Dom Pedro Carlos Cipollini
Bispo de Santo André (SP)

 

 O mundo do esporte pranteou seu ídolo: morreu Maradona. Menino pobre de Villa Fiorito, favela na periferia de Buenos Aires. Começou a jogar futebol pensando em ganhar um refrigerante, e aos 15 ingressa em um clube onde tudo começou. Desejou ganhar uma Copa do Mundo e ganhou, inclusive muitos milhões de dólares, mas perdeu a guerra contra as drogas. O vício o acompanhou até o fim e ele mesmo reconheceu que foi o maior erro de sua vida se tornar um dependente químico.

Segundo Relatório Mundial de Drogas das Nações Unidas, existem no mundo mais de 200 milhões de consumidores de drogas. Cerca de 110 milhões as consomem com regularidade e 90 milhões são consumidores ocasionais. A partir da comoção despertada pela morte deste grande jogador de futebol convido o caro leitor a refletir sobre as drogas.

 A idade das pessoas pesquisadas vai de 15 a 64 anos, embora se saiba que existem crianças de 10 ou 11 anos envolvidas no tráfico e já viciadas, muitas das quais acabam assassinadas. Os usuários de drogas estão bem abaixo dos fumantes e dos que abusam do álcool, mas sabemos que, tanto o cigarro como o álcool, são drogas que funcionam como portas abertas para as drogas mais pesadas.

Com maior ou menor rigor as drogas são combatidas em todo mundo. Em alguns países até com pena de morte. Os resultados são pouco animadores, pois a fiscalização mostra-se ineficiente, e a apreensão não consegue reter mais que 20% da droga que circula. Existem ainda os interesses poderosos decorrentes da movimentação financeira, proveniente do lucro com o comércio de drogas. É todo um emaranhado complexo de fatores.

Todos parecem concordar que é impossível acabar com as drogas. Para muitos, a proibição não é o melhor caminho, valendo mais o jogo aberto, no qual é mais fácil perceber quem trafica. Até mesmo o governo ganharia, pois não teria que gastar com o controle e ganharia com impostos. É um debate sem fim! O Uruguai é um país que está fazendo a experiência de descriminalizar as drogas, com restrições.

O problema da droga, porém, não é um problema de polícia ou um problema clínico somente. Sem desconsiderar as causas sociais que induzem à droga, a meu ver, a dependência química é, sobretudo, na sua origem, um problema antropológico. Finca suas raízes no vazio de respostas e propostas para a vida, quando se pergunta pelo seu sentido. A falta de um lar, a falta de amor, a insegurança, e a fragilidade diante do desamparo da vida fazem com que a droga funcione como um refúgio.

Recordo o filósofo Heidegger falando do homem como “ser-para-a-morte”. Somente enfrentando a realidade da própria finitude, assumindo a vocação para ter consciência de si, de quem se é e qual seu destino, assumindo a própria realidade com coragem, é que se pode ser livre. A partir daí, é que poderemos nos projetar para fora de nós mesmos, numa vida com sentido. E acrescento, se existe fé em Deus, uma vida não só terá sentido, mas será uma vida em plenitude.

Sem este acerto interior, para que no íntimo do coração se ajustem os ponteiros da vida, o ser humano não amadurece, continuará tendo medo, continuará precisando fugir de si mesmo e infelizmente continuará precisando de todo tipo de droga. São as drogas ajudando na fuga da vida que se tornou “uma droga”.

Conheci um psicólogo norte americano casado com uma brasileira que o trouxe para morar no Brasil. Foi visitar-me para falar deste assunto. Expôs sua teoria: “a droga é muito forte e domina o cérebro, estou convencido que somente existe uma força maior que ela para libertar a pessoa da dependência: é Deus”.

Achei estranho mas não pude deixar de concordar. Pois coincide com os relatos de inúmeras pessoas que se libertaram das drogas. Realmente, “para Deus tudo é possível (Lc 1, 37).

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