No tempo da Páscoa meditamos sobre as novidades que Jesus Cristo, morto e ressuscitado, introduziu no mundo. Com Cristo mudou para os homens o modo de pensar em Deus, o modo de senti-lo presente na própria vida, de estar no meio de nós.
O evangelho, narrado por João 14,23-29, nos repropõe palavras pronunciadas por Jesus durante a última ceia. São palavras sobre as quais João deve ter meditado profundamente, a vida inteira. João teve vida longa, o único apóstolo não mártir, que escreveu seu Evangelho pelo ano 90 de nossa era.
Um evangelho diverso dos três precedentes, Marcos, Mateus e Lucas. Parece que João tenha querido reservar a si, como testemunha ocular dos fatos, como um que viu e teve a tarefa especial, de relatar algumas coisas não ditas pelos outros evangelistas, de por em evidência particularidades que lhes passaram desapercebistas e com o passar do anos lhe pareceram tornar-se mais importantes.
Ao tempo dos fatos, João era jovem. Era inteligente, intuitivo , generoso, pleno de entusiasmo, impetuoso. Ele e seu irmão Tiago foram cognominados por Jesus “filhos do trovão”. João nos relatou com particulares o episódio da última ceia, quando Jesus chamou amigos os apóstolos, quis lavar-lhes os pés, e instituiu a Eucaristia.
Naquela ocasião, Jesus discursou longamente, despedindo-se cheio de emoção. No trecho de hoje, Jesus descreve a situação do homem novo, de quem entende viver como discípulo do Senhor e Filho de Deus. São três idéias fundamentais, que valiam para os apóstolos então, e que valem não menos para nós hoje.
Em primeiro lugar, Jesus indica quais as conseqüências para o homem que se empenha em amar verdadeiramente o Senhor: “Se alguém me ama, observará as minhas palavras”. Depois acrescenta o novo: “E meu Pai o amará”. Jesus prossegue: “Nós viremos a ele, e faremos morada nele”. Desconcertante conseqüência para o cristão que ama verdadeiramente Cristo. Deus vem a ele, vem à sua casa, habitar em seu coração. É a presença de Deus em nós, que traz tanta serenidade e confiança à vida do cristão.
Jesus acrescenta um segundo dado importante: “O Espírito Santo que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará tudo”. Com a presença de Deus em seu coração, o cristão adverte em si a voz do Espírito Santo que o instrui, lhe sugere pensamentos de fé, e sentimentos de amor ao próximo, Mostrando-lhe como comportar-se na vida.
Às vezes fechamos os ouvidos para não ouvir a voz da consciência, a voz de Deus. Quem ao invés se põe na escuta do Espírito Santo, entra em harmonia com o Senhor. E entra em harmonia consigo mesmo. E encontra dentro de si mesmo grande paz. É a terceira característica do cristão: homem de paz. Do evangelho ouvimos as palavras de Jesus: “Deixo-vos a paz, dou-vos a minha paz”.
São palavras de amizade e de augúrio, e o sacerdote as repete durante a missa, exatamente como augúrio de Jesus, como dom que o Senhor nos faz. Mas não se trata de qualquer paz, porque Jesus precisou bem: esta paz “Eu vos dou não como a dá o mundo”.
A paz do mundo como se verifica não é como satisfazer a fome. Há quem quer tudo e imediatamente, e faz a guerra. A paz não é como um armistício, um parêntesis, enquanto a normalidade seria combater-se, sobrepor-se aos outros, impor-se.
Como cristãos, não devemos impor aos semelhantes outro peso senão o do seu amor, que é a única necessidade que se impõe por si com invencível força. Devemos escutar o Espírito Santo com humildade e amor para vencer a tentação de reduzir as palavras de Jesus à nossa pequena medida, de sermos nós os intérpretes. Somente o Espírito pode iluminar e conduzir-nos a descobrir o seu sentido verdadeiro para repetir aos irmãos com a doçura e mansidão que as tornam acreditáveis. Só o Espírito pode abrir-nos à compreensão das situações humanas mais diversas, à solidariedade com todos, base para a oferta do evangelho de paz.
Assim, sem atitude de segurança e de orgulho, possamos tornar-nos portadores da paz de Cristo, que vem do Pai e que ele, mediante o Espírito, difunde em nossos corações.
