Dom Aloísio A. Dilli
Bispo de Santa Cruz do Sul
Estimados diocesanos. Estamos em setembro, mês em que celebramos nossa Independência, como país soberano, embora com preocupantes dificuldades políticas, sociais, econômicas e éticas; tempo em que destacamos a data Farroupilha, tão valorizada em nossa história e cultura gaúcha; é o mês do início da primavera com suas flores e perfumes, despertando a esperança para abundantes colheitas; período em que os pássaros voltam a cantar e os insetos cruzam os ares, enfim é o mês em que a vida se renova e se manifesta por todo lado. Para nós católicos, setembro é também considerado o mês da Romaria diocesana e, sobretudo, da Bíblia, livro que contém a Palavra de Deus. É este sentido que hoje queremos refletir, com especial atenção.
Nosso Deus é um Deus que fala, que se comunica com seu povo. Para os hebreus o termo dabar significa, simultaneamente, palavra, fato ou acontecimento. Deus se revela com palavras e obras (Palavra que salva). Sua Palavra é viva e eficaz, dinâmica e criadora (Hb 4, 2 e 12), sua Palavra é permanente ou eterna (cf. 1Pd 1, 23).
Esta Palavra chega à sua máxima presença e ação na “Palavra que se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1, 14). Através da encarnação de Jesus Cristo, esta Palavra do Pai, tão digna e santa, assumiu nossa condição humana: “Desde então a Palavra já não é apenas audível, não possui somente uma voz; agora a Palavra tem um rosto, que por isso mesmo podemos ver: Jesus de Nazaré” (VD 12). Nosso Deus se fez diálogo com a humanidade. Assim, Jesus Cristo tornou-se o coração da Palavra de Deus. Ele está presente sob os véus das Escrituras, como está sob os véus do pão e do vinho. Aproximar-se da Palavra é aproximar-se do Verbo da Vida. Por isso diz S. Jerônimo: “Ignorar as Escrituras é ignorar Jesus Cristo”. Não pode haver Igreja-Povo de Deus sem obediência à Palavra de Deus. Não pode haver Comunidade, sem a Palavra. Constata-se relação próxima entre desinteresse pela Palavra e esfriamento das relações fraternas e comunitárias. Para reavivar nossas Comunidades será necessário abundante alimento e encontro com o Deus da Palavra na Sagrada Escritura. Como afirmam nossos documentos, a Palavra de Deus é sustento, alimento, fonte límpida e perene de vida espiritual (cf. DV 21 e VC 94). A celebração da Palavra de Deus vem a constituir-se em forma privilegiada de encontro com o Senhor (cf. Comunidade de Comunidades: Uma Nova Paróquia, nn. 273 e 277).
Na liturgia, a Palavra de Deus se revela como potência de Deus em toda sua capacidade criativa e salvífica, enquanto sinal sacramental (atualização no hoje da história) e sinal profético (anúncio). Se tirássemos a Palavra de Deus na Liturgia, estaríamos tirando a nossa conexão com as maravilhas que Deus operou e continua a operar em todos os tempos na História da Salvação.
Depois de longo exílio da Palavra, a partir do Concílio Vaticano II vivemos uma primavera da Palavra. Muitos cristãos já fazem da Palavra um verdadeiro alimento no caminhar de sua vida, pois “a Igreja funda-se sobre a Palavra de Deus, nasce e vive dela” (VD 3). Para recriar a vida e animar a missão evangelizadora é preciso abrir espaço à Palavra, pois ela é fonte primeira da vida cristã. Num mundo em busca de sentido para a vida, com a Palavra podemos nascer de novo. Sem a presença da Palavra no coração e dada à luz na cotidianidade da vida, morrerá o encanto de nossa existência.