Dom Leomar Brustolin
Arcebispo de Santa Maria (RS)
A Modernidade interpretou com chave científica as forças da natureza, a constituição do ser humano, as relações sociais e os movimentos da História. Criou-se uma civilização baseada na ciência e na técnica. Com essa revolução de paradigmas, o ser humano não depende mais da natureza, mas esta depende da ação humana. Daqui nasce o questionamento sobre o sentido da religião querer falar para um mundo que se torna cada vez mais antropocêntrico.
É longa a história de conflitos entre a fé e a razão, entre a teologia e a ciência, entre a velha cultura medieval e religiosa e a nova cultura científica, moderna e autônoma. Nesse contexto, a fé e a ciência permaneceram inconciliáveis, pois, no mundo científico da Idade Moderna, a reflexão religiosa se tornou sempre mais irrelevante.
O diálogo entre teologia e ciência não pode situar-se apenas no nível do cientista, mas do mundo e do saber que ele constrói. Não se pode reduzir essa relação em posições que pretendam apenas um médico que se comporte como cristão, ou um biólogo que viva como um crente. Interessa tanto a concepção de mundo quanto a abordagem científica e prática de tais pesquisadores. Trata-se de uma fé cristã preocupada com a mediação histórica entre ser humano e natureza. Quanto mais a pesquisa analisa o mundo histórico-social, maior será o problema do sentido do fim e da conclusão dos processos. Quanto mais o ser humano manipula a realidade, mais ele se descobrirá inadequado em relação aos objetivos postos e aos êxitos possíveis.
Não é possível dissociar o conhecimento do mundo e a esperança da salvação. Todo agir humano se move entre a possibilidade da humanidade salvar-se e o risco de perder-se.
A crise moderna sobre racionalidade científica teve um ponto-chave com os estudos de Albert Einstein.
A virada copernicana ocorre com a física quântica. Suas descobertas têm-nos conduzido para um outro mundo, com novas noções de tempo, de espaço e de matéria.
A experiência dos físicos quânticos permite concluir que a realidade não é cognoscível, pois é coberta de um véu e está destinada a permanecer assim.
Tudo aponta para o limite do conhecimento adquirido, até desembocar no enigma essencial que desafia o humano: a existência de um Ser transcendente, causa e significado do grande universo. Nesse caso, fé e razão, ciência, religião e filosofia se encontram. Sobre essa relação escreve o Papa João Paulo II na sua encíclica Fides et Ratio: “A fé e a razão constituem como que as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade”.