de agradecer. Com o Autor do Livro de Daniel queremos rezar: “Águas todas que há acima do céu, bendizei ao Senhor; Mares e rios, bendizei ao Senhor; Nascentes de água, bendizei ao Senhor” (3, 60. 77-78). Bendizer a Deus por ter criado a água. O autor do Gênesis diz que “no princípio, Deus criou o céu e a terra… e o Espírito de Deus pairava sobre as águas” (1, 1-2). A água aparece assim como a primeira criatura de Deus. Depois todas as outras criaturas, inclusive nós, homens e mulheres, fomos criados.

Conscientizar

Precisamos crescer na consciência da importância da água para nossa vida. O corpo humano é constituído de aproximadamente 60% de água. “Estima-se que a água em um adulto saudável do sexo masculino seja responsável por 60% de seu peso corporal. Já em mulheres, essa substância representa cerca de 50% a 55%” (cf. https://alunosonline.uol.com.br/biologia). “Um dos papéis que o líquido desempenha é de solvente. Ele chega ao interior das células transportando nutrientes, lavando e arrastando para fora os venenos e toxinas produzidos pelo corpo. Temos reservas de água no organismo, dos quais pelo menos 4 litros são necessários para efetuar essa tarefa de forma satisfatória” (https://novaescola.org.br/). Portanto, precisamos de água para manter nosso corpo funcionando bem, com saúde.

Precisamos, ainda, de água para matar a sede, para cozinhar, fazer limpeza, lavar roupas e equipamentos, fazer germinar e crescer as plantas. Por isto, porque a água é tão importante para a vida do planeta terra e para a nossa vida humana, precisamos crescer na consciência de que ela não pode ser vista como mercadoria, como fonte de lucro. Precisamos crescer na consciência de que a água deve ser vista como um direito de toda pessoa humana e como um dever do estado de garantir seu acesso e sua qualidade.

“O direito à água, como todos os direitos, se baseia na dignidade humana e não em considerações de tipo meramente quantitativo, que consideram a água tão somente como um bem econômico. Sem água a vida é ameaçada. Portanto, o direito à água é um direito universal e inalienável” (Compêndio da Doutrina Social da Igreja, nº 485).

Defender

Tendo um espírito de gratidão a Deus pela água, fazendo crescer em nós esta consciência de que a água é um direito nosso e um dever dos governantes, devemos, também, ter uma atitude de defesa da água. Defender a água para que ela não seja privatizada, vire mercadoria, torne-se artigo de luxo, para quem tem dinheiro. Defender a água para que ela não seja poluída, envenenada, pelos agrotóxicos das fazendas do agronegócio, pelos venenos das mineradoras, pelo lixo e pelos esgotos de nossas vilas e cidades jogados em nossos rios, mares, açudes, aguadas.

Devemos dizer não à privatização das empresas estaduais e municipais de água; devemos trabalhar para que a água seja usada em primeiro lugar para o consumo humano e em segundo lugar para as indústrias e para a agricultura.

“A água, pela sua própria natureza, não pode ser tratada como uma mera mercadoria entre outras e o seu uso deve ser racional e solidário” (Compêndio da Doutrina Social da Igreja, nº 485).

Papa Francisco e a água

O Papa Francisco na Laudato Si’ em 2015 chamou a atenção da Igreja e do mundo sobre o valor e a importância da água e sobre o cuidado ou a falta de cuidado das pessoas e dos governantes para com a água (cf. nºs. 27 a 31).

Ele afirma: “A água potável e limpa constitui uma questão de primordial importância, porque é indispensável para a vida humana e para sustentar os ecossistemas terrestres e aquáticos” (n. 28). Em seguida levanta a voz e denuncia: “Um problema particularmente sério é o da qualidade da água disponível para os pobres, que diariamente ceifa muitas vidas. Entre os pobres, são frequentes as doenças relacionadas com a água, incluindo as causadas por microorganismos e substâncias químicas” (n. 29). E continua o Papa Francisco: “Em muitos lugares, os lençóis freáticos estão ameaçados pela poluição produzida por algumas atividades extrativas, agrícolas e industriais, sobretudo em países desprovidos de regulamentação e controles suficientes” (n. 29).

O Papa Francisco, também, nos lembra que “o acesso à água potável e segura é um direito humano essencial, fundamental e universal, porque determina a sobrevivência das pessoas e, portanto, é condição para o exercício dos outros direitos humanos” (n. 30).

Sínodo para a Amazônia e a água

No Sínodo para a Amazônia o tema água esteve na pauta nos debates que antecederam, durante a sua realização, nas falas dos sinodais, no documento final e depois na exortação apostólica “Querida Amazônia”.

No Documento Final se afirmou: “A água, fonte de vida, possui um rico significado simbólico. Na região amazônica, o ciclo da água é o eixo de interligação. Interliga ecossistemas, culturas e o desenvolvimento do território” (n. 7). A água, fonte de vida! Sem água nós morremos! Basta lembrar da crise do coronavirus que o mundo e nós no Brasil estamos enfrentando. As orientações de prevenção passam sempre em primeiro lugar na higienização das mãos com água e sabão.

Neste mesmo documento, no nº 10, encontramos a denúncia da “apropriação e privatização de bens da natureza, como a própria água” e chama a isto de “crise socioambiental” e considera como uma das “ameaças contra a vida”. Em sintonia com o Sínodo para a Amazônia, o Texto Base da Campanha da Fraternidade de 2020 (nº 47) chama nossa atenção para o aumento dos conflitos por água. Chegando a um aumento de 40% de 2002 a 2018, conforme dados do Caderno Conflitos no Campo Brasil/2018 da CPT – Comissão Pastoral da Terra.

Falando da Igreja Missionária, em saída, se diz: na Amazônia, “caminhar significa também ‘navegar’, através de nossos rios, nossos lagos, entre nosso
povo. Na Amazônia, a água nos une, não nos separa” (n. 20). Quem vive na Amazônia sabe como isto é verdade: a água nos mantém unidos, interliga as comunidades, faz gerar comunhão. Por isto a preservação de nossos rios, lagos e igarapés é de fundamental importância para nós que vivemos na Amazônia.

O Papa Francisco na Exortação pós sinodal fala da importância da água: “Na Amazônia, a água é a rainha; rios e córregos lembram veias, e toda a forma de vida brota dela (n. 43). E faz uma bela declaração da beleza do Rio Amazonas: “A água encanta no grande Amazonas, que abraça e vivifica tudo ao seu redor” (n. 44).

Também, o Papa Francisco, na Exortação “Querida Amazônia” faz uma denúncia forte: “A água, que é abundante na Amazônia, é um bem essencial para a sobrevivência humana, mas as fontes de poluição vão aumentando cada vez mais” (49).

Vivendo este Dia Mundial da Água, assumamos um compromisso de usá-la de forma correta, para que ela nunca falte para ninguém; assumamos, também, o compromisso de defendê-la contra os projetos que visam usá-la, apenas, como meio de obtenção de lucro; enfim, assumamos o compromisso de considerá-la como um bem essencial para a sobrevivência humana.

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