Não quero ser notícia, mas levo uma Boa Notícia

Ao concluir o Ano Sacerdotal no dia de amanhã, gostaria de reportar aqui alguns depoimentos de um missionário, que deixando a sua pátria, não vai para tirar dinheiro dos pobres para construir templos majestosos e nem criar tesouros nos grandes fundos financeiros, e sim para promover e defender a vida.

O sacerdote Martín Lasarte, que está há mais de 20 anos em Angola, relata enternecedoras histórias de sacerdotes que entregam as suas vidas até limites inimagináveis, mas…não são notícia. O missionário uruguaio Martín Lasarte, um missionário que vive há mais de 20 anos em Angola, define-se a si mesmo numa carta enviada ao The New York Times como «um simples sacerdote católico» que se sente «feliz e orgulhoso» da sua vocação.

“O diário norte-americano, que liderou a campanha contra a Igreja e o Papa por causa dos casos de pedofilia cometidos por alguns clérigos, ainda não respondeu. Nela, Lasarte explica o trabalho silencioso a favor dos mais desfavorecidos que a maioria dos sacerdotes da Igreja católica fazem nestas paragens, mas que, no entanto, «não é notícia». «Causa-me uma grande dor que pessoas que deveriam ser sinais do amor de Deus tenham sido um punhal na vida de inocentes. Não existem palavras que justifique tais atos. Não há dúvida que a Igreja só pode estar do lado dos fracos, dos mais indefesos. Portanto todas as medidas que venham a ser tomadas para a proteção, prevenção da dignidade das crianças serão sempre uma prioridade absoluta», afirma o missionário na sua carta.

No entanto, acrescenta o missionário, «é curiosa a escassez de notícias e o desinteresse pelos milhares e milhares de sacerdotes que se consomem pelos milhões de crianças, pelos adolescentes e os mais desfavorecidos nos quatro cantos do mundo». Não é notícia transportar crianças através de campos minados.

Não é noticia que mais de 60.000 dos 400.000 sacerdotes, religiosos tenham deixado a sua terra, a sua família para servir os seus irmãos em leprosarios, hospitais, campos de refugiados, orfanatos para crianças acusadas de feiticeiras ou órfãos de pais que faleceram com aids, em escolas para os mais pobres, em centros de formação profissional, em centros que prestam cuidados a soropositivos… ou sobretudo em paróquias e missões para motivar as pessoas a viver e amar.

Não é notícia -diz- que o meu amigo, o padre Marcos Aurélio, para salvar alguns jovens durante a guerra em Angola, tenha sido fuzilado no caminho; que o irmão Francisco, com cinco catequistas, por terem ido ajudar em áreas rurais mais recônditas tenham falecido num acidente; que dezenas de missionários em Angola tenham falecido por falta de socorro sanitário, por causa de uma simples malária; que outros tenham saltado pelo ar, por causa de uma mina.

Não é notícia acompanhar a vida dum sacerdote “normal” no seu dia a dia, nas suas dificuldades e alegrias consumindo sem ruído a sua vida a favor da comunidade que serve. A verdade é que não procuramos ser notícia, mas simplesmente levar a Boa Noticia, essa notícia que sem ruído começou na noite de Páscoa.Faz mais ruído uma árvore que cai do que uma floresta inteira que cresce! O sacerdote não é nem um herói nem um neurótico. É um simples homem, que com a sua humanidade procura seguir Jesus e servir os seus irmãos. Existem misérias, pobrezas e fragilidades como em cada ser humano; e também beleza e bondade como em cada criatura.Insistir de forma obcecada e persecutória num tema perdendo a visão de conjunto cria verdadeiramente caricaturas ofensivas do sacerdócio católico com as quais me sinto ofendido, afirma o missionário. E conclui: Só lhe peço amigo periodista, que procure a Verdade, o Bem e a Beleza. Isso torna-lo-á nobre na sua profissão”.

Esse testemunho caracteriza muito bem a nossa presença no mundo e marca profundamente o sentido do nosso sacerdócio hoje. Por isso recordo o que diz o Apóstolo Paulo: “Somos o que somos pela graça de Deus”. A Ele entregamos tudo, para dele sermos herdeiros de tudo.

Dom Anuar Battisti

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