Nos dias 16 a 18 de agosto de 2013, a Diocese de Roraima promoveu um seminário da 5ª Semana Social Brasileira. O evento foi precedido por uma serie de debates ocorridos nas comunidades, durante o mês de agosto. O seminário ocorreu no salão nobre da Universidade Federal de Roraima e no Centro Multicultural de Boa Vista (RO). Participaram lideranças religiosas, dos movimentos sociais e da academia. O seminário contou com assessoria de especialistas sobre a realidade social, econômica, histórica e cultural do Estado, bem como do Pe Nelito Dornelas, da assessoria das pastorais sociais da CNBB. Como conclusão do seminário, foi publicada uma carta contendo uma análise da realidade do Estado e as principais reivindicações dos movimentos presentes.
CARTA ABERTA DA 5ª SEMANA SOCIAL BRASILEIRA EM RORAIMA
A sociedade civil organizada, representada pelas instituições: Diocese de Roraima, Sindicato dos Urbanitários, Fórum estadual das Juventudes de Roraima, Conselho Indígena de Roraima, Movimento Bandeirantes de Roraima, Movimento Purakê, Movimento em Favor dos Dependentes Químicos, Universidade Federal de Roraima, Sindicato dos Trabalhadores da Universidade Estadual de Roraima, Cooper 5 e o Projeto Nova cartografia Social da Amazônia da UFRR, reunidas em seminário da 5ª Semana Social Brasileira, discutiu sobre o tema do Estado que temos e o Estado que queremos, na perspectiva de uma sociedade justa, equitativa e plural, no horizonte e nos valores do Bem Viver.
O Estado que nós temos hoje no Brasil, e particularmente na região amazônica, é fruto do processo histórico vivido desde o tempo da colonização. Ao longo deste processo implantou-se, até nossos dias, uma estrutura social e política desigual e elitista e um modelo econômico extrativista e exportador que promoveu a ocupação do território, a concentração de riqueza e a exploração dos bens naturais. Este modelo se consolidou e avançou à custa dos direitos e da vida dos povos indígenas, comunidades negras, ribeirinhos, trabalhadores e trabalhadoras rurais e população urbana.
Atualmente, o Estado brasileiro ainda se pauta pela primazia do desenvolvimento econômico sobre a sócio-bio-diversidade, mantendo o mesmo modelo de crescimento exportador de matérias primas, haja vista a implementação do Plano de Aceleração do Crescimento – PAC e a Iniciativa sul-americana de integração física, IIRSA, onde o Brasil tem um papel de destaque. Ambas as iniciativas geram um impacto particularmente agressivo para a região amazônica e seus povos, com a retomada dos grandes projetos de infraestrutura e de energia e dos grandes empreendimentos, como a mineração, a exploração madeireira e o agronegócio.
Em Roraima não há políticas públicas elaboradas com as juventudes, enquanto que nas últimas três décadas aumentou a violência contra os jovens, que são a maioria nos presídios, ao tempo em que no poder legislativo federal, há grupos que defendem a aprovação da redução da maioridade penal para 16 anos.
Preocupa-nos também os ilícitos no processo de regularização das terras públicas, que alimenta a pressão dos grandes empreendimentos nas terras dos trabalhadores e trabalhadoras rurais.
Repudiamos as iniciativas legislativas que atacam os direitos territoriais dos povos indígenas, como a PEC 215 que pretende repassar ao Congresso Nacional a decisão sobre as demarcações e homologações de terras indígenas, o PL 1610/96 de mineração em terras indígenas, as 19 Condicionantes impostas pelo STF para Raposa Serra do Sol ou o último PLP 227 que submete o usufruto exclusivo dos bens naturais aos interesses de fortes grupos econômicos.
Reivindicamos a aplicabilidade de políticas públicas que contemplem as necessidades dos trabalhadores de acordo com os parâmetros dignos do trabalho.
Repudiamos o trabalho terceirizado; todavia, quando ele é exercido na empresa, exigimos um tratamento digno para esses trabalhadores.
Por último, exigimos a transparência e participação da sociedade na discussão sobre os projetos hidrelétricos impostos sobre Roraima, como o Bem Querer, Paredão ou Contigo, todos eles com fortes impactos socioambientais, sendo que existem alternativas em nosso Estado para a produção de energia que precisam ser consideradas.
No entanto, apesar de constatar estas realidades, somos conscientes de todas as lutas e conquistas que trouxeram o reconhecimento de direitos fundamentais, a partir da organização e mobilização social. Assim, o processo de participação popular na elaboração da Constituição Federal de 1988 foi determinante para a garantia de direitos. A Constituição Federal reconheceu direitos fundamentais e consolidou o controle social por meio de espaços de participação da sociedade.
Todavia, o preço da vitória exige uma constante vigilância para garantir direitos conquistados e a possibilidade de avançar em novos direitos. O Estado é um lugar em disputa permanente entre os interesses do grande capital e a força do coletivo. E nessa disputa, confirmamos a necessidade de passar de uma democracia representativa a uma democracia realmente participativa, tendo como horizonte o Bem Viver, o Ser e Pertencer e o Conviver.
Boa Vista, Roraima, 18 de agosto de 2013
