Espírito de amor e de verdade!

Cardeal Orani João Tempesta
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro (RJ)

Como é tradição em nossa Arquidiocese irei presidir, às 10hs, do domingo de pentecostes o sacramento da Crisma para representantes de todas os vicariatos de nossa Arquidiocese. A solenidade que celebramos neste Domingo descende de uma festa judaica. A princípio esta festa chamava-se “Festa das Primícias”, das “Semanas”, da colheita ou também da entrega da Lei no Monte Sinai. Com os primeiros cristãos ela ganhará um outro sentido, ela será resignificada e contextualizada pela experiência vivida pelos apóstolos no Cenáculo, como nos relata São Lucas em Atos dos Apóstolos capitulo 2 versículos de 1-13; nesta narrativa das Sagradas Escrituras, vemos o início de uma nova vida àqueles que seguiam a Jesus de Nazaré, estes que o testemunharam por 3 anos a caminhar e a ensinar, e que antes de subir ao Pai prometeu-os o Divino Espírito Santo. Também se celebra o nascimento da Igreja já que a partir deste momento Pedro, primeiro Pontífice impelido pelo Espirito Santo converte uma multidão.

Esta Solenidade, portanto, têm muito significado para os cristãos, já que deixam a cultura Judaica e suas festas, para agora celebrar o nascimento da Igreja, o nascimento de uma nova vida, o Pentecostes é o verdadeiro significado dado á Cruz e a sua Ressureição, é o momento em que a nova humanidade retorna a Cristo.

Antes era a festa do Sinai, a entrega dos mandamentos ao povo de Deus, agora a Festa dos Dons, aquilo que a humanidade rompeu em Babel, onde todos começaram a se desentender, o homem passa a se reconciliar pela força do Espirito Santo. Historicamente a herança deixada pela Igreja primitiva, fazia com que esta festa fosse uma só, celebrada por cinquenta dias, contudo a partir do século IV, mais o menos em sua segunda metade, a Celebração dos Mistérios pascais sofre mudanças e começam a seguir a cronologia da Narrativa dos Atos dos Apóstolos.

Outro ponto importante para a Solenidade que celebraremos é a presença da Virgem Maria, em quase todas as iconografias da Igreja Primitiva, Maria está no Centro da Reunião onde como nos diz a Tradição em Sião, local em que a Virgem Mãe residia, estava Ela e os 12 reunidos no cenáculo quando veio sobre eles o sopro Divino, e como nos diz a Sagrada Escritura, no momento que o Espirito se derramou sobre eles como línguas de fogo, todos contagiaram-se pela força transformadora e restauradora do Espirito Santo. “Disse-vos estas coisas, permanecendo convosco. Mas o Consolador, que é o Espírito Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, ele vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar tudo o que vos tenho dito” (Jo 14, 25-26).

Portanto, após a Ascenção de Jesus estavam ali no cenáculo todos reunidos, obedecendo ao Senhor para que não se afastassem de Jerusalém e, ao mesmo tempo, tinham medo. Porém após este dia já não tinham mais receio, se antes não sabiam por onde caminhar, agora a partir desse evento sentiam-se impelidos pela força dada a eles a saírem e a anunciarem que Cristo Ressuscitou e que se faz presente em nosso meio até a sua volta gloriosa. Por isso, podemos dizer que nesta Solenidade a Igreja tem seu início, pois o Espirito Santo revigora os seus e dá-nos assim a força necessária para anunciarmos e mais ainda a cumprir com audácia e eficácia a missão de Jesus aqui na terra, que é a de anunciar o Reino que não tem fim.

Bento XVI resumiu bem o momento em que vivemos dizendo que a Solenidade de Pentecostes nos impele na unidade e na comunhão da verdade: “Mas olhemos para o Evangelho de hoje, no qual Jesus afirma: «Quando vier o Espírito da Verdade, Ele guiar-vos-á para a verdade total» (Jo 16, 13). Aqui Jesus, falando do Espírito Santo, explica-nos o que é a Igreja e como ela deva viver para ser ela mesma, para ser o lugar da unidade e da comunhão na Verdade: diz-nos que agir como cristãos significa não nos fecharmos no próprio «eu», mas orientarmo-nos para o todo: significa acolher em nós mesmos a Igreja inteira ou, ainda melhor, deixar que ela nos acolha interiormente. Então, quando eu falo, penso, ajo como cristão, não o faço fechando-me no meu eu, mas faço-o sempre no todo e a partir do todo: assim o Espírito Santo, Espírito de unidade e de verdade, pode continuar a ressoar nos nossos corações e nas mentes dos homens e estimulá-los a encontrar-se e a aceitar-se uns aos outros. O Espírito, precisamente pelo fato de que age desta forma, introduz-nos em toda a verdade, que é Jesus, guia-nos no seu aprofundamento e compreensão: não crescemos no conhecimento fechando-nos no nosso eu, mas unicamente tornando-nos capazes de ouvir e partilhar, só no «nós» da Igreja, com uma atitude de profunda humildade interior. E desta forma torna-se mais claro por que motivo Babel é Babel e o Pentecostes é o Pentecostes. Onde os homens pretendem tornar-se Deus, podem unicamente pôr-se uns contra os outros. Ao contrário, onde estão na verdade do Senhor, abrem-se à ação do seu Espírito que os ampara e une.”(http://w2.vatican.va/content/benedictxvi/pt/homilies/2012/documents/hf_ben-xvi_hom_20120527_pentecoste.html, último acesso em 18 de maio de 2018)

Peçamos, pois, neste dia em que suplicamos os dons do Divino Espírito Santo em nossa vida e na vida da Mãe Igreja que sejamos testemunhas do Ressuscitado e que com a assistência dos dons do Divino Espírito Santo, na comunhão com o Pai sejamos homens e mulheres que testemunhemos a verdade na comunhão da unidade trinitária.

Com Pentecostes inicia-se a missão da Igreja. Não só dos ministros ordenados, mas de todos os fiéis batizados que são enviados, repletos da graça divina e da ação do Divino Espírito Santo, a contagiar o mundo com o bem, o belo, o justo, o santo, o que nos ensina o Evangelho que pode ser resumido no mandamento do amor e da misericórdia. Que neste ano do laicato esse Espírito conduza a todos para anunciar o Reino como Igreja em saída, como seu testemunho de sal da terra e luz do mundo. Que o Divino Espírito Santo nos dê as luzes necessárias para contagiar o mundo com os seus dons e vivermos em harmonia e paz!

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