Dom Lindomar Rocha Mota
Bispo de São Luís de Montes Belos (GO)

A cultura é um agregado de forças que tem no ser humano a sua fonte, contribui incessantemente para o engendramento do mundo e para tudo que é significativo em suas linhas principais. Assim, ela é forjada a partir da liberdade humana, mas reincide sobre a própria liberdade para lhe determinar.

Neste sentido, podemos compreender melhor o movimento da cultura se o compararmos com o princípio da natureza, onde um fenômeno desencadeia outro, e, às vezes, gera algo de completamente novo em relação a própria possibilidade dos fenômenos originais.

A cultura é aberta a receber todas as inserções, mas se endurece terrivelmente quando lhe querem impedir essa abertura.

Evangelizar a cultura, portanto, não é se tornar estático diante dela, pois sua força é irresistível. Em certos casos é melhor acelerar o seu processo para se chegar logo a uma conclusão.

Não é um movimento fácil. Pois cada um está relativamente acomodado no lugar onde se encontra. Assim, desperdiça-se uma quantidade enorme de energia num esforço inglório para estancar o que já escorre no tempo.

Italo Calvino, na segunda de suas seis propostas para este milênio, disse: “um raciocínio rápido não é necessariamente superior a um raciocínio ponderado, ao contrário, mas comunica algo de especial que está precisamente nesta ligeireza”. Não é a perfeição que se alcança, nem o aperfeiçoamento da cultura, pois essa é perfeita em seu “sendo”. Ela nunca é, e está se formando por toda parte.

É uma ótica aberta ao Evangelho, que reconhece, entre outras coisas, este “sendo” como um processo longo de transformação e abertura para o Reino de Deus, sempre tão perto e sempre tão longe. É por aí que o Evangelho adentra. A cultura não é sua inimiga, nem o recebe a contragosto. Ela, entretanto, não espera ninguém. Corre a frente e pede que lhe espere no lugar e horário combinado. Como Jesus fez com seus discípulos, quando os mandava adiante de si, e pedia para antecedê-lo por toda parte. Quem não chega na hora e lugar combinados perde a oportunidade de testemunhar o “sendo” se fazer história.

A cultura não capitula diante do tempo, o Evangelho também não! Então temos que acelerar diante da calmaria nervosa que submerge à nossa época. Acelerando para ultrapassar certas resistências, como quem não podendo nadar rio acima, nada rio abaixo. O Evangelho possui suficiente força para acelerar a cultura, e lhe imprimir o ritmo suficiente para reencantá-la novamente.

A sua força está no ritmo que oferece para superar o próprio medo da morte. Porque a morte, em certo sentido, está oculta nos relógios, citando Belli. O tempo dá o ritmo, e pede para ser acelerado ou atrasado. Evangelizar a cultura é acertar este compasso. É acelerar na medida certa, e, é quase sempre mais correto adiantar os ponteiros, pois quem chega antes espera, mas perder o horário é ser deixado para trás.

Não acertar a cadência da cultura é como “não querer nascer para não morrer”, como genialmente retratado em The Life and Opinions of Tristram Shandy.

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