Força e grandeza da solidariedade

O ser humano tem sentimentos e atitudes muito paradoxais. Em determinadas situações, são edificantes os seus sentimentos e suas atitudes. Em outros momentos, falam mais a sua indiferença, frieza, omissão, maldade, exploração e agressão diante de seus semelhantes e da própria natureza. Ao se conduzir na linha da solidariedade, além da força do humanismo, a pessoa, por certo, está respondendo aos estímulos da graça de Deus. Ao enveredar pelos caminhos da indiferença e da maldade, ela está demonstrando um embrutecimento humano que é expressão do pecado na sua vida. Na Sagrada Escritura, encontram-se inúmeros casos onde a solidariedade e o serviço fraterno têm a linguagem da graça divina e outros onde a indiferença e a maldade humanas são a expressão do pecado.

A parábola do bom samaritano é muito ilustrativa, nesse sentido. A maldade levou um ser humano a assaltar e ferir seu semelhante, em terra deserta; a indiferença se revelou na atitude de um sacerdote e de um levita, homens do culto e do serviço religioso; a solidariedade foi demonstrada por um samaritano, personagem rejeitado entre os judeus por sua origem geográfica, étnica e religiosa. Quaisquer que fossem as causas de exclusão na sociedade de seu tempo, Jesus nunca fez distinção de pessoas e, por essa razão, valorizou o gesto solidário do samaritano. (cf Lc 10,30-37) Surpreendentemente, algumas pessoas, muitas vezes, demonstram mais solidariedade no trato da natureza e de seus incontáveis seres do que em relação a seus semelhantes. Para essas pessoas, por exemplo, a sociedade de proteção aos animais se sobrepõe àquela instituição que cuida de crianças em situação de risco, de jovens dependentes de drogas e de idosos abandonados por seus familiares. É admirável e visível o seu cuidado com o meio ambiente, enquanto é chocante sua atitude de indiferença diante de problemas no seu universo familiar.

Deus colocou no coração do ser humano uma qualidade de dimensão e valor muito grandes, quando se vê frente a seus semelhantes e a outros seres da natureza – a solidariedade. No dia a dia e, especialmente, em situações muito complexas, a sensibilidade da pessoa humana se manifesta através da solidariedade que é uma forma ativa de compartilhar dores e dramas. Em todo ato de solidariedade, há sempre uma intenção genuína, muito embora nem sempre se torne realidade concreta, em razão de fatores imprevisíveis. Porém, felizmente, na maioria dos casos, a intenção de fazer o bem concretiza-se em gestos que revelam grandeza humana, por mover a pessoa para sair de si e ir na direção dos necessitados. São muitos e muito diversificados os cenários onde o apelo à solidariedade se faz ouvir, estão ao lado ou longe, mas sempre tocam o coração humano. Desde que não haja indiferença, a forma de envolvimento sempre encontrará a linguagem de participação. A solidariedade é, por assim dizer, uma extensão da pessoa, mediante sua intenção e ação, e acontece, mais imediatamente, junto àqueles que fazem parte de seu sangue, de sua amizade, de seu relacionamento; é natural que assim o seja, mas a grandeza e a força da solidariedade, como vivenciou o bom samaritano, consistem em fazer o bem às pessoas, em razão de suas necessidades.

Num olhar cristão, a solidariedade é um ato de misericórdia e caridade, mas também contém o lado do dever. Se Deus criou o ser humano para conviver com seus semelhantes, neles encontrando tudo que contribui para seu bem viver; aí também está a consciência da necessidade de ajudá-los, de modo especial, em situações difíceis. Portanto, a solidariedade também tem o lado do dever, tanto no tocante a pessoas quanto a instituições privadas e públicas. Concretamente, a participação da sociedade se faz muito presente através de doações e outras iniciativas, como o trabalho voluntário, mediante um mutirão de solidariedade. A Defesa Civil, no âmbito municipal,  estadual e federal, é outra expressão do dever solidário da sociedade e dos Poderes Públicos, quando ocorre um estado de calamidade, como aconteceu, recentemente no Rio de Janeiro, São Paulo, Alagoas e Pernambuco, sempre com onerosa repercussão humana, social e financeira, tal como se faz sentir na Mata Sul, especialmente no território da Diocese de Palmares, atingida duramente pelas enchentes dos últimos dias.

Certamente, a sociedade se vê em muitas dessas calamidades que estão acontecendo, em decorrência de suas desastrosas intervenções no mundo da natureza. Mas, diante do acontece nesse campo, é gratificante vê-la na linha da solidariedade.

Dom Genival Saraiva

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