O mês de novembro é tradicionalmente celebrado como mês “das almas”. Inicia-se, contudo, com a festa de Todos os Santos, num grito exultante que proclama a vitória da vida sobre a morte.

No dia 2, na liturgia dos Finados, a Igreja apresenta suas preces ao Senhor por todos os que, tendo terminado sua peregrinação terrestre e afastado o perigo da condenação eterna, se purificam na chama ardente do amor de Deus (purgatório) preparando-se para a visão beatífica, de que já gozam todos os santos.

Estas comemorações elevam nossas mentes às últimas realidades (novíssimos), das quais nenhum vivente escapará: morte, juízo, inferno ou paraíso. Para o Senhor, a nossa vida tem grande importância. A nossa história não lhe é indiferente, nos recordou o Papa Bento XVI, em sua Encíclica, Spe salvi. Assim sendo, é no amor incomensurável de Deus pelo homem que se apóia a doutrina católica sobre a vocação à eternidade inserida no coração humano, sobre a escatologia, que conhece uma fase intermediária e outra final.

A teologia católica, com base na Sagrada Escritura e na Sagrada Tradição, ensina que o homem não foi criado para conhecer a corrupção da carne. Alvo privilegiado do amor de Deus, não teria conhecido o fim trágico de sua existência, que é a morte, se não se tivesse rebelado contra seu Criador. Constituído no estado de santidade e justiça original, passaria da vida terrestre para a visão de Deus de uma maneira natural e sem traumas. Sendo alma imortal e corpo material, perfeita dualidade querida pelo Senhor, sua inteireza, isto é, sua pessoa, estava destinada à contemplação do Eterno.

Não foi assim, porém, que as coisas aconteceram.      O homem pecou gravemente: duvidou do amor de Deus e quis ocupar-lhe o lugar. Destruída a comunhão com o Criador, encontrou o fim trágico e destrutivo para os seus dias: o pó será o seu fim (Cf. Gn 3,19). Foi envolvido pelo drama da separação perpétua de Deus e da corrupção da carne. Com efeito, Paulo ensina que “o salário do pecado é a morte” (Rm 6,23).

A Páscoa de Cristo, no entanto, privou a morte de seu maior poderio: o de separar-nos de Deus. Antes do Cristo, mesmo os justos após a morte estavam privados da visão de Deus. São estes os que no Credo dizemos foram libertos da Mansão dos mortos pelo Senhor. Tendo-lhes aberto o acesso ao Pai, o Senhor “mata” a morte, que, de agora em diante, será apenas uma conseqüência temporal do pecado, isto é, continuará a ser a corrupção de nossa carne, mas “não mais nos poderá separar do amor de Deus” (Cf. Rm 8, 38). Paulo diz que a morte é “partir e ir para estar com Cristo” (Fl 1,23).

Todos, portanto, que morrem em estado de amizade perfeita com Deus são admitidos à Sua adorável presença logo após a morte. Outros, todavia, mesmo não se encontrando em inimizade com Deus, não foram considerados dignos de contemplá-lo sem antes passar por uma realidade de purificação. A prática de rezar pelos mortos, presente desde os tempos mais remotos da Igreja, fundamenta a doutrina sobre o purgatório e encontra base bíblica no segundo livro dos Macabeus (Cf.Mc 12, 38-45).

Na caridade de Cristo, rezemos pelos falecidos, pois eles também oram por nós.

Dom Gil Antônio Moreira

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