Dom Aloísio Alberto Dilli
Bispo de Santa Cruz do Sul

 

Caros diocesanos. Ao iniciar o segundo capítulo da Carta-Encíclica Fratelli Tutti (Todos Irmãos), o Papa Francisco faz uma reflexão sobre o texto do Evangelho do Bom Samaritano (cf. Lc 10, 25-37) e diversos outros textos bíblicos sobre o amor fraterno, condição para o amor a Deus (cf. 1Jo 4, 20) e resumo de toda Lei (cf. Gl 5, 14). O Bom Samaritano não se pergunta sobre a procedência do homem que está na sarjeta, mas o acode por ser necessitado: “Conseguiu deixar tudo de lado à vista do ferido e, sem o conhecer, considerou-o digno de lhe dedicar o seu tempo” (FT 63). O documento do Papa questiona a sociedade de nossos tempos com palavras fortes: “Somos analfabetos no acompanhar, cuidar e sustentar os mais frágeis e vulneráveis das nossas sociedades desenvolvidas… Como estamos todos muito concentrados nas nossas necessidades, ver alguém que está mal incomoda-nos, perturba-nos, porque não queremos perder tempo por culpa dos problemas alheios. São sintomas duma sociedade enferma, pois procura construir-se de costas para o sofrimento” (FT 64 e 65). A passagem do Bom Samaritano faz ver que a existência de cada um de nós está ligada à dos outros: a vida não é tempo que passa, mas tempo de encontro, de construir pontes, independentemente se alguém faz parte ou não do próprio círculo de pertença. Viver indiferentes à dor não é uma opção possível; não temos o direito de deixar ninguém caído nas margens da vida. Portanto, todos os projetos econômicos, políticos, sociais e religiosos devem ter isso presente em suas definições.

            Segundo o Papa, no Evangelho citado existem simplesmente dois tipos de pessoas: aquelas que cuidam do sofrimento e aquelas que passam ao largo, em atitude de perigosa indiferença. Isso nos alerta para o fato de que crer em Deus e adorá-lo ainda não é garantia de viver como agrada a Deus. Uma pessoa pode não ser fiel a tudo o que a fé exige dela e, no entanto, sentir-se perto de Deus e julgar-se com mais dignidade do que os outros. Mas há maneiras de viver a fé que facilitam a abertura do coração aos irmãos, e esta será a garantia duma autêntica abertura a Deus. São João Crisóstomo (+ 407) expressou isso com clareza: “Queres honrar o Corpo de Cristo? Não permitas que seja desprezado nos seus membros, isto é, nos pobres que não têm que vestir, nem O honres aqui no templo com vestes de seda, enquanto lá fora O abandonas ao frio e à nudez” (FT 74). O samaritano, depois de realizar o possível ao necessitado, seguiu seu caminho sem esperar reconhecimentos. A dedicação ao serviço era a grande satisfação diante do seu Deus; a caridade fraterna com o ferido é considerada como um dever de sua fé: eu devo tornar-me próximo dos outros, pois Deus ama cada ser humano com um amor infinito e lhe confere uma dignidade infinita. Nós acreditamos que Cristo derramou o seu sangue por todos e por cada um.

O Papa termina o capítulo segundo com a seguinte advertência: “É importante que a catequese e a pregação incluam, de forma mais direta e clara, o sentido social da existência, a dimensão fraterna da espiritualidade, a convicção sobre a dignidade inalienável de cada pessoa e as motivações para amar e acolher a todos” (FT 86). Eis importante missão para os anunciadores da Palavra de Deus, nos templos, nas salas de catequese e nas famílias cristãs.

 

 

 

 

 

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