Na sala de cirurgia da clínica universitária os assistentes estavam introduzindo uma maca. Nela estava deitado um paciente que devia ser operado, e o cirurgião lhe explicava a complexidade da cirurgia e as suas conseqüências.
– O senhor – dizia o médico – tem um câncer na garganta. Nós temos a certeza de conseguir extirpá-lo completamente. Assim salvaremos a sua vida, mas o senhor, infelizmente, não poderá mais falar. O cirurgião parou um instante e depois continuou: – Se o senhor quiser dizer agora as últimas palavras da sua vida, pode fazê-lo. O paciente demorou alguns momentos em silêncio, depois, com voz clara e firme, exclamou:- Louvado seja nosso Senhor Jesus Cristo!
Assim é a história. As últimas palavras do paciente foram de louvor ao Senhor e, indiretamente, de agradecimento pela vida e por tudo o que estava acontecendo, apesar da grave deficiência que deveria sofrer em seguida.
Este pequeno exemplo despertou a minha curiosidade, porque na página do evangelho deste domingo encontramos o jovem, morto, filho único da viúva que Jesus cruzou no caminho para Naim. Jesus, tocado e comovido pelas lágrimas da mãe, devolveu a ela o filho com vida. Um sinal extraordinário que suscitou o espanto e a maravilha de todos. No entanto o detalhe que chamou a minha atenção foi que o jovem, ao acordar do sono da morte, logo começou a falar. Nunca saberemos o que ele falou. As palavras dele não ficaram registradas, mas, sim, a dos presentes: “Um grande profeta apareceu entre nós e Deus veio visitar o seu povo”.
Se as últimas palavras do paciente foram de fé e de agradecimento, o que pensar das “primeiras” palavras de um filho, morto, devolvido vivo à mãe? Terá também ele agradecido a Deus? Terá, talvez, como acontece nos filmes de hoje, perguntado onde estava e o que tinha acontecido tão grande devia ser a sua surpresa? Vamos deixar para lá as especulações. Os evangelhos, muitas vezes não contam tantos detalhes porque, bem sabemos, mais do que relatar fatos, querem nos ajudar a compreender a pessoa de Jesus até chegar a acreditar e a confiar nele.
Nossa curiosidade poderá ficar satisfeita, em parte, se tivermos a paciência de ler mais um pouco o mesmo capítulo do evangelho de Lucas. João Batista manda perguntar a Jesus se é ele “aquele que devia vir” ou se deviam esperar outro. Jesus responde aos enviados que relatem a João o que estão vendo e ouvindo: cegos recuperam a vista, paralíticos andam, leprosos são purificados, surdos ouvem, mortos ressuscitam e aos pobres é anunciada a Boa-Nova! (cfr. Lc 7,18-23). Os sinais que Jesus faz chamam atenção. São os sinais de uma vida nova, de uma longa espera que começa a se realizar. Contudo esses e outros sinais devem conduzir ao anúncio da Boa-Notícia “aos pobres”. Os sinais falam só em parte, porque podem ser interpretados e usados de maneiras diferentes. Eles precisam da palavra para serem compreendidos como anúncio da chegada de algo de novo. “Deus veio visitar o seu povo” disseram, justamente, as pessoas que tinham visto Jesus devolver o filho morto à mãe aflita.
Deus não está longe do seu povo, ao contrário, está presente e caminha com todos, com aqueles que o querem seguir, e também com os outros. O Deus que Jesus veio revelar é o Pai de todos, dos pobres em maneira especial. Partilha alegrias e tristezas, chora com a mãe que perdeu o filho e exulta com os pequenos que aprendem a louvar a Deus. Talvez sejamos nós que ainda não entendemos isso. Continuamos a chorar, distraídos, indiferentes, reclamando daquilo que, achamos, Deus fez de errado. O que nós, muitas vezes, chamamos de “silêncio” de Deus é, na realidade, a sua paciência para que nós mesmos o reconheçamos intimamente presente na caminhada da nossa vida. Ele é mais fiel do que qualquer outro amigo ou companheiro, solidário conosco até na morte, para que estejamos com ele na vida que não terá fim.
Afinal podemos dizer: o verdadeiro morto que revivendo começa a falar, não é o filho único da viúva de Naim, mas o próprio Jesus ressuscitado que continua a nos convidar à compaixão, ao louvor, ao amor-serviço aos pobres. É ele – vivo – que, ao mesmo tempo, é a Boa- Notícia e o comunicador desta alegre esperança de vida. Deus continua visitando o seu povo. Louvado seja nosso Senhor Jesus Cristo!
