Dom João Justino de Medeiros Silva
Arcebispo de Montes Claros (MG)
O potencial para o diálogo está inscrito na natureza humana. Como ser de razão e de linguagem, o ser humano alcança a percepção da força criativa da palavra. Descobre que a fraternidade e a saudável convivência, não obstante os interesses conflitivos, podem ser restabelecidas quando se escolhe a via do encontro e do diálogo. Para os cristãos, essa via integra o evangelho de Jesus Cristo. Seu mandato aos discípulos é: “Como eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros. Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros” (Jo 13,34b-35). Um dos passos essenciais da experiência do amor é a palavra respeitosa que estabelece laços, constrói pontes e fortalece relações. Infelizmente, é muito comum a violência brotar da falta de diálogo, ou seja, do desinteresse em buscar palavras que comuniquem o que se compreende. O apelo às forças sempre destrutivas da violência é um dos piores contratestemunhos dos cristãos. E, para tristeza de todos, a história até nossos dias está manchada de maus exemplos.
“O diálogo sem reservas: não como mera atitude tática, mas como exigência intrínseca para fazer experiência comunitária da alegria da Verdade e aprofundar o seu significado e implicações práticas” é um dos critérios inspiradores para a renovação e o relançamento da contribuição dos estudos eclesiásticos. É o que propõe Papa Francisco na Constituição Apostólica Veritatis Gaudium, sobre as Universidades e as Faculdades Eclesiásticas, documento de dezembro de 2017. Recorremos à expressão “diálogo sem reservas” para evidenciar a necessária disposição de trabalhar incansavelmente pelo caminho do diálogo.
O Papa São Paulo VI, na esteira de seu antecessor, Papa São João XXIII, contribuiu para aprofundar o alcance da via do diálogo. Em sua Encíclica Ecclesiam Suam, São Paulo VI elabora a importância do diálogo, indicando quatro círculos que se ampliam: o diálogo interno na Igreja Católica; o diálogo dos católicos com os outros cristãos; o diálogo dos católicos com as outras religiões e o diálogo dos cristãos católicos com os homens e mulheres de boa vontade. Em nenhum desses círculos a prática dialogal é imediata e fácil. Não tenhamos uma visão idealizada ou romântica do diálogo. Mas saibamos que ele é caminho para gerar aproximação, encontro e comunhão.
O emblemático gesto de levantar uma bandeira branca como sinal de disposição para a paz, de baixar armas e cessar fogo, de interromper as formas de agressão indica que todos sabemos o caminho para a paz e a boa convivência: será sempre o diálogo. Não estamos todos precisando levantar a bandeira branca, interromper nossas agressões, dispor-nos ao uso da palavra? Para esse passo, nós cristãos deveríamos ser os primeiros, como seguidores daquele que é chamado o Príncipe da Paz. Contudo, para os discípulos de Jesus Cristo trata-se do diálogo como expressão de espiritualidade, não de simples estratégia.
Nossas comunidades precisam esmerar-se na educação para o diálogo, inspirando-se em Jesus de Nazaré. Uma das principais contribuições da educação católica para a sociedade se inscreve nesse âmbito: demonstrar como o diálogo constrói. Valorizemos todas as experiências de fomento ao encontro e à conversa entre as pessoas. Não encontraremos todas as respostas. Mas importa dialogar sem reservas. Todos os dias.