A Comissão Episcopal Pastoral Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) tornou pública hoje, dia 28 de janeiro, Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, uma nota sobre os casos de exploração do trabalho escravo no Brasil. Segundo o documento, baseado nos dados da Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), de 1995 a 2018, já foram libertados de trabalho escravo no Brasil 50.731 trabalhadores.
“A exploração do ser humano, através do trabalho escravo, é um grave desrespeito aos direitos da pessoa humana, à sua dignidade e especialmente uma violação grave ao direito de trabalhar em condições dignas, recebendo um salário justo”, diz a notam, assinada pelo bispo de Balsas (MA), dom Enemésio Lazzaris, presidente da Comissão Episcopal Pastoral Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano da CNBB. Leia abaixo a íntegra do documento.
28 DE JANEIRO DIA NACIONAL DE COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO
“O mato não era baixo, como tinham prometido. Era um junquirão alto, coisa para trator fazer.
O capim era maior que nós, e era tão quente que chegava a dar agonia.
Tinha dias que o gato passava debochando.
Falava que ali era onde o filho chorava e a mãe não ouvia”.
(Francisco das Chagas Bastos, trabalhador rural, resgatado na Fazenda Brasil Verde-PA)
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A Comissão Episcopal Pastoral Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB, se manifesta neste 28 de janeiro – Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo – a todas as pessoas e instituições que se empenham na erradicação deste crime.
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O trabalho escravo viola a grandeza de filhos e filhas, destrói a imagem de Deus, cerceia a liberdade daqueles que foram resgatados por Cristo (Gl 5,1). A exploração do ser humano, através do trabalho escravo, é um grave desrespeito aos direitos da pessoa humana, à sua dignidade e especialmente uma violação grave ao direito de trabalhar em condições dignas, recebendo um salário justo. O trabalho é dimensão constitutiva do ser humano e não oportunidade para violação da sua dignidade.
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O Dia Nacional de Combate ao trabalho escravo foi instituído em memória do assassinato de três auditores fiscais do trabalho e seu motorista, em 28 de janeiro de 2004, quando fiscalizavam fazendas da zona rural de Unaí (MG). Ao mesmo tempo, esse dia é um convite para a sociedade brasileira tomar consciência da realidade do trabalho escravo. O direito da pessoa de não ser mantida em estado de escravidão ou servidão é reconhecido, no direito internacional, como norma irrevogável.
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A sociedade tem a tarefa de conduzir-se por uma economia que preze a dignidade humana acima de tudo e isso implica, entre outras coisas, em eliminar a prática do trabalho escravo em qualquer relação de trabalho, seja na agropecuária, na construção civil, na indústria têxtil, nas carvoarias, nos serviços hoteleiros ou até em serviços domésticos. De 1995 a 2018, já foram libertados de trabalho escravo 50.731 trabalhadores (fonte: SIT), de um total de 52.942, encontrados nesta condição pela fiscalização do trabalho, entre eles 716 estrangeiros. Torna-se agravante o fato dessa modalidade do tráfico humano atingir também crianças e adolescentes (191 neste mesmo período).
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Nosso olhar está voltado também aos irmãos e irmãs imigrantes e refugiados, especialmente venezuelanos, que estão expostos à exploração, devido à sua situação de alta vulnerabilidade e por necessitarem, com urgência, de um trabalho para prover o seu sustento e o da família. Evidencia-se, pois, a importância de tratar com respeito os imigrantes e refugiados que chegam ao Brasil, e dar-lhes condições dignas de acolhida, assistência e inserção. O mesmo princípio vale para os brasileiros em situação de migração.
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Urge reafirmar, de forma inequívoca, o inalienável valor da vida e da dignidade humana que transcende qualquer objetivo econômico. Neste sentido devemos acompanhar com muita atenção os projetos de lei que volta e meia tentam retroceder na política de combate ao trabalho escravo construída no Brasil sem interrupção desde 1995.
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Lembramos a obrigação do Estado brasileiro – reiterada recentemente pela Corte Interamericana de Direitos Humanos na Sentença do caso Brasil Verde – de continuar assumindo ações que inibem a prática do trabalho escravo. Igualmente, reitera-se o apelo para que se esmere na proteção e defesa dos que lutam pelo fim do trabalho escravo, sejam funcionários públicos, sejam membros da sociedade civil. A busca pela reinserção decente das pessoas libertadas também requer atenção e adoção de políticas públicas facilitadoras deste processo.
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Lembramos aos brasileiros e brasileiras as palavras do Papa Francisco por ocasião do Dia Mundial da Paz: “Lanço um veemente apelo a todos os homens e mulheres de boa vontade e a quantos, mesmo nos mais altos níveis das instituições, são testemunhas, de perto ou de longe, do flagelo da escravidão contemporânea, para que não se tornem cúmplices deste mal, não afastem o olhar à vista dos sofrimentos de seus irmãos e irmãs em humanidade, privados de liberdade e dignidade, mas tenham a coragem de tocar a carne sofredora de Cristo, o Qual Se torna visível através dos rostos inumeráveis daqueles a quem Ele mesmo chama os «meus irmãos mais pequeninos» (Mt 25, 40.45)”.
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Que Jesus Cristo, Aquele que habitou no coração de Santa Bakhita, a escrava que testemunhou a esperança, nos anime a proclamar que a vida e a dignidade de qualquer pessoa passam pelo trabalho digno e sua justa valorização.
Brasília-DF, 23 de janeiro de 2019.
Dom Enemésio Lazzaris
Bispo de Balsas/MA
Presidente da Comissão Episcopal Pastoral Especial
para o Enfrentamento ao Tráfico Humano/CNBB