Dom Leomar Antônio Brustolin
Arcebispo de Santa Maria (RS)

 

A antropologia cristã contempla o ser humano como uma unidade complexa e inseparável de corpo e espírito. Não somos um espírito aprisionado num corpo, tampouco um corpo desprovido de alma. Somos uma realidade integral, marcada pela corporeidade e pela dignidade. O corpo humano não é apenas matéria — ele é a epifania da pessoa, sua expressão visível e concreta. Tocando o corpo, toca-se a própria pessoa; desprezando-o, despreza-se quem ele é.  

O corpo é o primeiro lugar da manifestação do humano. Mais do que possuir um corpo, somos corporais. Por meio dele, estamos no mundo, nos relacionamos, expressamos afetos, comunicamos ideias, sofremos e amamos. Segundo o padre jesuíta, filósofo, professor e humanista, Henrique Cláudio de Lima Vaz, essa é a dimensão intencional do corpo: ele é vivido com consciência, e não simplesmente habitado como uma estrutura biológica. 

A diferença sexual como dom 

A diferença entre homem e mulher é parte constitutiva dessa corporeidade. Não é um detalhe biológico superficial, mas uma marca profunda da condição humana. Somos criados em duas formas distintas, complementares e igualmente dignas. Cada um, com sua estrutura física, hormonal, psicológica e espiritual, expressa uma das faces do mistério humano. Essa distinção, longe de dividir, revela a riqueza da diversidade querida por Deus.

Fundamento bíblico da diferença 

A teologia bíblica corrobora essa visão. No livro do Gênesis, Deus cria o ser humano “à sua imagem e semelhança” e especifica: “homem e mulher os criou” (Gn 1,27). A diferença sexual é, portanto, parte essencial do projeto divino. Não é oposição, mas vocação à comunhão. A dualidade homem-mulher, inscrita nos corpos, convida ao encontro, à doação mútua, à construção de um mundo onde a alteridade é dom e caminho para a plenitude. 

A contribuição de Edith Stein 

A filósofa, mística e santa carmelita, Edith Stein, aprofunda essa compreensão ao afirmar que masculinidade e feminilidade não se limitam a funções fisiológicas. Elas configuram modos distintos de viver e de se relacionar com o mundo. O corpo feminino, por exemplo, revela uma especial abertura à vida e um cuidado atento à totalidade do ser. Já o corpo masculino tende a expressar energia voltada à ação e conquista. Ambos são diferentes, mas se completam e enriquecem reciprocamente.

Essa visão integral e complementar, enraizada na fé e na reflexão filosófica, convida-nos a valorizar a dignidade e a beleza de cada pessoa. Homem e mulher, em sua diferença e reciprocidade, são chamados a testemunhar a harmonia que Deus quer para toda a humanidade. 

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